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O fato de eu escrever deixava Otto nervoso. O fato de escrever poesia deixava-o muito nervoso. Mais tarde soube que, como não se queria sentir embaraçado quando a revista rejeitasse o meu poema, substituiu o meu nome pelo do meu tio Al e mandou-o assim.

Duas semanas mais tarde, Otto foi almoçar com Al.

- Otto, passou-se uma coisa muito esquisita. Porque será que a revista Wee Wisdom me mandou um cheque de cinco dólares?

Foi assim que o meu primeiro escrito profissional foi editado sob o nome Al Marcus.

Um dia a minha mãe entrou a correr no apartamento, quase sem fôlego. Abraçou-me e exclamou:

- Sidney, acabo de vir da casa da Bea Factor. Ela diz que vais ser mundialmente famoso! Não é maravilhoso?

Bea Factor era uma amiga dela conhecida por ser médium, e muitas pessoas conhecidas atestavam-no. Quanto a mim, era maravilhoso que a minha mãe acreditasse no que ela dissera.

Chicago nos anos vinte e trinta era a cidade dos barulhentos comboios de superfície, carroças de gelo puxadas por cavalos, praias atulhadas de gente, clubes de strip-tease, currais malcheirosos e o massacre do dia de São Valentim, onde sete mafiosos foram alinhados contra a parede de uma garagem e abatidos a tiros de metralhadora.

O sistema escolar era gerido como a cidade, com dureza e agressividade. Havia coisas a voar pelas salas de aula. E nem eram os alunos que atiravam, eram os professores. Uma manhã, quando andava no terceiro ano, um professor não gostou de alguma coisa que um aluno disse, pegou num dos pesados tinteiros de vidro que havia em cima das secretárias e atirou-o pelos ares em direção ao aluno. Se lhe tivesse acertado na cabeça, tinha-o morto. Fiquei demasiado aterrorizado para voltar à tarde.

A minha disciplina preferida na escola era o Inglês. Uma das tarefas da turma era ler à vez em voz alta um livro de pequenos contos chamado Elgin Reader. Chegávamos a um conto de Põe, de O’Henry ou de Tarkington e eu ficava a sonhar que um dia o professor diria: ”Passem para a página vinte do vosso livro de leitura” e, espanto dos espantos, ali estaria uma história escrita por mim. De onde me vinha este sonho, não faço idéia. Talvez fosse um recuo atávico a algum antepassado há muito desaparecido.

O décimo andar do hotel Sovereign era a velha piscina da vizinhança. Sempre que podia, levava Richard até lá para brincar na piscina. Ele tinha cinco anos.

Um dia, deixei-o na zona baixa da piscina e nadei até a zona mais funda. Enquanto falava com umas pessoas, Richard saiu da piscina, à minha procura. Chegou junto da parte mais funda, escorregou e caiu lá dentro. Foi direitinho para o fundo. Eu vi o que estava a acontecer, mergulhei e puxei-o para cima.

Nunca mais houve piscina para nós.

Quando tinha doze anos, andava no sétimo ano da escola de Marshall Field, em Chicago, e tinha uma aula de Inglês onde podíamos trabalhar nos nossos próprios projetos. Decidi escrever uma peça sobre um detetive que investigava um homicídio. Quando terminei, entreguei-a a professora. Ela leu-a, chamou-me à sua secretária e disse:

- Sidney, eu acho que isto é mesmo muito bom. Queres levá-la a cena?

Se queria!

- Claro que sim, professora.

- Vou tratar das coisas para que a possas apresentar no grande auditório.

De repente lembrei-me da grande excitação de Natalie com a profecia de Bea Factor. Sidney vai ser mundialmente famoso.

Eu estava muito excitado. Aquilo era o princípio. Quando os meus companheiros de classe ouviram a notícia, todos quiseram entrar na peça. Decidi que não só a ia produzir e dirigir como tomaria parte nela. É claro que nunca antes dirigira uma peça, mas sabia exatamente o que queria.

Comecei a escolher os atores. Permitiram-me que ensaiasse depois das aulas no grande auditório e, pouco tempo depois, a minha peça era o tema das conversas da escola. Deram-me todos os adereços que pedi: sofás, cadeiras, mesas, um telefone...

Foi uma das épocas mais felizes da minha vida. Sabia, sem qualquer sombra de dúvida, que era o princípio de uma maravilhosa carreira. Se eu, com a minha idade, era capaz de escrever uma peça de sucesso, não havia limite para onde podia chegar. Podia até vir a ter peças na Broadway, com o meu nome a néon.

Fiz um ensaio geral com os colegas que escolhi, todos já com os fatos vestidos, e o ensaio correu perfeitamente. Fui ter com a professora:

- Estou pronto, quando quer que apresente a peça? Perguntei. Ela olhava para mim, radiante.

- Porque não amanhã à noite?

Nessa noite não consegui dormir. Sentia que todo o meu futuro dependia do sucesso da peça. Deitado na cama revi cena por cena, à procura de falhas. Não consegui encontrar nenhuma. Os diálogos eram excelentes, a trama desenrolava-se com leveza e a peça tinha um final inesperado. Todos iam adorar.

Na manhã seguinte, assim que cheguei à escola, a professora tinha uma surpresa para mim.

- Consegui cancelar todas as aulas de Inglês para que todos possam vir ao auditório ver a tua peça.

Nem queria acreditar. Ia ser um sucesso ainda maior do que imaginara.

Às dez da manhã, o imenso auditório estava cheio. Não só lá estavam os alunos de Inglês como também o diretor e todos os professores que ouviram falar da minha peça, ansiosos por verem o trabalho de uma criança prodígio. No meio de toda a excitação, eu estava calmo. Muito calmo. Parecia-me perfeitamente normal que tudo aquilo me estivesse a acontecer, tão cedo na vida. Tu vais ser mundialmente famoso.

Chegou à hora do espetáculo. As conversas no auditório começaram a morrer e o teatro ficou silencioso. O cenário consistia numa sala de estar simples, onde um rapaz e uma rapariga representavam o papel de um marido e uma mulher, cujo amigo acabara de ser assassinado. Estavam sentados lado a lado num sofá.

Eu fazia o papel de um detetive que investigava o homicídio. Estava de pé nos bastidores, preparado para fazer a minha entrada. A minha deixa era o momento em que o rapaz olhava para o relógio e dizia:

- O inspetor deve chegar em breve.

Mas, em vez de dizer ”breve”, ele enganou-se e começou a dizer ”um minuto”, mas parou a meio e tentou transformar ”minuto” em ”breve”. O que saiu foi ”O inspetor deve chegar em min-breve”. Ele corrigiu imediatamente, mas era demasiado tarde. Min-breve? Era o som mais engraçado que eu alguma vez ouvira. Era tão engraçado que comecei a rir. E nunca mais consegui parar. Quanto mais pensava na palavra, mais gargalhadas dava.

O rapaz e a rapariga no palco olhavam fixamente para mim nos bastidores, à espera que eu entrasse. Mas eu não me conseguia mexer, porque ria perdidamente. Não conseguia parar. As gargalhadas tomaram conta de mim e fui ficando cada vez mais histérico.

A peça fora interrompida mal tinha começado.

Depois do que pareceu uma eternidade, ouvi vinda do auditório, a voz da minha professora a dizer:

- Sidney, vem cá fora.

Forcei-me a abandonar o abrigo dos bastidores e cambaleei até meio do palco. A minha professora estava no meio do auditório de pé, a ouvir as minhas gargalhadas frenéticas.

- Pára imediatamente! Ordenou. Mas como podia eu? Min-brevé;