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De repente, Ailhuin conseguiu mover a cabeça. Ela balançou os cachos grisalhos e mexeu a boca.

— Eu… eu vou segurar a língua — soltou a mulher, com desânimo, depois lançou a Nynaeve um olhar constrangido, envergonhado. — Se eu falar, de que vai adiantar? Um Grão-lorde pode arrancar minha cabeça só mexendo a sobrancelha. De que eu posso lhe servir, garota? De quê?

— Está tudo bem — respondeu Nynaeve em um tom cansado. A quem ela poderia contar? Só lhe restaria a morte. — Sei que a senhora ajudaria, se pudesse.

Rianna jogou a cabeça para trás e gargalhou. Ailhuin desabou em seu lugar, totalmente livre, mas permaneceu sentada olhando as próprias mãos sobre o colo.

Liandrin e Rianna juntas puxaram Nynaeve de pé e a empurraram em direção à frente da casa.

— Se nos causar algum problema — explicou a mulher de cabelos negros, com a voz severa —, vou fazer você arrancar o próprio couro e dançar só com o esqueleto.

Nynaeve quase soltou uma risada. Que espécie de encrenca eu poderia causar? Estava blindada da Fonte Verdadeira. Os machucados doíam tanto que ela mal conseguia ficar de pé. Qualquer coisa que pudesse fazer, as outras duas combateriam como se fosse um acesso de raiva infantil. Mas esses machucados vão cicatrizar, que as queime, e vocês ainda vão cometer um deslize! E quando isso acontecer…

Havia mais gente no cômodo da frente da casa. Dois soldados grandalhões em elmos redondos com abas e placas peitorais que brilhavam sobre os casacos vermelhos de mangas bufantes. Os dois homens estavam com os rostos suados, e os olhos escuros observavam o entorno como se os sujeitos estivessem tão assustados quanto ela. Amico Nagoyin estava lá, esguia e bela, o pescoço longo e a pele pálida, inocente como uma criança colhendo flores. Joiya Byir tinha uma expressão amável, apesar daquela placidez suave comum às mulheres que usavam o Poder por tanto tempo. Era quase o semblante acolhedor de uma avó, embora a idade não tivesse dado qualquer toque cinza aos cabelos negros ou enrugado sua pele. Os olhos cinzentos pareciam mais os das madrastas das histórias, a mulher que matava os filhos da primeira esposa de seu marido. As duas brilhavam com o Poder.

Elayne estava entre as duas irmãs Negras e exibia um olho roxo, uma bochecha inchada, o lábio ferido e uma das mangas do vestido rasgada.

— Sinto muito, Nynaeve — disse, com a voz rouca, como se sentisse dor na mandíbula. — Só as vi quando já era tarde demais.

Egwene estava caída no chão com o rosto coberto de hematomas, quase irreconhecível. Quando Nynaeve e suas acompanhantes entraram, um dos soldados corpulentos ergueu Egwene para seu ombro. Ela permaneceu ali, bamboleando, débil como um saco de cevada meio vazio.

— O que foi que vocês fizeram com ela? — inquiriu Nynaeve. — Que as queime, o que foi…! — Algo invisível a atingiu na boca com tanta força que ela ficou com a visão turva por um instante.

— Ora, ora — avisou Joiya Byir, com um sorriso que os olhos desmentiam. — Não vou tolerar perguntas e nem xingamentos. — Ela também soava como uma avó. — Fale quando alguém se dirigir a você.

— Eu contei a você que ela, a garota, não parava de lutar, sim? — comentou Liandrin. — Que lhe sirva de lição. Se tentar causar qualquer problema, o mesmo tratamento lhe virá.

Nynaeve ansiava em fazer algo por Egwene, mas deixou-se ser empurrada para fora, até a rua. Ela forçou as mulheres a empurrá-la. Recusar-se a cooperar era uma pequena forma de luta, mas era tudo de que dispunha no momento.

Havia poucas pessoas na rua enlameada, como se todos tivessem decidido que seria melhor fazer qualquer outra coisa, e os poucos transeuntes passavam apressados pelo outro lado, sem sequer olhar a carruagem preta laqueada que estava parada atrás de um grupo de seis cavalos brancos, todos iguais, com grandes plumas brancas nas rédeas. Um cocheiro, vestido como os soldados, mas sem armadura ou espada, estava sentado no assento, e outro abriu a porta quando as mulheres saíram da casa. Antes de ele a abrir, Nynaeve pôde ver o símbolo pintado. Um punho com manoplas de prata agarrando raios dentados.

Ela supôs que fosse o símbolo do Grão-lorde Samon. Deve ser Amigo das Trevas, se tem assuntos a tratar com a Ajah Negra. Que a Luz o queime! Mas estava mais interessada no homem que se jogou de joelhos ao ver as mulheres.

— Que o queime, Sandar, por quê…? — Ela deu um salto quando algo que parecia um pedaço de pau a atingiu entre os ombros.

Joiya Byir abriu um sorriso infantil e balançou um dedo.

— Você vai mostrar respeito, criança. Ou pode perder essa língua.

Liandrin riu. Segurou os cabelos negros de Sandar e puxou a cabeça dele para trás com um tranco. O homem a encarou com os olhos de um sabujo fiel, ou de um vira-lata à espera de um chute.

— Não seja tão dura com esse homem. — Ela fez a palavra “homem” soar como “cachorro”. — Ele teve que ser… persuadido… a servir. Mas sou muito boa em persuadir, não sou? — Soltou outra risada.

Sandar lançou um olhar confuso a Nynaeve.

— Eu tinha que fazer isso, Senhora Maryim. Eu… tinha. — Liandrin torceu os cabelos do homem, que voltou os olhos para ela. Era outra vez aquele olhar de cão ansioso.

Luz!, pensou Nynaeve. O que foi que elas fizeram com ele? O que será que vão fazer com a gente?

Ela e Elayne foram jogadas de qualquer jeito dentro da carruagem, Egwene afundada no meio, a cabeça caída. Liandrin e Rianna subiram e se sentaram de frente para elas. O brilho tênue de saidar ainda as envolvia. Para onde haviam ido as outras, Nynaeve não tinha muita vontade de descobrir naquele momento. Queria alcançar Egwene, tocá-la, confortar sua dor, mas não era capaz de mover nem um músculo abaixo do pescoço, a não ser para se contorcer. Fluxos de Ar ataram as três como camadas de cobertores bem enrolados. A carruagem deu uma guinada e pôs-se em movimento, balançando forte na lama, apesar das molas de couro.

— Se vocês a tiverem machucado… — Luz, posso ver que a machucaram. Por que não digo o que quero? Mas era quase tão difícil forçar as palavras a saírem quanto erguer uma das mãos. — Se vocês a tiverem matado, não vou descansar até que todas sejam caçadas e mortas como cães selvagens.

Rianna cravou os olhos nela, mas Liandrin apenas fungou.

— Não seja uma idiota, bravia. Queremos vocês vivas. Isca morta não pega nada.

Isca? Para quê? Para quem?

— Você é a tola, Liandrin! Acha que estamos aqui sozinhas? Só nós três, que ainda nem somos Aes Sedai completas? Somos mesmo a isca, Liandrin. E vocês caíram na armadilha que nem galinhas gordas.

— Não conte isso a ela! — cortou Elayne, ríspida, e Nynaeve piscou, surpresa, antes de perceber que a jovem estava ajudando na invenção. — Se deixar a raiva dominar você, vai acabar dizendo o que elas não podem ouvir. Elas têm que nos levar para a Pedra. Elas têm que…

— Cale a boca! — interrompeu Nynaeve, bruscamente. — Está deixando a sua língua dominar você!

Elayne conseguiu demonstrar vergonha mesmo com o rosto machucado. Deixe elas ruminarem isso, pensou Nynaeve.

Mas Liandrin apenas sorriu.

— Quando sua função como isca terminar, vão nos contar tudo. Vão querer contar. Dizem que vocês um dia vão ser muito fortes, mas eu vou garantir que sempre me obedeçam, antes mesmo que o Grande Mestre Be’lal ponha em prática os planos que tem para vocês. Ele mandou chamar os Myrddraal. Treze. — Os lábios de botão de rosa se abriram em um sorriso ao proferir as últimas palavras.

Nynaeve sentiu um embrulho no estômago. Um dos Abandonados! Seu cérebro ficou paralisado de choque. O Tenebroso e todos os Abandonados estão presos em Shayol Ghul, foram presos pelo Criador no momento da criação. Mas a catequese não ajudou: ela sabia muito bem que aquilo era mentira. Então, deu-se conta de todo o resto. Treze Myrddraal. E treze irmãs da Ajah Negra. Ela ouviu Elayne gritar antes de perceber que também estava gritando, debatendo-se inutilmente contra as correntes de Ar invisíveis. Era impossível dizer o que era mais alto: seus gritos desesperados ou as gargalhadas de Liandrin e Rianna.