Выбрать главу

— Muito bem — disse Athor, friamente. — Que seja assim. Beenay 25 disse-me que você é a pessoa que mais entende de Escuridão em toda a universidade. Acaba de ver nossa pequena demonstração de astronomia na tela do computador. Imagino que seja capaz de compreender as implicações daquilo que acabamos de descobrir.

O velho astrônomo parecia ser incapaz de dizer alguma coisa sem assumir um ar superior. Sheerin, porém, não parecia ofendido.

— Acho que compreendo, sim — disse, calmamente. — O senhor está dizendo que existe um misterioso astro invisível, mais ou menos do tamanho do nosso planeta, que gira em órbita em torno de Kalgash, a uma certa distância, e cuja força de atração explica perfeitamente certos desvios da órbita de Kalgash em relação à teoria, que meu amigo Beenay descobriu faz algum tempo. Estou certo até agora?

— Está — concordou Athor. — É isso mesmo.

— Pois bem — prosseguiu Sheerin. — Acontece que, às vezes, este astro passa entre nós e um dos nossos sóis. Este fenômeno é chamado de eclipse. Apenas um dos sóis pode sofrer eclipses, esse sol é Dovim. O eclipse ocorre apenas quando — Sheerin franziu a testa — quando Dovim é o único sol no céu, e tanto ele quanto o chamado Kalgash Dois estão alinhados de tal forma que Kalgash Dois cobre totalmente o disco de Dovim, fazendo com que nenhuma luz chegue até nós. Que tal?

Athor fez que sim com a cabeça.

— Acho que compreendeu perfeitamente o problema. É pena. Tinha esperança de ter entendido errado. Fale agora dos efeitos do eclipse — ordenou Athor. Sheerin respirou fundo.

— OK. O eclipse, que ocorre apenas uma vez a cada 2049 anos, graças a Deus!, resulta em total Escuridão na superfície de Kalgash. Em consequência do movimento de rotação de nosso planeta, todos os continentes ficam nas trevas por um período que pode variar… o que foi que o senhor disse?… que pode variar de nove a quatorze horas, dependendo da latitude.

— Muito bem. Agora me responda, por favor — disse Athor. — Em sua opinião, como psicólogo, qual será o efeito dessa Escuridão sobre os seres humanos?

— O efeito será a loucura — respondeu Sheerin, sem hesitar.

De repente, todos ficaram muito quietos. Afinal, Athor perguntou:

— Loucura universal? É isso que está prevendo?

— Exatamente. Escuridão universal, loucura universal. Tenho a impressão de que as pessoas serão afetadas de várias formas e em vários graus. Algumas ficarão apenas deprimidas e desorientadas; outras sofrerão uma destruição completa e permanente das faculdades mentais. Naturalmente, quanto maior a estabilidade psicológica do indivíduo, menor a probabilidade de que a ausência de luz produza danos irreversíveis. Na minha opinião, porém, ninguém será totalmente poupado.

— Não compreendo — disse Beenay. — Por que a Escuridão faria as pessoas perderem o juízo?

Sheerin sorriu.

— Simplesmente não estamos preparados para a ausência de luz. Imagine, se puder, um mundo com apenas um sol. Se esse mundo girasse em torno de si próprio, cada hemisfério ficaria iluminado metade do tempo e passaria a outra metade do tempo totalmente às escuras.

Beenay fez um gesto involuntário de medo.

— Está vendo? — exclamou Sheerin. — Você não pode nem ouvir falar nisso! Mas os habitantes desse planeta assim estariam acostumados a uma dose diária de Escuridão. Provavelmente, achariam as horas em que o sol estivesse no céu mais agradáveis, mas considerariam a Escuridão como uma coisa normal. Simplesmente iriam dormir e esperariam que o sol voltasse a aparecer. Nós, porém, somos diferentes. Nossa espécie se desenvolveu à luz dos sóis, o tempo todo, o ano inteiro. Quando Onos não está no céu, temos Tano, Sitha e Dovim, ou Patru e Trey, e assim por diante. Nossa mente e até o nosso corpo estão acostumados a uma iluminação constante. Não concebemos sequer um breve momento sem ela. Você dorme com uma luz acesa no quarto, não dorme?

— É claro — disse Beenay.

— É claro? Por que “é claro”?

— Porque… ? Ora, todo mundo dorme com uma luz acesa no quarto!

— É o que estou querendo mostrar. Diga-me uma coisa: já experimentou a Escuridão, meu caro Beenay?

Beenay encostou-se na parede, ao lado da janela panorâmica, e pensou um pouco.

— Não. Acho que não. Mas sei como é. Apenas… hum… — fez um gesto vago, mas de repente sua fisionomia se iluminou. — Apenas a falta de luz. Como no interior de uma caverna.

— Já entrou em uma caverna?

— Em uma caverna? Claro que nunca entrei em uma caverna!

— Eu já desconfiava. Pois eu já entrei em uma caverna, há muito tempo, quando estava começando a estudar as doenças produzidas pela Escuridão. Mas não fiquei muito tempo lá dentro. Entrei até a boca da caverna se reduzir a uma pequena mancha luminosa. O resto estava totalmente negro. Sheerin deu uma risada. — Nunca pensei que uma pessoa gorda como eu pudesse correr tanto!

— Pois acho que, se fosse eu, não teria corrido — declarou Beenay, em tom desafiador.

O psicólogo sorriu para o rapaz.

— Bravo! Admiro sua coragem, amigo.

Voltando-se para Athor, Sheerin disse:

— O senhor me permite realizar uma pequena experiência de psicologia?

— Como quiser.

— Obrigado.

Sheerin olhou de novo para Beenay.

— Incomoda-se de fechar a cortina, Beenay?

Beenay parecia surpreso.

— Para quê?

— Faça o que estou pedindo. Depois, venha cá e sente-se ao meu lado.

— Já que insiste…

A janela tinha grossas cortinas vermelhas. Athor não se lembrava de vê-las fechadas, e aquela sala tinha sido seu escritório nos últimos quarenta anos. Beenay deu de ombros e puxou a cortina. Ela deslizou no trilho. Por um momento, a luz avermelhada de Dovim ainda podia ser vista. Depois, só restaram sombras, e mesmo as sombras ficaram indistintas.

Os passos de Beenay ressoaram quando ele se dirigiu para a mesa, mas ele parou no meio do caminho.

— Não posso vê-lo — sussurrou, em tom queixoso.

— Continue assim mesmo — ordenou Sheerin, com voz tensa.

— Mas não consigo vê-lo! — insistiu o jovem astrônomo, ofegante. — Não consigo ver nada!

— Que esperava? A Escuridão é assim mesmo. — Sheerin esperou alguns instantes. — Vamos! Você pode chegar aqui mesmo sem enxergar. Venha cá e sente-se.

Os passos soaram novamente, hesitantes. Ouviu-se o ruído de alguém puxando uma cadeira. Afinal, Beenay falou, baixinho:

— Estou aqui.

— Como se sente?

— Estou… gulp… estou bem.

— Gostou da sensação?

Um longo silêncio.

— Não.

— Não gostou, Beenay?

— Detestei. É horrível. E como se as paredes… — fez outra pausa… — é como se as paredes estivessem se fechando em torno de mim. Sinto vontade de empurrá-las para longe. Mas não estou perdendo o juízo. Na verdade, acho que estou começando a me acostumar.

— Muito bem. E você, Siferra?

— Um pouco de Escuridão não me incomoda. Na minha profissão, de vez em quando tenho que usar passagens subterrâneas. Mas não posso dizer que seja agradável.

— Dr. Athor?

— Acho que sobrevivi ileso. Mas o senhor provou que estava certo, Dr. Sheerin — disse o diretor do Observatório, com mordacidade.

— Muito bem. Beenay, pode abrir a cortina.

Ouviram-se passos cautelosos no escuro, o roçar do corpo de Beenay na cortina enquanto ele procurava a corda, e depois o barulho triunfante da cortina sendo aberta. A luz vermelha de Dovim inundou a sala, e Beenay olhou para o menor dos seis sóis com um grito de alegria. Sheerin enxugou o suor da testa com as costas da mão e disse, com voz trêmula: