Выбрать главу

Bilbo ficou horrorizado, agora que os notava pela primeira vez, balançando nas sombras, ao ver um pé de anão surgindo do fundo de um dos embrulhos, ou aqui e ali a ponta de um nariz, um pedaço de barba ou de capuz.

A aranha se dirigiu para o embrulho mais gordo — “É o pobre Bombur, aposto”, pensou Bilbo — e deu um forte beliscão no nariz que estava de fora. Ouviu-se um grito abafado lá dentro, e um pé surgiu e chutou a aranha, direto e forte. Bombur ainda vivia. Bilbo ouviu um ruído como o de uma bola murcha sendo chutada, e a aranha enraivecida caiu do galho, conseguindo segurar-se em seu próprio fio bem em cima da hora. As outras riram.

— Você estava certa — disseram elas —, a carne está viva e ainda por cima dando pontapés!

— Logo vou dar um fim nisso — chiou a aranha furiosa, subindo de novo no galho.

Bilbo percebeu que chegara o momento de fazer alguma coisa. Não podia subir para atacar as feras e não tinha nada com que atirar, mas, olhando em volta, viu que naquele lugar havia muitas pedras no que parecia ser o leito de um riacho seco. Bilbo era ótimo em atirar pedras e não demorou muito para que encontrasse uma bela pedra, lisa e em forma de ovo, que se encaixava perfeitamente em sua mão. Quando menino, costumava praticar atirando em bichos, até que coelhos e esquilos, e até mesmo pássaros, fugiam de seu caminho como um relâmpago quando o viam abaixar-se, e, mesmo adulto, ele passara grande parte de seu tempo jogando malha, dardos, tiro-ao-alvo, boliche e outros jogos não violentos do tipo mira e arremesso — na verdade sabia fazer um monte de coisas, além de soprar anéis de fumaça, propor adivinhas e cozinhar, que eu ainda não tive tempo de lhes contar.

Não há tempo agora. Enquanto Bilbo apanhava pedras, a aranha alcançava Bombur, que logo estaria morto. Naquele momento Bilbo atirou. A pedra acertou em cheio a cabeça da aranha, que caiu da árvore sem sentidos, estatelando-se no chão, com todas as pernas para o ar.

A próxima pedra passou zunindo através de uma grande teia, arrebentando suas cordas, a aranha que estava no meio dela caiu — plof — morta. Depois disso houve grande confusão na colônia das aranhas, e garanto-lhes que elas esqueceram os anões por algum tempo. Não podiam ver Bilbo, mas podiam muito bem adivinhar a direção de onde as pedras vinham.

Depressa como um raio, vieram correndo e balançando na direção do hobbit, lançando seus fios em todas as direções, até que o ar parecia cheio de armadilhas.

Bilbo, entretanto, logo se esgueirou para um outro lugar. Ocorreu-lhe a idéia de atrair as furiosas aranhas cada vez mais para longe dos anões, se pudesse, fazê-las ficar curiosas, excitadas e raivosas, tudo ao mesmo tempo. Quando umas cinquenta tinham chegado ao lugar onde ele antes estivera, Bilbo jogou mais algumas pedras nelas e em outras que tinham parado mais atrás, depois, dançando em meio às árvores, começou a cantar uma canção para enfurecê-las e atraí-las todas para onde estava, e também para permitir que os anões ouvissem sua voz. Foi isto o que cantou:

Aranha velha e gorda tecendo sua teia! Velha e gorda aranha, você não me apanha! Aranhinha! Aranhinha! Você não vai parar? Largue dessa teia e venha me pegar! Aranhoca, aranhoca, você é só barriga, Aranhoca, aranhoca, você é uma boboca! Aranhinha! Aranhinha! Você já vai descer? Não pode me prender. Aqui em cima estou na minha!

Uma canção não muito boa, talvez, mas vocês devem se lembrar de que ele mesmo teve de improvisá-la, num momento muito delicado. O efeito, de qualquer forma, foi o esperado. Enquanto cantava, jogou mais algumas pedras e bateu os pés no chão. Praticamente todas as aranhas do lugar vieram atrás dele: algumas desceram ao chão, outras correram ao longo dos galhos, pulando de árvore em árvore ou jogando novas cordas através dos espaços escuros. Vieram no encalço do barulho mais depressa do que ele esperava. Estavam terrivelmente raivosas. Além das pedras, nenhuma aranha jamais gostou de ser chamada de “Aranhoca”, e “boboca”, é claro, é ofensivo para qualquer um.

Bilbo correu para se esconder num lugar diferente, mas várias das aranhas tinham agora ido para diversos pontos da clareira onde viviam, e se ocupavam em tecer teias em todos os espaços entre os troncos das árvores. O hobbit logo ficaria preso numa cerca densa de teias feita em toda a sua volta — pelo menos essa era a idéia das aranhas. Parado no meio dos bichos caçando e tecendo, Bilbo juntou toda a sua coragem e começou uma nova canção:

Aranha gordona, aranha bobona, tecendo a teia pra me pegar. Minha carne é gostosa, é a mais saborosa, mas você não consegue me achar! Eu estou aqui, aranhinha malvada, você é gorda, você é modorrenta. Você não me pega, por mais aplicada, em sua teia gosmenta.

Com isso, virou-se e percebeu que o último espaço entre duas altas árvores fora fechado por uma teia — mas, por sorte. Não uma teia adequada, apenas longos fios de teia de aranha, duplamente grossos, passados apressadamente para a frente e para trás de um tronco a outro.

Empunhou então sua pequena espada. Cortou os fios em pedaços e saiu cantando.

As aranhas viram a espada, embora eu ache que não sabiam do que se tratava, e imediatamente todo o bando veio correndo atrás do hobbit pelo chão e pelos galhos, pernas peludas pulando, pinças e fiandeiras estalando, olhos esbugalhados, cheios de espuma e ira. Seguiram-no floresta adentro até que Bilbo não ousou avançar mais. Então, mais silencioso que um rato, ele voltou.

Tinha muito pouco tempo, sabia disso, antes que as aranhas frustradas voltassem para suas árvores, onde estavam pendurados os anões.

Nesse intervalo teria de resgatá-los. A pior parte do serviço era alcançar o longo galho do qual pendiam os embrulhos. Acho que não teria conseguido se, por sorte, uma aranha não tivesse deixado uma corda pendurada, com sua ajuda, embora a corda grudasse nas mãos e o machucasse, ele subiu — mas deparou com uma aranha velha, modorrenta, malvada e gorda que ficara para trás vigiando os prisioneiros, e estivera ocupada a beliscá-los para ver qual era o mais suculento. Pensara em começar o banquete enquanto as outras estavam longe, mas o Sr. Bolseiro estava com pressa e antes que a aranha soubesse o que se passava, sentiu a ferroada do hobbit, rolou do galho e caiu morta no chão.

O próximo serviço de Bilbo era libertar um anão. O que devia fazer? Se cortasse a corda na qual estava pendurado. O pobre anão cairia de uma altura razoável. Meneando o corpo ao longo do galho (o que fez com que os pobres anões dançassem e balançassem como frutos maduros), alcançou o primeiro embrulho.

“Fili ou Kili”, pensou ele, por causa da ponta de um capuz azul que aparecia em cima: “Mais provavelmente Fili”, pensou ele, ao ver a ponta de um nariz comprido saindo do meio dos fios. Conseguiu, debruçando-se, cortar a maioria dos fios fortes e pegajosos que o prendiam, e então, chutando e se debatendo muito, a maior parte de Fili emergiu. Receio que Bilbo realmente tenha rido ao vê-lo mexendo os braços e pernas enrijecidos enquanto dançava suspenso pelas axilas nas cordas das aranhas, exatamente como um desses brinquedos engraçados que se equilibram num arame.

De um modo ou de outro, Fili conseguiu subir no galho, e depois fez o que pôde para ajudar o hobbit, embora sentisse enjôo e mal-estar por causa do veneno das aranhas e por ter ficado suspenso e amarrado a maior parte da noite e o dia seguinte, apenas com o nariz de fora. Levou um tempo até que conseguisse retirar aquela coisa nojenta dos olhos e sobrancelhas, e, quanto á barba, teve de cortá-la quase que por inteiro.

Bem, os dois começaram a içar primeiro um anão e depois outro, para então cortarem os fios que os prendiam. Nenhum deles estava melhor que Fili, e alguns estavam pior. Alguns mal tinham conseguido respirar (narizes grandes algumas vezes são úteis, como vocês podem perceber) e outros tinham sido mais envenenados.