Preciso que me ligue para um número em Nova Iorque. E deu-me o número.
Retirei a cavilha correspondente ao quarto e fiz a ligação para Nova Iorque.
Ao fim de uma dúzia de toques, respondeu uma mulher:
- Está lá?
- Tenho uma chamada para si informei. É só um momento, que vou passar.
Tirei a cavilha que entrava nos números dos quartos e fiquei a olhar para o painel. Não tinha a mínima idéia de qual fora o hóspede que me pedira a chamada. Olhei para os buracos no painel, à espera de alguma inspiração. Sabia mais ou menos de que zona viera à chamada. Comecei a ligar para todos os quartos dessa secção, na esperança de acertar. Acabei por acordar uma dúzia de hóspedes.
- Tenho em linha a chamada que pediu para Nova Iorque.
- Não conheço ninguém em Nova Iorque.
- Tenho em linha a chamada que pediu para Nova Iorque.
- Você está doido? São três da manhã!
- Tenho em linha a chamada que pediu pára Nova Iorque.
- Não é para mim, seu idiota!
Na manhã seguinte, quando o gerente chegou, comentei:
- Ontem se passou uma coisa engraçada...
- Já sei e não achei nada engraçado. Está despedido.
Era óbvio que não estava destinado a ser gerente de uma cadeia de hotéis. Chegara a hora de seguir em frente.
Vi um anúncio de um part-time como instrutor numa escola de condução e decidi concorrer ao lugar. A maior parte dos alunos eram assustadores. Os sinais vermelhos não tinham qualquer significado para eles e todos pareciam ficar confusos quanto à diferença entre o acelerador e o travão. Eram nervosos, cegos ou potenciais suicidas. Cada vez que ia trabalhar sentia que estava a pôr a minha vida em risco.
Mantinha a sanidade fazendo leituras para vários estúdios, sempre que os leitores deles estavam ocupados. Um dos estúdios para quem fiz algumas sinopses foi a Twentieth-Century-Fox. O editor chefe chamava-se James Fisher e era um inteligente jovem de Nova Iorque. Um dia, ao final da tarde, telefonou-me:
- Está livre amanhã?
- Estou. Mais três dólares.
- Vejo-o às dez.
- Está bem.
Talvez fosse um livro grande. Dez dólares. Os meus fundos estavam outra vez a ficar muito fracos.
Assim que cheguei ao escritório, Fisher estava à minha espera.
- Que é que acha de um trabalho efetivo aqui? Perguntou. Eu nem conseguia articular as palavras.
- Eu... Eu ia gostar muito.
- Então, está contratado. Vinte e três dólares por semana.
Estava de volta ao mundo do espetáculo.CAPÍTULO 10
Trabalhar na Twentieth-Century-Fox era radicalmente diferente de trabalhar nos estúdios da Universal. Enquanto na Universal tudo era descontraído e informal, a Fox era um estúdio gerido de forma prática e eficiente. A razão principal era Daryl F. Zanuck, o chefe de produção. Contrariamente à maior parte dos outros diretores dos estúdios, Zanuck era um executivo que tinha tudo sob controle. Era um brilhante homem do mundo do espetáculo, que se envolvia em cada fase de todos os filmes que o estúdio fazia e que sabia exatamente o que queria. Tinha também um profundo sentido de quem era. Uma vez, numa reunião de produção do estúdio virou-se para o assistente e disse-lhe:
- Não diga ”sim” antes de eu acabar de falar.
Daryl Zanuck tinha um enorme respeito pelos escritores. Disse uma vez: ”O sucesso de um filme tem a ver com três coisas: a história, a história, a história. Só não deixem que os escritores se apercebam de como são importantes.”
Havia doze leitores na Fox, que variavam em idades dos trinta e cinco aos sessenta anos. Na sua maioria, eram familiares dos executivos dos estúdios, que estavam na folha de pagamentos como uma espécie de sinecura.
Julian Johnson, um dos executivos mais importantes dos estúdios Fox, chamou-me ao seu gabinete uma manhã. Johnson era uma figura imponente, alto e robusto. Em tempos fora casado com Texas Guinan, a famosa rainha dos clubes noturnos.
- Sidney, de hoje em diante, só vais trabalhar em sinopses para o senhor Zanuck. Sempre que ele estiver interessado num livro ou numa peça nova, quero que sejas tu a tratar disso.
- Ótimo.
- Cada sinopse será um trabalho rápido...
- Não se preocupe.
Para dizer a verdade, eu estava encantado. A partir daquele momento, poderia ler os melhores romances e peças que seriam propostas ao estúdio.
Como Zanuck se sentia sempre pressionado para conseguir bater todos os outros estúdios no que dizia respeito a material novo, tive muitas vezes que trabalhar até depois da meia-noite. Eu gostava do meu trabalho, mas estava impaciente por me tornar um escritor. O estúdio iniciara uma secção de escritores assistente e eu comentei com Julian Johnson que gostaria de poder fazer parte dela. Ele foi compreensivo, mas não me encorajou:
- Estás a trabalhar para o Zanuck. Isso é mais importante. Respondeu.
O meu pequeno gabinete era num edifício velho, com madeiras que rangiam, situado nos fundos dos terrenos. À noite tudo ficava deserto e por vezes eu não me sentia muito à vontade quando lá tinha de ficar sozinho a trabalhar, imerso nas trevas. Uma noite, trabalhava à pressa num livro no qual Zanuck estava muito interessado. Era uma história de fantasmas bastante assustadora.
Tinha acabado de escrever à máquina a frase ”Ele abriu a porta do armário e, quando o cadáver sorridente que lá se encontrava começou a cair em cima dele...”, quando a porta do meu armário se abriu para trás, os livros começaram a voar pelos ares e a sala começou a abanar. Bati todos os recordes de velocidade, ao sair dali para fora.
Foi o meu tremor de terra mais memorável.
No princípio de Setembro, um desconhecido entrou no meu gabinete e apresentou-se:
- O meu nome é Alan Jackson. Sou leitor na Columbia.
- Prazer em conhecer. Apertamos as mãos. Que posso fazer por si?
- Queremos formar uma associação de leitores e precisamos da sua ajuda.
- Para quê?
- Para convencer os leitores que cá trabalham de que precisamos de uma associação e que nos devemos unir. Se conseguirmos que os leitores de todos os estúdios se juntem, podemos formar uma comissão, que passará a negociar com os estúdios. Neste momento não temos qualquer força. Estamos todos mal pagos e assoberbados de trabalho. Está disposto a ajudar-nos?
Eu não me sentia nem mal pago nem assoberbado de trabalho, mas sabia que era essa a situação da maioria dos leitores.
- Vou ver o que posso fazer.
- Ótimo.
- Mas é possível que haja um problema. Avisei-o.
- Qual é?
- É que quase todos os leitores que trabalham aqui na Fox são familiares de um executivo do estúdio. Não me parece que estejam interessados em envolver-se, mas vou tentar.
Para meu grande espanto, todos os leitores dos estúdios concordaram em fazer parte da associação, assim que esta estivesse formada. Quando contei as novidades a Alan Jackson, ele respondeu:
- Mas isso é excelente. Já temos todos os outros leitores dos outros estúdios. Vamos criar uma comissão de negociações. A propósito, você faz parte dela.