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Ford não conseguia dormir. Estava muito excitado por estar novamente com o pé na estrada. Haviam terminado seus 15 anos de exílio, justamente quando ele estava quase perdendo as esperanças. Viajar com Zaphod por uns tempos lhe parecia uma perspectiva interessante, ainda que houvesse algo de ligeiramente estranho em seu semiprimo que ele não conseguia definir com clareza. O fato de ele se tornar presidente da Galáxia era surpreendente, como também o era o modo como abandonara seu cargo. Haveria uma razão para seu gesto? Não adiantaria perguntar-lhe - Zaphod jamais justificava o que fazia. Ele tornara a imprevisibilidade uma forma de arte. Fazia tudo com uma mistura de extraordinária genialidade e incompetência ingênua, sendo muitas vezes difícil saber distinguir uma coisa da outra.

Arthur dormia; estava absolutamente exausto.

Alguém bateu à porta de Zaphod. A porta se abriu.

- Zaphod...?

- Que é?

A silhueta de Trillian desenhava-se à entrada da cabine. -Acho que acabamos de encontrar o que você está procurando.

- É mesmo?

Ford desistiu de tentar dormir. No canto de sua cabine havia uma pequena tela de computador e um teclado. Sentou-se ante o terminal e tentou redigir um novo verbete a respeito dos vogons para o Mochileiro, mas não conseguiu pensar em nada que fosse agressivo o bastante, por isso desistiu. Vestiu um roupão e foi até a ponte de comando.

Ao entrar, surpreendeu-se em ver duas figuras excitadas, debruçadas sobre o painel de controle.

- Está vendo? A nave está prestes a entrar em órbita - dizia Trillian. - Tem um planeta aí. Justamente nas coordenadas que você previu. Zaphod ouviu um barulho e olhou em volta.

- Ford! Venha dar uma olhada nisso.

Ford foi dar uma olhada. Viu uma série de números na tela.

- Está reconhecendo essas coordenadas galácticas?-perguntou Zaphod.

- Não.

- Vou lhe dar uma pista. Computador!

- Oi, pessoal! - disse o computador, simpático. - Isso aqui está virando uma festa, não é mesmo?

- Cale a boca e mostre as telas - disse Zaphod.

A iluminação da cabine diminuiu. Pontos de luz acenderam-se nos painéis, refletidas nos quatro pares de olhos que perscrutavam as telas de monitoração.

Não havia absolutamente nada nelas.

- Está reconhecendo? - cochichou Zaphod. Ford franziu as sobrancelhas.

- Hum... não.

- O que você está vendo?

- Nada.

- Está reconhecendo?

- Sobre o que você está falando?

- Estamos na nebulosa da Cabeça de Cavalo. Uma enorme nuvem escura.

- E você queria que eu adivinhasse isso porque não aparece nada na tela?

- Os únicos lugares da Galáxia em que a tela fica preta são os interiores das nebulosas escuras.

- Muito bem.

Zaphod riu. Claramente, estava muito entusiasmado por algum motivo, uma empolgação quase infantil.

- Mas isso é incrível, isso é demais!

- Qual o grande barato de estar dentro de uma nuvem de poeira? - perguntou Ford.

- O que você espera encontrar aqui? - retrucou Zaphod.

- Nada.

- Nenhuma estrela? Nenhum planeta?

- Nada.

- Computador! - gritou Zaphod. - Vire o ângulo de visão 180 graus, e nada de comentários bestas!

Por um instante, nada aconteceu. De repente, surgiu uma luminosidade no canto do telão. Uma estrela vermelha do tamanho de um pires começou a atravessar a tela, rapidamente seguida de uma outra - um sistema binário. Então um grande crescente surgiu no canto da tela - um brilho vermelho que aos poucos se esvaía em negro, o lado noturno do planeta.

- Achei! - exclamou Zaphod, com um tapa no painel. -Achei!

Ford ficou olhando para a tela estupefato.

- O que é isso?

- Isso - respondeu Zaphod - é o planeta mais improvável que jamais existiu.

Capítulo 15

[Trecho do Guia do Mochileiro das Galáxias, p. 634.784, 5a seção. Verbete: Magrathea.)

Há muito tempo, nas brumas do passado, nos dias de glória do antigo Império Galáctico, a vida era selvagem, exuberante e livre de impostos. Grandes espaçonaves navegavam entre sóis exóticos, em busca de aventuras e riquezas nos mais remotos confins do espaço galáctico. Naqueles tempos, os espíritos eram bravos, as apostas eram altas, os homens eram homens de verdade, as mulheres eram mulheres de verdade e as criaturinhas peludas de Alfa do Centauro eram criaturinhas peludas de Alfa do Centauro de verdade. E todos desafiavam terrores desconhecidos para realizarem feitos grandiosos e corajosamente conjugarem infinitivos jamais conjugados. Assim foi forjado o Império.

Naturalmente, muitos homens enriqueceram enormemente, mas isto era natural e não era problema nenhum, pois ninguém era realmente pobre - pelo menos ninguém importante. E para todos os mercadores mais ricos, como era inevitável, a vida tornou-se um tanto tediosa e insatisfatória, levando-os a pensar que isto era devido as limitações dos mundos em que eles haviam se estabelecido - nenhum deles era inteiramente satisfatório. Ou o clima não era muito bom no final da tarde, ou o dia era meia hora mais comprido do que devia ser, ou o oceano era precisamente da tonalidade errada de rosa. Assim, surgiram circunstâncias favoráveis ao nascimento de uma espetacular indústria: a construção de planetas de luxo sob medida. A sede dessa indústria era o planeta Magrathea, cujos engenheiros hiperespaciais drenavam a matéria por buracos brancos no espaço para transformá-la em planetas de sonho - planetas de ouro, planetas de platina, planetas de borracha macia cheios de terremotos, todos eles encantadoramente feitos segundo as mais detalhadas especificações determinadas pelos homens mais ricos da Galáxia.

Mas tamanho foi o sucesso dessa indústria que o próprio planeta Magrathea logo se tornou o planeta mais rico de todos os tempos e o resto da Galáxia ficou reduzido à

mais negra miséria. Assim, o sistema entrou em colapso, o Império entrou em colapso e um longo período de silêncio submergiu um bilhão de mundos famintos, um silêncio perturbado apenas pelos ruídos das canetas dos estudiosos, que passavam suas noites em claro elaborando pequenos tratados confiantes em que defendiam o valor de uma economia política planejada.

Magrathea desapareceu e logo se transformou numa lenda obscura... Hoje em dia, em nossos tempos esclarecidos, é claro que ninguém acredita numa palavra disso.