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— É uma possibilidade — concordou Athor. — Por mais desagradável que seja, acho que tenho obrigação de tentar extrair deles o máximo que for possível. Nenhum de vocês, então, discorda do meu ponto de vista? Concordam comigo que nós quatro devemos tomar alguma atitude diante do que sabemos?

— Agora eu concordo — disse Beenay, olhando para Sheerin. — Ainda acho que não serei muito afetado pela Escuridão. Entretanto, por tudo que foi dito, estou convencido de que boa parte da humanidade será afetada. Nesse caso, a civilização como um todo estará em perigo… a menos que a gente faça alguma coisa.

Athor fez que sim com a cabeça.

— Muito bem. Fale com seu amigo Theremon, mas com cuidado. Sabe o que penso dos jornalistas; para mim, eles não são muito melhores do que os Apóstolos. Mas diga ao seu amigo Theremon que eu gostaria de me encontrar secretamente com aquele líder dos Apóstolos que ele entrevistou.

— Sim, senhor.

— Dr. Sheerin, gostaria que me emprestasse alguns artigos sobre os efeitos da exposição prolongada à Escuridão.

— Não há problema.

— E você, Siferra… poderia me fornecer um relatório, em termos acessíveis aos leigos, a respeito do que encontrou em Thombo? Inclua todas as provas que puder com relação à periodicidade dos incêndios.

— Ainda não recebi todos os resultados, Dr. Athor. Coisas que nem cheguei a discutir hoje.

Athor franziu a testa.

— O quê, por exemplo?

— Tabuinhas com inscrições. Encontradas no terceiro e quinto níveis a partir de cima. O Dr. Mudrin está tentando traduzi-las. Sua primeira impressão é de que se

trata de textos religiosos, advertindo o povo para um desastre iminente.

— As primeiras edições do Livro das Revelações! — exclamou Beenay.

— É, pode ser que sejam isso mesmo — concordou Siferra. — Seja como for, espero receber em breve a tradução das tabuinhas. Pretendo incluí-la no meu relatório, Dr. Athor.

— Ótimo — disse Athor. — Vamos precisar de tudo que tivermos. Este será o trabalho mais importante de nossas vidas. — Olhou em torno. — Quero que uma coisa fique bem clara logo de saída: minha disposição de aproximar-me dos apóstolos não significa, de forma alguma, que eu pretenda lhes proporcionar uma aura de respeitabilidade. Simplesmente tenho esperança de que nos ajudem a convencer a população de que uma coisa muito séria está para acontecer. Ponto final. Fora isso, quero distância deles. A questão que nos preocupa não tem nada a ver com misticismo. Não acredito em uma palavra daquelas baboseiras a respeito de castigo dos deuses. Estou interessado, porém, em saber como foi que chegaram à conclusão de que vai haver uma catástrofe no ano que vem. Gostaria que vocês tivessem a mesma cautela ao lidar com os Apóstolos. Estamos entendidos?

— Isto tudo parece um sonho — murmurou Beenay.

— Mais parece um pesadelo — disse Athor. — Gostaria de acreditar que tudo não passa de uma fantasia, que o dia 19 de Theptar vai chegar e passar sem que nada aconteça. Infelizmente, os números estão aqui para provar que não é bem assim. — Olhou pela janela. Onos havia se posto e Dovim era um pontinho no horizonte. Estava na hora do crepúsculo. A única luz visível de verdade era a luz fria de Patru e Trey.

— Não há mais razões para duvidarmos. A Escuridão está próxima. Talvez as Estrelas, sejam o que forem, realmente apareçam. A humanidade vai enlouquecer e atear fogo às cidades.

O fim do mundo como o conhecemos está próximo. O fim do mundo!

O cair da Noite

18

— Tome cuidado — disse Beenay. Sentia-se tenso. A noite estava chegando. A temida noite do eclipse. — Athor está furioso com você, Theremon. Não sei o que veio fazer aqui. Sabe que sua presença no Observatório não é vista com bons olhos. Especialmente esta noite. E não é de admirar, depois das coisas que andou escrevendo a respeito do chefe…

O jornalista riu.

— Já lhe expliquei. Estou aqui para acalmá-lo.

— Não se confie nisso, Theremon. Você insinuou que ele é um velho gagá, em sua coluna, lembra-se? O chefe é normalmente uma pessoa tranquila, mas vira fera quando se sente ofendido na sua capacidade profissional!

— Olhe, Beenay — disse Theremon, encolhendo os ombros -, antes de me tornar um colunista famoso, eu era um repórter especializado em entrevistas impossíveis. E quero dizer impossíveis. Ás vezes, chegava em casa com manchas roxas pelo corpo. Cheguei a quebrar um osso ou dois, mas sempre consegui minha história. A gente adquire uma certa confiança depois de passar anos deixando as pessoas malucas para conseguir uma reportagem. Posso cuidar muito bem do seu chefe.

— Deixando as pessoas malucas? — Beenay olhou significativamente para o calendário na parede do corredor, que anunciava, em caracteres verde luminosos: THEPTAR 19.

O dia dos dias, a data que não saía da cabeça dos funcionários do Observatório, mês após mês. O último dia de sanidade mental para muitos, talvez todos os habitantes de Kalgash.

— Não foi uma expressão muito feliz para você usar no dia de hoje, não acha?

Theremon sorriu.

— Talvez não. Veremos. — Apontou para a porta fechada do escritório de Athor. — Quem está aí dentro?

— O Dr. Athor, é claro. E minha colega Thilanda, Davnit, Simbron, Hikkinan, todos funcionários do Observatório. Acho que é só.

— E Siferra? Ela me disse que viria.

— Pois ainda não chegou.

Uma expressão de surpresa apareceu no rosto de Theremon.

— Verdade? Quando lhe perguntei outro dia se preferia ficar no Abrigo, praticamente riu na minha cara. Estava firmemente disposta a assistir ao eclipse daqui. Não acredito que tenha mudado de ideia. Aquela mulher não tem medo de nada, Beenay. Bem, talvez esteja resolvendo algumas coisas de última hora no seu escritório.

— É provável.

— E nosso amigo Sheerin? Também não está aqui?

— Não. Sheerin está no Abrigo.

— A coragem não é uma de suas qualidades, hein? Pelo menos ele tem o bom senso de admitir isso. Raissta também está no Abrigo, com Nyilda, a mulher de Athor, e quase todo mundo que eu conheço, exceto os funcionários do Observatório. Se você fosse esperto, também estaria lá, Theremon. Quando a Escuridão chegar, você vai se arrepender de não ter ouvido nossos conselhos.

— Folimun 66, aquele Apóstolo, me disse a mesma coisa há cerca de um ano. Só que o Abrigo que estava me oferecendo era outro. Acontece, amigo, que estou preparado para enfrentar os piores horrores que os deuses tenham reservado para mim. Esta noite, aconteça o que acontecer, vai haver assunto para uma boa reportagem, e eu não poderia fazer uma boa cobertura se estivesse escondido em uma toca debaixo da terra, não é mesmo?

— Não vai haver nenhum jornal amanhã para publicar a sua reportagem, Theremon.

— Você acha mesmo? — Theremon pegou Beenay pelo braço e aproximou-se até que os narizes dos dois quase se tocaram. — Diga-me uma coisa, Beenay. De amigo para amigo. Acha realmente que uma coisa incrível como essa Escuridão vai acontecer daqui a pouco?

— Acho, sim.

— Puxa! Você está falando sério?

— Nunca falei tão sério em minha vida, Theremon.

— Não consigo acreditar. Você parece tão sensato, Beenay. Tão lógico, tão responsável. No entanto, pega um monte de cálculos astronômicos reconhecidamente especulativos, alguns pedaços de carvão escavados em um deserto a milhares de quilômetros daqui, os loucos devaneios de uma seita de fanáticos, mistura tudo e me saí com o mais absurdo coquetel apocalíptico que eu já tive oportunidade de…