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O vinho tornara-se parte do seu ritual noturno. Sor Ilyn era o companheiro de bebida perfeito.

Nunca interrompia, nem pedia favores, nem contava longas histórias sem importância. Tudo o que fazia era beber e escutar.

— Eu devia mandar arrancar a língua a todos os meus amigos — disse Jaime enquanto enchia as taças — e à minha família também. Uma Cersei silenciosa seria uma delícia. Embora eu fosse sentir falta da sua língua quando nos beijássemos. — E bebeu. O vinho era um tinto forte, doce e pesado. Aquecia-o ao descer. — Não consigo me lembrar de quando começamos a nos beijar. A princípio foi inocente. Até deixar de ser. —

Acabou o vinho e pôs a taça de lado. — Tyrion me disse uma vez que a maior parte das rameiras não nos beijam. Fodem-nos até nos deixarem sem forças, disse ele, mas nunca sentimos os lábios delas nos nossos. Acha que a minha irmã beija o Kettleblack?

Sor Ilyn não respondeu.

— Não me parece que seria apropriado que eu mate o meu próprio Irmão Juramentado. O que tenho a fazer é castrá-lo e enviá-lo para a Muralha. Foi isso que fizeram com Lucamore, o Ardente. Sor Osmund pode não aceitar de bom grado a castração, é certo. E há os irmãos a ter em conta.

Irmãos podem ser perigosos. Depois de Aegon, o Indigno, condenar Sor Terrence Toyne à morte por dormir com a sua amante, os irmãos de Toyne fizeram o melhor que puderam para o matar. O melhor que puderam não foi suficientemente bom, graças ao Cavaleiro do Dragão, mas não foi por falta de tentar. Está escrito no Livro Branco. Está lá tudo, menos o que fazer com Cersei.

Sor Ilyn passou um dedo pela garganta.

— Não — disse Jaime. — Tommen perdeu um irmão, e o homem em quem pensava como pai. — Se eu fosse matar a sua mãe, me odiaria por isso... e aquela sua querida esposa arranjaria maneira de orientar esse ódio para benefício de Jardim de Cima.

Sor Ilyn sorriu de um modo que não agradou a Jaime. Um sorriso feio. Uma alma feia.

— Fala demasiado — disse ao homem.

No dia seguinte, Sor Dermot da Mata de Chuva regressou ao castelo de mãos vazias. Quando lhe perguntaram o que encontrara, respondeu:

— Lobos. Milhares dos malditos bichos. — Perdera duas sentinelas para os lobos. Tinham saltado da escuridão para as atacar. — Homens armados revestidos de cota de malha e couro fervido, e mesmo assim as feras não tiveram medo deles. Antes de morrer, Jate disse que a alcateia era liderada por uma loba de um tamanho monstruoso. Um lobo gigante, ajuizando pelas suas palavras. Os lobos também penetraram nas nossas linhas de cavalos. Os malditos bastardos mataram o meu baio preferido.

— Um anel de fogueiras em volta do seu acampamento poderia mantê-los afastados — disse Jaime, embora tivesse dúvidas. Poderia o lobo gigante de Sor Dermot ser o mesmo animal que atacara Joffrey perto do entroncamento?

Lobos ou não, Sor Dermot voltou a sair na manhã seguinte, com cavalos frescos e mais homens, a fim de reatar as buscas por Brynden Tully.

Nessa mesma tarde, os senhores do Tridente vieram ter com Jaime para pedir licença para regressarem às suas terras. Concedeu-a. Lorde Piper também quis saber novidades do filho Marq.

— Todos os cativos serão resgatados — prometeu Jaime. Enquanto os senhores do rio se retiravam, Lorde Karyl Vance deixou-se ficar para trás para dizer:

— Lorde Jaime, tem que ir a Corvarbor. Enquanto for Jonos quem está junto dos seus portões, Tytos nunca se renderá, mas sei que dobrará o joelho perante você. — Jaime agradeceu-lhe o conselho.

O Varrão Forte foi quem partiu em seguida. Queria regressar a Darry, conforme prometera, e dar combate aos foras da lei.

— Atravessamos metade do raio do reino, e para quê? Para que pudesse fazer Edmure Tully mijar-se nas bragas? Não há nisso nenhuma canção. Preciso duma luta. Quero o Cão de Caça, Jaime. Ele ou o senhor das Marcas.

— A cabeça do Cão de Caça é sua se conseguir apanhá-la — disse Jaime — mas Beric Dondarrion deve ser capturado vivo, para poder ser levado para Porto Real. A sua morte tem de ser vista por mil pessoas, senão não ficará morto. — O Varrão Forte respondeu àquilo com um resmungo, mas acabou por concordar. No dia seguinte partiu com o escudeiro e os homens de armas, além do Jon Imberbe Bettley, que decidira que caçar foras da lei era preferível a regressar para junto da esposa, famosa pela sua falta de beleza. Segundo se dizia, ela possuía a barba que faltava a Bettley.

Jaime ainda tinha de lidar com a guarnição. Até ao último homem, juraram que nada sabiam sobre os planos de Sor Brynden ou para onde ele teria ido.

— Estão mentindo — insistiu Emmon Frey, mas Jaime achava que não.

— Se não partilhar os seus planos com ninguém, ninguém pode te trair — fez notar. A Senhora Genna sugeriu que alguns dos homens podiam ser levados a interrogatório. Jaime recusou. — Eu dei a Edmure a minha palavra de que se se rendesse, a guarnição poderia partir sem ser incomodada.

— Isso foi cavalheiresco da sua parte — disse a tia — mas o que aqui é necessário é força, não cavalaria.

Pergunte a Edmure se eu sou cavalheiresco, pensou Jaime. Pergunte sobre o trabuco. De algum modo não lhe parecia que fosse provável que os meistres o confundissem com o Príncipe Aemon, o Cavaleiro do Dragão, quando escrevessem as histórias de ambos. Mesmo assim, sentia-se curiosamente satisfeito. A guerra estava praticamente ganha. Pedra do Dragão caíra e não duvidava de que Ponta Tempestade cairia em breve, e não importava que Stannis andasse pela Muralha. Os nortenhos não gostariam mais dele do que os senhores da tempestade. Se Roose Bolton não o destruísse, o inverno o faria.

E ele fizera a sua parte ali em Correrrio sem chegar a pegar em armas contra os Stark e os Tully.

Depois de encontrar o Peixe Negro, ficaria livre para regressar a Porto Real, onde devia estar. O meu lugar é com o meu rei. Com o meu filho.

Tommen gostaria de saber disso? A verdade custaria o trono ao rapaz.

Prefere ter um pai ou uma cadeira, rapaz? Jaime desejava conhecer a resposta. Ele gosta de por o seu selo em papéis. O rapaz podia nem sequer acreditar nele, certamente. Cersei diria que era mentira. Minha querida irmã, a enganadora. Teria de arranjar alguma forma de arrancar Tommen às suas garras antes que o rapaz se transformasse noutro Joffrey. E, já agora, devia arranjar outro pequeno conselho para o rapaz. Se Cersei puder ser posta de lado, Sor Kevan pode concordar em servir como Mão de Tommen.

E se não concordasse, bem, os Sete Reinos não tinham falta de homens capazes. Forley Prester seria uma boa escolha, ou Roland Crakehall. Caso fosse necessário um homem que não fosse oriundo do oeste para aplacar os Tyrell, sempre havia Mathis Rowan... ou até Petyr Baelish. O Mindinho era tão amigável como esperto, mas o seu nascimento era demasiado baixo para constituir ameaça para qualquer um dos grandes senhores, dado não possuir contingente próprio.

O perfeito Mão.

A guarnição Tully partiu na manhã seguinte, despida de todas as suas armas e armaduras. Cada homem foi autorizado a levar comida para três dias e a roupa que trazia no corpo, depois de prestar um juramento solene de nunca mais pegar em armas contra Lorde Emmon ou a Casa Lannister.

— Se tiver sorte, um em cada dez homens pode respeitar esse juramento — disse a Senhora Genna.

— Ótimo. Prefiro enfrentar nove homens a enfrentar dez. O décimo podia ser aquele que me mataria.

— Os outros nove te matarão com igual rapidez.

— Antes isso do que morrer na cama. — Ou na latrina.

Dois homens decidiram não partir com os outros. Sor Desmond Grell, o antigo mestre de armas do Lorde Hoster, preferiu vestir o negro. O