No quarto dia, quando regressava ao hotel, o recepcionista entregou-me uma carta. Começava com um Saudações.
O coração caiu-me aos pés. Tinha de me apresentar no dia seguinte na secção de recrutamento do Bronx. A minha carreira como escritor terminara mesmo antes de começar. Eu desertava de três espetáculos que contavam comigo e ia para fora enfrentar uma morte provável. Mas, de repente, senti-me invadido por uma estranha sensação de júbilo.
Eu sabia que as minhas emoções estavam completamente descontroladas. Não fazia a mínima idéia de qual era o meu problema. Olhei para a idiota cara de felicidade que via refletida no espelho e desatei a chorar.
Às nove em ponto da manhã seguinte, apresentei-me para o meu exame médico no quartel general de recrutamento do Exército. O exame era igual ao que fizera na Califórnia. Terminou em trinta minutos e mandaram-me ir ao gabinete do médico.
Este estudava uma folha de papel.
- Segundo o seu relatório médico, tem uma hérnia discal.
- Sim, senhor. Mas eles sabiam disso quando fiz o meu primeiro exame médico e...
Ele interrompeu-me.
- Não o deviam ter aceitado. Se sofresse um ataque durante um momento de combate, ia pôr em risco não só a sua vida como a de todos à sua volta. Isto não é aceitável.
- Mas...
- Vou dar-lhe um 4F. Eu estava sem palavras.
Vou participar ao recrutamento da Califórnia.
- Está dispensado.
Fiquei sentado por um longo momento, aparvalhado, a tentar perceber o que acabara de acontecer. Em seguida levantei-me para sair.
Quando me dirigia para a porta, o médico disse:
- E dispa esse uniforme. Eu era de novo um civil.
Foi com uma sensação de irrealidade que, nessa tarde, entrei numa loja de roupas e comprei dois fatos, cuecas, camisas e gravatas. Estava pronto para voltar ao meu trabalho como dramaturgo.
A 4 de Agosto de 1943, a peça The Merry Widow estreou no Majestic Theatre e acabou por ser uma das mais bem sucedidas reposições que a Broadway alguma vez vira. As críticas foram fantásticas.
New York Times: “Uma digna reposição”.
Herald Tribune: “Dá à cidade algo de que se orgulhar e congratular.”
Mirror: “Belo, opulento, de bom gosto e afinado.”
Do Journal-American: “Uma encantadora, relaxante e hilariante história de amor.”
Walter Winchelclass="underline" “Agosto teve uma estréia retumbante. Reposição de The Merry Widow esgotou.”
Howard Barnes: “A nova época abriu com uma deliciosa reposição. The Merry Widow foi trazida à cena no Majestic com bom gosto, eloquência de melodias e esplendor.”
Frank Sullivan: ”Sinto-me feliz de informar que a obra The Merry Widow se libertou do seu pó e foi toda ela renovada e modernizada pelas destras mãos dos senhores Sidney Sheldon e Ben Roberts.”
Uma já estava, só faltavam duas.
O espetáculo esteve em cena na Broadway durante quase um ano e andaram em tournée outros dois. Na noite da estréia, depois do espetáculo, toda a companhia foi celebrar ao Sardi’s. Vincent Sardi estava de pé à porta.
Dirigi-me a ele:
- Senhor Sardi, finalmente já lhe posso pagar.
Sorriu:
- Já me pagou. Fui ver o seu espetáculo esta noite.
CAPÍTULO 15
Dorothy Kilgallen era uma mulher criativa com um sentido de humor engraçado. Era um prazer colaborar com ela.
Encontrara a fama inicialmente como jornalista criminal e depois como uma poderosa colunista da Broadway e de Hollywood. Mais tarde, regressaria à sua marca registrada de reportagem de investigação e teve um papel primordial em conseguir um segundo julgamento para o doutor Sam Shepard, cujo caso de assassínio serviu de base para a popular série de televisão O Fugitivo.
Enquanto Dorothy e Ben trabalhavam em Dream with Music, eu e Guy Bolton terminávamos o libreto de jackpot. Vinton Freedley decidira mandar o espetáculo em tournée antes de estrear na Broadway e acabou por ser uma longa e rentável experiência. Além de Allan Jones e Nanette Fabray, o espetáculo contava agora com a cooperação de Jerry Lester e Betty Garrett.
No dia 13 de Janeiro de 1944, no Alvin Theatre, jackpot estreou na Broadway. A maior parte dos críticos adorou.
Herald Tribune: ”Jackpot dança a um compasso ágil, uma produção elegante.”
Mirror: ”Jackpot tem canções que ficam no ouvido e um elenco à altura. Nanette Fabray é encantadora. Jerry Lester e Benny Baker uns hilariantes provocadores”.
New York Post. ”Mais outro êxito da fábrica de Freedley”.
Eu e Ben tínhamos outro triunfo. Fomos celebrar ao Sardi’s. Faltava um mês para o meu vigésimo sétimo aniversário.
Todos sabíamos que o nosso maior êxito vinha aí.
Desde o princípio que era óbvio para todos que Dream with Music estava destinado a ser um gigantesco sucesso. Ao contrário de Vinton Freedley, Richard Kollmar não olhava a despesas para criar uma das produções mais elaboradas que a Broadway alguma vez vira. Stewart Chaney concebeu os complicados cenários, Miles White os maravilhosos fatos de época. George Balanchine era o coreógrafo. A produção incluía um tapete voador, no qual Ronald Graham, o nosso protagonista masculino, fazia a entrada em cena. Uma enorme roda giratória circundava o palco e os cenários incluíam um palácio de Bagdade, um bazar e uma reserva cheia de cor com animais dançantes.
Eu e Ben mantivemos o mesmo horário de trabalho. Durante o dia, eu escrevia com Dorothy Kilgallen na sua maravilhosa penthouse e à noite, no meu quarto de hotel, eu e Ben trabalhávamos sempre que ele conseguia escapar de Fort Dix.
Uma noite em que escrevíamos, deixei cair uma caneta e, quando me baixei para apanhá-la, o meu disco deslizou e eu caí ao chão em agonia, incapaz de me mexer. Ben chamou uma ambulância e passei os três dias seguintes no hospital. Má altura. Tínhamos muito trabalho pela frente.
Quando saí do hospital, recomeçamos e terminei o libreto.
Eu, Dorothy e Ben estávamos sentados no teatro a assistir aos ensaios, que eram de cortar a respiração. Sobre o palco, uma imensidão de fatos coloridos, cenários maravilhosos e a dança maravilhosa de Vera Zorina.
As cenas românticas entre Vera Zorina e Ronald Graham, o ator principal, funcionavam bem. Richard Kollmar observou atentamente o ensaio geral e anunciou:
- Estamos prontos.
Natalie e Marty vieram à Nova Iorque para a noite de estréia. Sentamos todos na primeira fila, nos lugares destinados a casa. A sala encheu rapidamente. Por uma misteriosa química, os amantes de teatro sabem sempre quando estão a assistir à estréia de um espetáculo que vai ser um sucesso. Um frêmito de excitação percorria a audiência. Eu e Ben olhamos um para o outro e sorrimos. Três êxitos de uma assentada.
A orquestra atacou a abertura, enchendo a sala com a bela e melódica música de Clay Warnick e de Edward Eager. O espetáculo começara.