- Que raio se passa contigo, ó tu, que não sei como te chamas? Gritou. Excedeste o tempo em quinze segundos.
A minha carreira na rádio terminara.
Paul Ash não me convidou para viajar pelo país com ele, mas este concurso de Paul Ash teve uma consequência interessante. Otto, Natalie, Richard, Seymour, Eddie, Howard e Steve, todos eles mudaram o apelido para Sheldon. O único Schechtel que restou foi o tio Harry.
No princípio de Maio, o meu primo Seymour espantou-nos a todos anunciando que ia casar.
Ele só tinha dezenove anos, mas parecia-me que fora adulto quase toda a vida.
Eu conhecera a noiva, Sidney Singer, quando vivera em Denver.
Sidney era uma jovem e atraente secretária que trabalhara no escritório de corretagem do tio Harry, onde Seymour a conheceu. Achara-a calorosa e inteligente, com um sentido de humor simpático.
O casamento foi simples, apenas com os membros da família presentes. Quando a cerimônia terminou, dei os parabéns a Seymour.
- É uma rapariga espetacular. Guarda-a bem disse.
- Não te preocupes, é o que tenciono fazer.
Seis meses mais tarde, atravessavam um divórcio complicado.
- O que foi que aconteceu? Perguntei a Seymour.
- Ela descobriu que eu tinha um caso.
- E pediu o divórcio?
- Não. Perdoou-me.
- Então, porque é que...
- Apanhou-me com outra pessoa. Foi aí que pediu o divórcio.
- Costumas vê-la?
- Não. Ela odeia-me. Disse-me que nunca mais me queria ver. Partiu para Hollywood. Tem um irmão que vive lá. Arranjou um emprego na MGM como secretária de uma diretora. A Dorothy Arzner.
A minha curta incursão na rádio deixara-me um agradável sabor na boca e fiquei excitado com as possibilidades que oferecia. A rádio podia muito bem ser a profissão que eu procurava. Em todos os minutos livres que tinha visitava a WBBM e outras estações de rádio de Chicago à procura de um emprego como locutor. Não havia empregos, ponto final. Tive de encarar o fato de que estava de regresso à velha armadilha, sem qualquer perspectiva de futuro.
Uma tarde de domingo, quando todos tinham saído do apartamento, sentei-me ao pequeno piano. Fiquei ali, a compor uma melodia. Concluí que não era má e criei uma letra para ela. Chamei-lhe "My Silent Self". Olhei para ela e pensei “e agora?” Podia deixá-la no banco do piano ou podia tentar fazer alguma coisa com ela.
Optei por tentar fazer alguma coisa.
Nesse ano de 1936, os maiores hotéis do país tinham orquestras nos seus salões de baile que eram transmitidas por rádio por todo o país. No hotel Bismarck, o chefe de orquestra era um simpático músico chamado Phil Levant. Eu nunca falara com ele, mas, de vez em quando, quando ele passava pelo bengaleiro a caminho do salão, costumávamos acenar com a cabeça um ao outro.
Decidi mostrar-lhe a minha música. Quando nessa noite ele passou pelo bengaleiro, chamei-o:
- Desculpe-me, senhor Levant. Compus uma música e gostava de saber se estaria interessado em lhe dar uma olhadela.
A expressão no seu rosto deu-me uma idéia do número de vezes que já ouvira esta proposta, mas ele foi muito educado.
- Terei muito gosto. Respondeu.
Dei-lhe uma cópia da folha da música. Ele olhou-a de relance e seguiu o seu caminho. E acabou-se, pensei.
Uma hora mais tarde, Phil Levant estava de volta ao bengaleiro.
- Aquela tua música... Começou a dizer. Eu nem conseguia respirar.
- Sim?
- Gosto dela. É original. Parece-me que pode ser um sucesso. Importavas-te que eu a orquestrasse e a tocássemos?
Importar?
- Não, claro que não. Isso é... É maravilhoso. Respondi. Ele gostara da minha música!
Na noite seguinte, enquanto eu pendurava chapéus e casacos, dos lados do salão de baile ouvi a minha música, "My Silent Self”, a ser tocada. Fiquei extasiado. Como a orquestra tinha difusão nacional, haveria pessoas a ouvir a minha música em todo o país. Era uma sensação arrebatadora.
Já era tarde quando, nessa noite, terminei o meu trabalho. Fui para casa e, como estava exausto, decidi tomar um banho quente.
Exatamente no momento em que começava a relaxar, Otto entrou a correr na casa de banho.
- Tens uma chamada para ti. A esta hora?
- Quem é?
- Diz que se chama Phil Levant.
Saltei da banheira, agarrei numa toalha e corri para o telefone.
- Senhor Levant?
- Sheldon, tenho aqui um editor da Harms Music Company. Ouviram a tua música na rádio, em Nova Iorque. Querem editá-la.
Quase deixei cair o telefone.
- Podes vir até cá agora? Ele está à tua espera.
- Estou a caminho.
Sequei-me apressadamente e vesti-me num ápice. Apanhei uma cópia da folha da música.
- Que é que se passa? Quis Otto saber. Expliquei-lhe.
- Posso levar o carro?
- Claro. - E deu-me as chaves - Tenha cuidado.
Corri pelas escadas abaixo, entrei no carro e dirigi-me para a Outer Drive, a caminho do hotel Bismarck. A minha cabeça girava com a excitação de poder vir a ter a minha primeira música editada quando, de repente, me apercebi do som de uma sirene mesmo atrás de mim e vi as luzes vermelhas a girar. Enquanto me chegava para o lado, o polícia saiu da moto e dirigiu-se ao carro.
- Qual é a pressa?
- Senhor guarda, eu não me apercebi que estava com excesso de velocidade. Estou a caminho de um encontro com um editor de música no hotel Bismarck. Trabalho lá, no bengaleiro. Há uma pessoa interessada em editar a minha música e...
- Carta de condução?
Mostrei-lhe a minha carta. Meteu-a no bolso.
- Muito bem. Acompanhe-me. Fiquei a olhar para ele.
- Acompanho-o onde? Passe-me uma multa. Eu estou cheio de...
- Agora as regras são outras respondeu. Já não passamos multas. Agora levamos os prevaricadores diretamente para a esquadra.
O coração caiu-me aos pés.
- Senhor guarda, eu tenho de ir a esta reunião. Se me pudesse passar a multa, eu teria muito gosto em...
- Eu disse para me acompanhar. Não tinha outra hipótese.
Ele pôs a moto a funcionar e colocou-se à minha frente. Segui-o. Em vez de me ir encontrar com o meu novo editor, estava a caminho de uma esquadra de polícia.
Cheguei à esquina seguinte no momento exato em que a luz passou de amarelo para vermelho. Ele passou. Eu parei, à espera que mudasse outra vez para verde. Quando comecei a avançar, o polícia na moto não se via em lado nenhum. Andei devagarzinho, para ter a certeza de que ele não ia pensar que eu tentava escapar. E quanto mais avançava mais otimista ia ficando. Ele desaparecera. Esquecera-se de mim. Andava a procura de outra pessoa para mandar para a cadeia. Aumentei a velocidade e dirigi-me ao Bismarck.
Parei o carro na garagem e apressei-me até ao bengaleiro. Não podia acreditar no que estava a ver. O polícia estava lá dentro à minha espera, e estava furioso:
- Pensou que se livrava de mim?
Eu não sabia o que dizer.