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— Que a Luz brilhe sobre as senhoras, e sejam bem-vindas. — O homem suspirou. — Que a Luz brilhe sobre os senhores, mestres, e sejam bem-vindos. — O homem levou um leve susto com os olhos amarelos de Perrin, depois, exausto, dirigiu a atenção a Loial. — Que a Luz brilhe sobre você, amigo Ogier, e seja bem-vindo. Faz um ano ou mais desde que eu vi um de vocês aqui em Tear. Um trabalho ou outro na Pedra. Eles ficaram hospedados na Pedra, é claro, mas eu os vi na rua um dia. — A fala foi concluída com outro suspiro, o homem parecia incapaz de reunir curiosidade o bastante para questionar a presença de mais um Ogier em Tear, ou mesmo a presença de qualquer um dos outros.

Foi o próprio homem calvo, cujo nome era Jurah Haret, que mostrou os quartos ao grupo. Ao que parecia, o vestido de seda de Moiraine e a forma como ela escondia o rosto, somados à expressão dura e à espada de Lan, faziam dos dois uma lady e seu guarda, aos olhos do homem, portanto eram dignos de sua atenção pessoal. Ele obviamente pensou que Perrin fosse algum tipo de criado, e ficou clara a sua dúvida quanto a Zarine — para o visível descontentamento da moça. Loial, por sua vez, era um Ogier, afinal de contas. Ele chamou alguns homens para juntar duas camas para Loial e ofereceu um salão privado para as refeições de Moiraine, se ela desejasse. Ela aceitou com muita graça.

O grupo subiu junto para os andares superiores em uma pequena procissão, até que Haret foi embora com mesuras e suspiros, deixando-os do lado de fora do quarto de Moiraine, onde haviam começado. As paredes eram de massa branca, e a cabeça de Loial encostava no teto do corredor.

— Sujeito odioso — resmungou Zarine, batendo a terra das saias justas com ambas as mãos, irritada. — Acho que ele pensou que eu fosse sua criada, Aes Sedai. Não vou tolerar isso!

— Cuidado com essa língua — avisou Lan, em voz baixa. — Se usar esse nome perto dos ouvidos dos outros, vai se arrepender, garota. — Ela o encarou como se fosse começar uma discussão, mas os olhos frios e azuis do Guardião conseguiram silenciá-la daquela vez, ainda que não tivessem amansado o olhar que ela deu em resposta.

Moiraine ignorou os dois. Olhando para o nada, alisava o manto com as mãos, quase como se as estivesse limpando. Na opinião de Perrin, ela não tinha se dado conta do que estava fazendo.

— Como é que vamos encontrar Rand? — perguntou, mas ela não pareceu ouvi-lo. — Moiraine?

— Não se afastem da estalagem — avisou, depois de um instante. — Tear pode ser uma cidade perigosa para os que não sabem como as coisas acontecem por aqui. O Padrão pode se romper, neste lugar. — A última frase saiu baixa, como se para si mesma. Com uma voz estranha, ela continuou: — Lan, vamos ver o que conseguimos descobrir sem atrair a atenção. E vocês fiquem perto da estalagem!

— “Fiquem perto da estalagem” — imitou Zarine, quando a Aes Sedai e o Guardião desapareceram escada abaixo. Mas ainda assim falou, baixinho, para que os dois não ouvissem. — Esse Rand. É ele que vocês chamam de… — Se ela virasse um falcão naquele instante, pareceria um falcão muito incomodado. — E estamos em Tear, onde o Coração da Pedra guarda… e as Profecias dizem… Que a Luz me queime, ta’veren, será que eu quero participar dessa história?

— Não é uma história, Zarine. — Por um instante, Perrin soou quase tão abatido quanto o estalajadeiro. — A Roda nos tece dentro do Padrão. Você escolheu unir sua trama à nossa, agora é tarde demais para desfazer.

— Luz! — resmungou a mulher. — Você falou igualzinho a ela!

Ele a deixou lá com Loial e foi guardar suas coisas no quarto, onde havia uma cama baixa e confortável, porém pequena, do tipo que o povo da cidade julgava adequada a um servo, além de um lavatório, um banquinho e pinos na parede coberta de massa branca. Quando voltou, os dois já não estavam mais lá. O ressoar do martelo na bigorna o chamava.

Havia tantas coisas estranhas em Tear que foi um alívio entrar na ferraria. O térreo consistia em um ambiente amplo, sem parede nos fundos. Havia apenas duas portas compridas, que permaneciam abertas e davam em um pátio para ferrar cavalos, além de um brete para bois. Havia martelos pendurados em suportes, e pinças de diversos tamanhos e tipos pendiam de traves expostas nas paredes. Esteios, facas para casco e outras ferramentas de ferraria haviam sido dispostas com cuidado em bancos de madeira com cinzéis, chifres de bigorna, moldes de forja e todos os equipamentos do ofício de um ferreiro. Latas continham pedaços de ferro de diferentes espessuras. Cinco discos amoladores de asperezas diversas estavam dispostos no chão de terra batida, além de seis bigornas e três forjas com laterais de pedra e os respectivos foles, embora apenas uma tivesse os carvões acesos. Barris com água para a têmpera permaneciam à mão.

O ferreiro batia o martelo em um pedaço de ferro amarelo de tão escaldante, que segurava com pinças robustas. Usava calças largas e tinha os olhos azul-claros. No entanto, o comprido colete de couro sobre o peitoral desnudo e o avental não eram muito diferentes dos que Perrin e Mestre Luhhan usavam em Campo de Emond, e os braços e ombros fortes do homem eram prova dos anos que passara moldando metal. Os cabelos escuros tinham quase a mesma quantidade de fios grisalhos que o rapaz se lembrava de ver em Mestre Luhhan. Mais coletes e aventais pendiam na parede, como se o homem tivesse aprendizes que não estivessem ali no momento. O fogo das forjas tinha cheiro de casa. O ferro quente tinha cheiro de casa.

O ferreiro virou-se para jogar o pedaço em que trabalhava de volta nos carvões, e Perrin se aproximou e foi soprar o fole para ele. O homem olhou para ele, mas não disse nada. Perrin subia e descia o cabo do fole com movimentos lentos, firmes e compassados, mantendo os carvões na temperatura certa. O ferreiro retomou o trabalho com o ferro, dessa vez na ponta arredondada da bigorna. Perrin pensou que o homem devia estar fazendo um escopro. O martelo ressoava em golpes rápidos e certeiros.

O homem falou sem tirar os olhos da tarefa.

— Aprendiz? — Foi só o que disse.

— Sim — respondeu Perrin, com a mesma simplicidade.

O ferreiro continuou o trabalho por um tempo. Era mesmo um escopro, um instrumento para limpar o interior de barris de madeira. De vez em quando, o homem examinava Perrin, pensativo. Deixando o martelo de lado por um instante, o homem pegou uma barra de ferro pequena, grossa e retangular e enfiou-a na mão de Perrin. Então pegou o martelo outra vez e retomou o trabalho.

— Veja o que pode fazer com isto — disse.

Sem nem pensar, Perrin foi até uma bigorna do outro lado da forja e bateu a madeira na beirada. O material fez um ótimo som. O aço não passara tanto tempo no forno e não absorvera muita fuligem do carvão. Ele empurrou quase todo o comprimento da barra para dentro dos carvões em brasa, provou a água dos dois barris, para ver qual fora salgada — o terceiro era de azeite de oliva —, depois tirou o casaco e a camisa e escolheu um colete de couro e um avental que lhe coubessem. A maioria daqueles sujeitos tairenos não era tão grande quanto ele, mas conseguiu achar um colete. Encontrar um avental foi mais fácil.

Quando se virou, viu que o ferreiro, ainda trabalhando de cabeça baixa, assentia e sorria para si mesmo. Mas apenas estar ambientado com uma ferraria não era o bastante para ser um ferreiro habilidoso. Isso ele ainda teria de provar.

Quando retornou à bigorna com dois martelos, um conjunto de pinças chatas de cabos compridos e um cinzel pontudo e afiado, a barra de aço já aquecera até ficar vermelho-escura, exceto pela pequeno pedacinho que ele deixara para fora dos carvões. Perrin soprou os foles, observando o metal clarear até chegar em um amarelo quase branco. Então puxou a barra com as pinças, repousou-o sobre a bigorna e pegou o martelo mais pesado dos dois que escolhera. Tinha cerca de dez libras, estimou, e um cabo maior do que a maioria das pessoas que não conhecia o trabalho com metais julgava necessário. Ele o segurou perto da ponta: o metal incandescente às vezes soltava faíscas, e já vira as cicatrizes nas mãos do ferreiro de Morro Redondo, um sujeito descuidado.