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Perrin franziu a testa para a placa da estalagem por um instante, antes de seguir os outros para dentro. Um texugo de listras brancas dançava sobre as pernas traseiras, acompanhado de um homem que carregava o que parecia ser uma pá de prata. “Acalmando o Texugo”, dizia a placa. Deve ser alguma história que nunca ouvi.

O chão do salão estava coberto de serragem, e fumaça de tabaco preenchia o ambiente. O lugar também tinha cheiro de vinho, peixe sendo cozido na cozinha e um intenso perfume floral. As vigas expostas no teto alto eram entalhadas de um jeito rústico, enegrecidas pelo tempo. Àquela hora da noite, assim tão cedo, pouco menos de um quarto dos bancos e banquetas era ocupado por homens com casacos e calças simples de trabalhadores, alguns com os pés descalços dos marinheiros. Todos sentavam da forma mais amontoada possível em torno de uma mesa, onde uma bela moça de olhos escuros, a dona do perfume, cantava ao som do dedilhar de uma sabiola de doze cordas e dançava sobre a mesa, rodopiando a saia. A blusa branca e folgada tinha um decote bem profundo. Perrin reconheceu a melodia — “A Donzela Dançante” —, mas as palavras que a moça cantava eram diferentes da canção que ele conhecia.

A lugardeira foi à cidade ver o que havia para ver. Piscou os olhinhos, deu um sorrisinho e beijou um rapaz ou três, ou três. Com as canelas finas e a pele branquinha, agarrou um capitão cortês, cortês. Com um suspiro suave e uma risada alegre, seguiu e livre foi ser, foi ser.

Ela começou a entoar outro verso, e, quando Perrin percebeu o significado do que ela cantava, sentiu o rosto ficar quente. Pensara que nada poderia chocá-lo depois de ver as moças latoeiras dançando, mas a dança dava apenas um vislumbre, uma ideia. A garota estava cantando sobre tudo abertamente.

Zarine balançava a cabeça acompanhando a canção, sorrindo. Seu sorriso escancarou-se ainda mais quando ela olhou para Perrin.

— Ora, fazendeiro, acho que nunca conheci um homem da sua idade que ainda fosse capaz de corar.

Ele olhou para ela irritado e quase não se conteve e disse algo que sabia que seria estúpido. Essa mulher maldita me deixa desconcertado antes mesmo que eu consiga pensar. Luz, aposto que ela pensa que eu nunca nem beijei uma garota! Ele tentou não prestar mais atenção ao que a moça cantava. Se não conseguisse tirar o vermelho do rosto, Zarine com certeza o faria corar ainda mais.

Um lampejo de susto passou pelo rosto da proprietária quando eles entraram. Grande e redonda, com o cabelo arrumado em um coque grosso perto da nuca e um cheiro forte de sabão, a mulher conseguiu reprimir o espanto depressa e correu até Moiraine.

— Senhora Mari — disse —, nunca nem imaginei que veria a senhora aqui hoje. — Ela hesitou, encarando Perrin e Zarine, e lançou um olhar a Loial, mas não da forma indagativa com que olhou para os outros dois. Na realidade, os olhos da mulher brilharam ao notar o Ogier, mas sua atenção estava toda focada na “Senhora Mari”. Ela baixou a voz: — Meus pombos chegaram em segurança? — Ela parecia encarar Lan como parte de Moiraine.

— Tenho certeza que sim, Nieda — respondeu Moiraine. — Eu estou viajando, mas tenho certeza de que Adine anotou todas as informações. — Ela olhou a moça que cantava sobre a mesa sem desaprovação ou qualquer outra expressão. — O Texugo estava bem mais tranquilo da última vez que vim.

— É, Senhora Mari, sim, estava, sim. Mas, no caso, parece que esses grosseirões nem superaram o inverno ainda. Nem tive briga nenhuma aqui no Texugo nos últimos dez anos, até o fim desse inverno sumir. — Ela indicou com a cabeça o único homem que não estava sentado perto da cantora, um sujeito ainda maior que Perrin, encostado na parede com os braços robustos cruzados e batendo o pé ao som da cantoria. — Até Bili andou tendo trabalho para sossegar o pessoal, então acabei contratando a moça para distrair um pouco a raiva. Veio, no caso, de algum lugar em Altara, essa moça. — Ela inclinou a cabeça e escutou por um momento. — Uma voz bonita, mas eu cantava melhor, sim, e dançava melhor também, quando tinha a idade dela.

Perrin ficou boquiaberto ao imaginar aquela mulher enorme saltitando em uma mesa e cantando aquela música — alguns versos chegaram aos seus ouvidos: “Não vou usar combinação nenhuma. Nenhuma.” —, até que Zarine cutucou-o com força nas costelas. Ele grunhiu.

Nieda olhou para ele.

— Vou misturar um pouco de mel e enxofre para essa sua garganta, rapaz. No caso, é melhor você nem pegar friagem antes que o tempo esquente, ainda mais com uma moça bonita dessas nos braços.

Moiraine lançou a ele um olhar para indicar que ele estava atrapalhando.

— Estranho a senhora ter sofrido com brigas — disse. — Eu me lembro muito bem de como seu sobrinho acaba com elas. Aconteceu alguma coisa que deixou o povo mais irritadiço?

Nieda refletiu por um instante.

— Talvez. No caso, é difícil dizer. Sim, os jovens riquinhos sempre vêm para as docas atrás das meretrizes e das bebedeiras que, no caso, jamais podem acontecer ao ar livre. Talvez eles no caso venham com mais frequência agora, desde o inverno difícil. Talvez. Sim, e andam se batendo mais, também. Foi sim um inverno difícil. Isso deixa os homens mais irritados, e no caso também as mulheres. Tanta chuva e tanto frio. Ora, duas dessas manhãs eu mesma acordei e encontrei gelo no lavatório. No caso, nem foi tão ruim quanto o inverno passado, é claro, mas sim, aquele foi um inverno que valeu por mil anos. Quase o bastante para me fazer acreditar naquelas histórias de água congelada caindo dos céus. — Ela deu uma risadinha para demonstrar a incredulidade. Era um som esquisito para uma mulher tão grande.

Perrin sacudiu a cabeça. Ela não acredita em neve? No entanto, se ela considerava este clima frio, ele conseguia acreditar que ela de fato pensasse assim.

Moiraine inclinou a cabeça, pensativa, o capuz encobrindo seu rosto.

A moça sobre a mesa começava a recitar um novo verso, e Perrin percebeu que outra vez escutava sem querer. Ele nunca ouvira falar de uma mulher que fizesse qualquer coisa remotamente parecida com o que a garota estava cantando, mas parecia interessante. Notou que Zarine o observava escutar a música e tentou fingir que não percebera nada.

— O que aconteceu de incomum em Illian, ultimamente? — perguntou Moiraine, por fim.

— Acredito que, no caso, dá pra chamar a ascensão de Lorde Brend ao Conselho dos Nove de incomum — respondeu Nieda. — Que a Sorte me espicace, nem consigo me lembrar de ouvir o nome dele antes do inverno, mas sim, ele chegou na cidade, vindo de algum lugar perto da fronteira com Murandir, segundo os rumores, e foi elevado em uma semana. Sim, dizem que ele é um homem bom, e o mais forte dos Nove. Eles todos seguem a liderança dele, pelo que dizem por aí, embora seja o mais novo e, no caso, desconhecido. Mas às vezes eu tenho esses sonhos estranhos com ele.

Moiraine abriu a boca, e Perrin tinha certeza de que era para perguntar se Nieda estava falando de sonhos que aconteceram nas últimas noites. Mas a Aes Sedai hesitou e, em vez disso, disse:

— Que tipo de sonhos estranhos, Nieda?

— Ah, bobagens, Senhora Mari. Só bobagens. A senhora quer mesmo escutar? Sonhos com Lorde Brend em lugares estranhos, caminhando por pontes suspensas. Sim, esses sonhos no caso são obscuros, mas vêm quase todas as noites. A senhora já ouviu falar nisso? Bobagens, que a Sorte me espicace! Ainda assim são sonhos estranhos. Bili diz que ele também sonha os mesmos sonhos. Sim, eu acho que ele escuta meus sonhos e copia. Bili nem é muito inteligente, às vezes, eu acho, sim.