explora os talentos e as oportunidades à sua disposição são coisas muito mais importantes para um ateu genuíno do que para os devotos mais religiosos. Longe de perder o sentido, o que você faz nesta vida subitamente torna-se incrivelmente importante, já que você só tem essa única possibilidade de fazer a coisa certa, de mudar alguma coisa, de contribuir de alguma forma para aqueles que você ama ou que seguirão seus passos.
Um homem apaixonado em suas convicções, Adams usou sua importância, intelecto e tremenda energia para contribuir de várias formas. Com seus livros, artigos, aparições públicas e donativos, Douglas Adams inspirou
mudanças
positivas
e
apoiou
diversas causas significativas. Sua paixão por animais selvagens nunca esteve mais presente do que quando viajou ao redor do mundo com o zoólogo Mark Cawardine para documentar as espécies em risco de extinção para seu maravilhoso livro Last Chance to See (Ultima oportunidade para ver). E não parou nisso, pois ele seguiu em frente, transformando-se no energético e carismático patrono tanto do Diana Fossey Goriila Fund quanto do Save the Rhino International. Entre suas muitas ações para apoiar este último, houve a famosa vez em que escalou o Kilimanjaro, fantasiado de rinoceronte, para ajudar a divulgar sua causa.
Aparentemente não houve um assunto sequer sobre o qual não tenha se interessado. Sua crítica social afiada é recoberta pelo mais fino humor, tornando-se por vezes áspera e adoravel-mente ofensiva de uma forma que muitas vezes parece a nós, australianos, ser essencialmente a nossa própria. A educação, ou a falta dela, freqüentemente emergia em meio a seu descontentamento de várias formas. Tricia Macmillan (com quem você irá se encontrar em breve) é provavelmente a mais espantosa celebração da subclasse intelectual oprimida que já encontrei na ficção contemporânea. Ele também se preocupava muito em transmitir a idéia de que os recursos naturais eram finitos e estão acabando, com avisos ecológicos ocultos em quase tudo que escreveu.
A tecnologia era uma enorme paixão de Douglas Adams, que provavelmente possuiu e usou mais computadores da marca Apple do que qualquer outra pessoa, a não ser talvez o próprio Steve Jobs. Ele era um tanto peculiar nesse ponto, pois achava que a tecnologia poderia ser usada para salvar nosso planeta de quase todos os males, incluindo o tédio e a extinção da espécie. Essa noção o colocava em franca oposição com muitos conservadores mais prosaicos, os quais ansiavam pelo retorno das carroças puxadas a cavalo, talvez para que o ruído agradável dos cascos batendo ao longe os distraísse do aumento exponencial nas emissões de gases que causam o efeito estufa. Ele lutou até o fim pela visão de que as novas tecnologias são a extensão mais natural da mente humana.
Como um todo, Douglas Adams era um indivíduo extraordinário, que deixou um enorme vazio nesta dimensão quando morreu subitamente de um ataque cardíaco, no dia 11 de maio de 2001. Muitas pessoas sentem uma enorme falta dele, mesmo aquelas como eu que nunca apertaram sua mão. Depois de ler este livro você entenderá o porquê.
Esta edição da Editora Sextante do Guia do Mochileiro das Galáxias tem sido esperada por um longo tempo. Contudo, dentro de umas 100 páginas, estou certo de que você concordará comigo que a espera valeu a pena. A genialidade de Douglas Adams e a forma como ele usa as situações mais absurdas para nos fazer rir certamente encontrarão ecos no amor pela vida e no bom humor que meus amigos brasileiros têm de sobra.
Divirta-se!.
BRADLEY TREVOR GREIVE
Autor de Um Dia "Daqueles"
1 Richard Dawkins. The Guardian, 14 de maio de 2001. 2 John & Mary Gribbin. Richard Feynman: Uma vida na ciência, Viking, 1997.
3 Nicholas Wroe. The Guardian, junho 3, 2000.
Muito além, nos confins inexplorados da região mais brega da Borda Ocidental desta Galáxia, há um pequeno sol amarelo e esquecido.
Girando em torno deste sol, a uma distância de cerca de 148 milhões de quilômetros, há um planetinha verde-azulado absolutamente insignificante, cujas formas de vida, descendentes de pri-matas, são tão extraordinariamente primitivas que ainda acham que relógios digitais são uma grande idéia. Este planeta tem - ou melhor, tinha - o seguinte problema: a maioria de seus habitantes estava quase sempre infeliz. Foram sugeridas muitas soluções para esse problema, mas a maior parte delas dizia respeito basicamente à movimentação de pequenos pedaços de papel colorido com números impressos, o que é curioso, já que no geral não eram os tais pedaços de papel colorido que se sentiam infelizes. E assim o problema continuava sem solução. Muitas pessoas eram más, e a maioria delas era muito infeliz, mesmo as que tinham relógios digitais. Um número cada vez maior de pessoas acreditava que havia sido um erro terrível da espécie descer das árvores. Algumas diziam que até mesmo subir nas árvores tinha sido uma péssima idéia, e que ninguém jamais deveria ter saído do mar. E, então, uma quinta-feira, quase dois mil anos depois que um homem foi pregado num pedaço de madeira por ter dito que seria ótimo se as pessoas fossem legais umas com as outras para variar, uma garota, sozinha numa pequena lanchonete em Rickmansworth, de repente compreendeu o que tinha dado errado todo esse tempo e finalmente descobriu como o mundo poderia se tornar um lugar bom e feliz. Desta vez estava tudo certo, ia funcionar, e ninguém teria que ser pregado em coisa nenhuma. Infelizmente, porém, antes que ela pudesse telefonar para alguém e contar sua descoberta, aconteceu uma catástrofe terrível e idiota, e a idéia perdeu-se para todo o sempre.
Esta não é a história dessa garota.
É a história daquela catástrofe terrível e idiota, e de algumas de suas conseqüências.
É também a história de um livro, chamado O Guia do Mochileiro das Galáxias - um livro que não é da Terra, jamais foi publicado na Terra e, até o dia em que ocorreu a terrível catástrofe, nenhum terráqueo jamais o tinha visto ou sequer ouvido falar dele.
Apesar disso, é um livro realmente extraordinário.