No final da semana seguinte, um desconhecido aproximou-se de mim.
- Onde está o filho da mãe de Chicago? Não gostei do tom de voz dele.
- Por quê?
- Porque o gerente da cadeia RKO mandou todos os anunciadores vir ver o sacana a trabalhar e a aprenderem a fazer o que ele faz.
- Eu digo-lhe quando ele voltar.
E virei-me e anunciei num tom de voz normaclass="underline"
- Lugares disponíveis. Não precisam esperar. Lugares disponíveis. Não precisam esperar.
A vantagem de trabalhar durante o dia é que continuava a ter tempo para visitar os editores de música e passara a ter as noites livres, de forma que, pelo menos três noites por semana, ia ao teatro ver peças, sentando-me nos lugares mais baratos do segundo balcão. Vi Room Service, Abie’s Irish Rose, Tobacco RoaA, You Can’t Take it With You... A variedade era infinita.
Sidney Rosenthal, o meu novo amigo, arranjara um emprego e um dia sugeriu:
- Porque não juntamos o nosso dinheiro e saímos daqui?
Excelente idéia.
Uma semana mais tarde saímos do YMCA e mudamo-nos para o hotel Grand Union, na rua Trinta e Dois. Tínhamos dois quartos e uma salinha e, depois do pequeno quarto do YMCA, parecia o máximo do luxo.
Numa carta que recebi de Natalie, esta chamava a minha atenção para o fato de termos um primo afastado que vivia em Nova Iorque e que era dono de uma concessão no cassino Glen Cove, em Long Island. Sugeria que lhe telefonasse. Chamava-se Clifford Wolfe. Telefonei-lhe e ele não podia ter sido mais cordial.
- Soube que estavas algures em Nova Iorque. O que fazes? Expliquei.
- Que tal vires trabalhar para mim no bengaleiro, três noites por semana?
- Ia adorar respondi. E tenho um amigo que...
- Podes trazê-lo.
E assim, três noites por semana, Sidney Rosenthal e eu íamos até Long Island, ao cassino Glen Cove, e ganhávamos três dólares cada um a pendurar casacos e chapéus. Surripiávamos também toda a comida que conseguíamos da mesa do bufete.
Um carro que transportava outros empregados do cassino apanhava-nos e levava-nos até Long Island, à uma hora e meia de distância. No final da noite, quando acabávamos de trabalhar, éramos transportados de volta ao nosso hotel. O dinheiro extra enviava-o todo para Natalie. Invariavelmente, ela devolvia-me.
Uma noite, quando entrava para o bengaleiro Clifford Wolfe parou a olhar para mim, de sobrolho franzido.
- Esse fato que tens vestido...
Estava amarrotado e com ar pouco cuidado.
- Sim?
- Não tens nada melhorzinho?
Abanei a cabeça, embaraçado. O meu guarda roupa cabia dentro de uma maleta.
- Receio que não.
- Vou tratar disso. Respondeu.
Na noite seguinte, quando cheguei ao Glen Cove, Clifford Wolfe deu-me um fato em sarja azul e disse:
- Quero que vás ao meu alfaiate e o mandes pôr à tua medida. A partir desse dia, sempre que fui ao Glen Cove, usava o fato de Clifford Wolfe.
As minhas inexplicáveis alterações de humor persistiam. Ou estava extremamente excitado ou à beira do suicídio. Num excerto de uma carta que mandei a Natalie e a Otto, com data de 26 de Dezembro de 1936, escrevi:
”De momento, não me sinto com grande força para continuar esta luta. Não faço idéia se vou conseguir vencer. Se estivesse mais seguro das minhas capacidades, tudo seria muito mais fácil.”
Um mês mais tarde, escrevi:
”Bom, no que diz respeito às músicas, parece que somos capazes de ter acertado. Chappel ouviu uma das novas, mandou-nos compor de novo o refrão e que a levássemos de volta. Eles são muito esquisitos, e terem gostado das nossas músicas é encorajador.”
Houve duas ocasiões em que os meus discos saíram do sítio e, de ambas às vezes, tive de ficar de cama durante três dias. Foi num dos períodos de euforia que o meu futuro se abriu perante mim. Durante uma das minhas incursões ao Brill Building, encontrei um homem baixinho e janota com um sorriso simpático. Não fazia a mínima idéia quem ele era. Por acaso estava no escritório da Remick na altura em que o gerente ouvia uma das minhas músicas.
O gerente abanou a cabeça.
- Não é o que andamos a procura...
- Mas pode vir a ser um enorme sucesso... Implorei. "When love is gone, love is gone, the stars forget to glow, and we can hear much sadder songs than we were meant to hear...”
”Quando o amar se foi, o amor se foi, as estrelas esquecem de brilhar e acabamos por ouvir canções mais tristes do que as que devíamos ouvir...”.
O gerente encolheu os ombros. O desconhecido com o sorriso simpático estudava-me.
- Deixe-me cá ver isso.
Dei-lhe a folha de papel com a música e ele analisou-a.
- Bom, a letra é muito boa comentou. Como se chama?
- Sidney Sheldon. Estendeu a mão.
- Eu sou Max Rich.
Conhecia o nome. Ele tinha duas canções populares que eram no momento um sucesso. Uma chamava-se ”Smile, Dam Ya, Smile” e a outra era uma novidade "The Girl in the Little Green Hat”.
- Sidney já alguma vez lhe editaram alguma música? Sempre a mesma pergunta. Eu estava desanimado.
- Não. Eu olhava para a porta. Ele sorriu.
- Então, vamos mudar isso. Gostaria de trabalhar comigo? Fiquei estupefato. Esta era exatamente a oportunidade pela qual eu tanto ansiara.
- Eu... Eu ia gostar muito respondi. Mal conseguia falar.
- Tenho o meu escritório aqui neste edifício, no segundo andar. Venha ter comigo amanhã de manhã, pelas dez horas, e começamos a trabalhar.
- Ótimo!
- Traga todas as letras que tiver em casa. Engoli em seco.
- Cá estarei senhor Rich.
Eu estava num estado de euforia.
Assim que contei a Sidney Rosenthal o que acontecera, ele respondeu:
- Parabéns! Isso é que é! O Max Rich consegue editar tudo.
- Eu posso mostrar-lhe também algumas das tuas músicas propus. E...
- Trata das tuas primeiro.
- Está bem.
Nessa noite, Sidney Rosenthal e eu tivemos um jantar de celebração, mas eu estava demasiado excitado para ser capaz de comer. Tudo aquilo que eu um dia ansiara estava prestes a tornar-se realidade. Músicas de Max Eich e Sidney Sheldon. Os nomes soavam bem juntos.
Tinha a sensação de que Max Rich era um excelente homem com quem trabalhar e tinha a certeza que algumas das minhas letras lhe iam agradar.
Comecei a fazer um telefonema para Natalie e Otto, mas pensei que era melhor esperar até ter começado.
Nessa noite, quando fui para a cama, pensei:
”Porque é que Max Rich quer compor comigo quando pode compor com qualquer pessoa que lhe apeteça? Eu não sou ninguém. Ele só está a ser simpático. Imaginou em mim um talento que eu não tenho e vai ter uma desilusão. Não sou suficientemente bom para trabalhar com ele.”