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O príncipe fez uma careta. Se foi devido à dor causada pela gota ou às palavras de sua sobrinha, o capitão não saberia dizer.

— Pode ser verdade.

— Pode ser? Eu digo que é.

— Obara quer que eu parta para a guerra.

Nym soltou uma gargalhada.

— Sim, ela quer passar uma tocha por Vilavelha. Ela odeia tanto essa cidade quanto a nossa irmãzinha a ama.

— E você?

Nym olhou de relance por sobre um ombro para onde seus companheiros a seguiam uma dúzia de metros atrás.

— Eu estava na cama com os gêmeos Fowler quando a notícia chegou até mim. — O capitão ouviu-a dizer. — Conhece o lema dos Fowler?

Deixe-me pairar! É tudo o que te peço. Deixe-me pairar, tio. Não preciso de nenhuma tropa poderosa, só de uma doce irmã.

— Obara?

— Tyene. Obara é muito ruidosa. Tyene é tão doce e gentil que ninguém suspeitará dela. Obara transformaria Vilavelha na pira funerária do nosso pai, mas eu não sou assim tão ambiciosa. Quatro vidas me bastariam.

Os gêmeos dourados de Lorde Tywin, como pagamento pelos filhos de Elia.

O velho leão, pela própria Elia. E por fim o reizinho, pelo meu pai.

— O rapaz nunca nos ofendeu.

— O rapaz é um bastardo nascido da traição, incesto e adultério, se é possível acreditar em Lorde Stannis. — O tom divertido tinha desaparecido de sua voz, e o capitão deu por si mesmo observando-a através de olhos semicerrados.

Sua irmã Obara usava o chicote no quadril e carregava uma lança onde qualquer um podia vê-la. A Senhora Nym não era menos mortífera, embora mantivesse as suas facas bem escondidas. — Só sangue real pode limpar o assassinato de meu pai.

— Oberyn morreu durante combate singular, lutando por um assunto que não lhe dizia respeito. Não chamo a isso de assassinato.

— Chame do que quiser. Enviamos-lhes o melhor homem de Dorne, e eles nos mandam de volta um saco de ossos.

— Ele foi além de qualquer coisa que eu lhe pedi. “Avalie esse rei menino e seu conselho, e tome nota de seus pontos fortes e fracos”, eu disse a ele, na varanda. Estávamos comendo laranjas. “Encontre para nós amigos, se for possível encontrar algum. Descubra o que possa sobre o fim de Elia, mas trate de não provocar indevidamente o Lorde Tywin”, essas foram minha palavras para ele. Oberyn riu e disse: “Quando foi que eu provoquei qualquer homem… indevidamente? Você faria melhor em avisar aos Lannister para não me provocarem.” Ele queria justiça por Elia, mas não quis esperar…

— Ele esperou dezessete anos. — Interrompeu a Senhora Nym. — Se fosse a você que eles tivessem matado, meu pai teria levado seus vassalos para o norte antes que seu cadáver esfriasse. Se fosse você, as lanças estariam caindo como chuva agora.

— Não duvido disso.

— Assim como não deve duvidar disso, meu príncipe: minhas irmãs e eu não esperaremos dezessete anos por nossa vingança. — Ela enterrou as esporas na égua e desapareceu a galope na direção de Lançassolar, perseguida a grande velocidade por sua comitiva.

O príncipe recostou-se nas almofadas e fechou os olhos, mas Hotah sabia que ele não estava dormindo. Ele estava com dores. Por um momento pensou em chamar o Meistre Caleotte até a liteira, mas se o Príncipe Doran o quisesse, ele mesmo o teria chamado.

As sombras da tarde tornaram-se longas e escuras, o sol tão vermelho e inchado como as articulações do príncipe, antes que eles vislumbrassem as torres de Lançassolar a leste. Primeiro a esguia Torre da Lança, com quarenta e cinco metros de altura e coroada com uma lança de aço dourada que lhe acrescentava outros nove metros; em seguida, a grandiosa Torre do Sol, com sua cúpula de ouro e vidro; e por fim, o Navio de Areia de cor parda, que se parecia a uma gigantesca dromunda que tinha se chocado à costa e se transformado em pedra.

Apenas três léguas de estrada costeira separavam Lançassolar dos Jardins de Água, mas tratava-se de dois mundos diferentes. Lá, as crianças divertiam-se nuas ao sol, música era tocada em pátios azulejados, e o ar estava perfumado com o cheiro penetrante dos limões e laranjas de sangue.

Aqui, o ar cheirava a poeira, suor e fumaça, e as noites eram vivas com o murmúrio de vozes. Em vez do mármore cor-de-rosa dos Jardins de Água, Lançassolar foi construída a partir do barro e palha, toda em tons de marrom e castanho. A antiga fortaleza da Casa Martell erguia-se na extremidade mais oriental de uma pequena saliência de pedra e areia, com o mar cercando três dos seus lados. A oeste, à sombra das maciças muralhas de Lançassolar, lojas de adobe e casebres sem janelas agarravam-se ao castelo como cracas ao casco de uma galé. Estábulos, estalagens, tabernas e casas de almofadas tinham crescido a oeste das lojas e dos casebres, muitos rodeados por seus próprios muros, e mais casebres tinham se erguido à sombra desses muros. por aí a fora, e assim por diante, como diriam os sacerdotes barbudos.

Comparada com Tyrosh, Myr ou com a Grande Norvos, a cidade sombria não era mais que uma vila, mas era a coisa mais próxima a uma cidade de verdade que aqueles dorneses possuíam.

A chegada da Senhora Nym precedera a deles por algumas horas, e não havia dúvidas de que ela tinha avisado aos guardas de sua vinda, pois o Portão Triplo encontrava-se aberto quando se aproximaram. Só ali os portões estavam alinhados um atrás do outro para permitir que os visitantes passassem direto sob todas as três Muralhas Sinuosas e se dirigissem diretamente ao Palácio Antigo sem terem primeiro que passar através de quilômetros de ruas estreitas, pátios escondidos e bazares ruidosos.

O Príncipe Doran fechara as cortinas de sua liteira assim que a Torre da Lança tornou-se visível, mas mesmo assim o povo gritou-lhe enquanto a liteira passava. As Serpentes da Areia os fizeram ferver, pensou o capitão, preocupado. Atravessaram a Hotah desistiu de procurar por quem falava; a multidão era muito densa, e um terço dela estava gritando. “Às lanças! Vingança pela Víbora!” No momento em que atingiram o terceiro portão, os guardas estavam empurrando as pessoas para os lados, a fim de abrir caminho para a liteira do príncipe, e a multidão atirava coisas. Um rapaz esfarrapado conseguiu passar correndo pelos lanceiros com uma romã meio podre em uma mão, mas quando viu Areo Hotah em seu caminho com seu machado pronto, deixou a fruta cair e bateu em rápida retirada. Outros mais atrás jogaram limões, limas e laranjas, gritando “Guerra! Guerra! Às lanças!”. Um dos guardas foi atingido no olho por um limão, e o próprio capitão viu uma laranja se arrebentar em seu pé.

Nenhuma resposta veio de dentro da liteira. Doran Martell manteve-se oculto no interior de suas paredes de seda até que as muralhas mais grossas do castelo engoliram a todos eles, e a ponte levadiça desceu atrás deles com um estrondo chocalhante. A gritaria desapareceu gradualmente. A Princesa Arianne estava esperando no pátio exterior para saudar seu pai com metade da corte ao seu redor: o velho e cego senescal Ricasso, Sor Manfrey Martell, o castelão, o jovem Meistre Myles com suas vestes cinzentas e barba sedosa e perfumada, quarenta cavaleiros de Dorne vestidos em linho leve de meia centena de cores. A pequena Myrcella Baratheon estava acompanhada por sua septã e Sor Arys da Guarda Real, o qual sufocava em sua armadura esmaltada de branco.

A Princesa Arianne caminhou para a liteira em sandálias de pele de cobra atadas até as coxas. Seu cabelo era uma juba de caracóis negros como o azeviche que caíam até sua cintura, e em volta da testa trazia uma faixa de sóis de cobre. Ela ainda é uma coisinha pequena, pensou o capitão.

Enquanto as Serpentes da Areia eram altas, Arianne parecia-se com a mãe, que não tinha mais de um metro e cinquenta e sete. Mas sob o seu cinturão incrustado de jóias e camadas soltas de leve seda púrpura e samito amarelo ela possuía um corpo de mulher, exuberante e cheio de curvas.