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Quando voltei a olhar para cima, o garoto subia os degraus do muro do reservatório e estava quase a chegar ao topo. Era muito perigoso. Olhei em volta à procura de quem estava a tomar conta dele, mas não vi ninguém. Enquanto eu olhava em redor, o garoto chegou ao cimo. Escorregou e caiu dentro do reservatório. Um guarda numa das torres viu o que se passou, mas eu sabia que ele nunca ia conseguir chegar a tempo ao garoto. Levantei-me e corri como um louco até ao muro. Subi o mais depressa que fui capaz. Quando cheguei ao cimo, olhei para dentro e vi o garoto a afundar-se. Atirei-me à água e consegui apanhá-lo. Debatia-me para conseguir manter-nos aos dois a flutuar.

Logo a seguir, chegaram os socorros e tiraram-nos de lá de dentro. Puseram-me no hospital durante uns dias, porque eu engolira uma data de água e tinha algumas contusões por me ter atirado.

Estávamos presos as palavras dele.

Quis a sorte que o garoto fosse o filho do diretor da prisão. Ele e a mulher foram ao hospital visitar-me.

Otto olhou para nós e sorriu.

- E a história acabaria aqui se não fosse um pormenor. É que descobriram que eu não sabia nadar e então a partir daí foi à loucura. De repente passei a ser um herói. Estava nos jornais e na rádio. A prisão foi inundada por telefonemas, cartas e telegramas a oferecerem-me emprego e a pedirem clemência para mim. O diretor e o governador tiveram uma reunião e decidiram que, dado o meu delito não ser sério, seria uma boa política perdoarem-me Otto estendeu os braços. E aqui estou eu.

Éramos de novo uma família.

Pode ter sido coincidência, mas, subitamente, uma bolsa à qual concorrera um ano atrás, da B’nai Brith uma organização judaica filantrópica foi-me concedida.

Era um milagre. Eu seria o primeiro da minha família a frequentar a universidade. Uma página fora virada. Admiti que, afinal, talvez pudesse existir um futuro para mim algures. Mas, mesmo com a bolsa, continuávamos desesperados com falta de dinheiro.

Seria eu capaz de aguentar o bengaleiro sete noites por semana, a drugstore Afremow aos sábados e um horário completo na universidade?

Logo se veria.

A Northwestern University situa-se em Evanston, em Illinois, a dezoito quilômetros de Chicago. A universidade, cujos terrenos ocupam cento e quarenta acres nas margens do Lago Michigan, era espetacular. Às nove da manhã de uma segunda-feira, entrei na secretaria.

- Estou aqui para entrar na universidade.

- O seu nome?

- Sidney Sheldon.

A funcionária pegou num livro enorme e procurou.

- Ora cá está. Que cursos quer frequentar?

- Todos. Olhou para mim.

- Como?

- Quero dizer, todos os que me forem permitidos. Enquanto aqui estiver, quero aprender tudo o que puder.

- E o que é que mais lhe interessa?

- Literatura.

Fiquei a olhar enquanto ela procurava no meio de uma série de panfletos. Tirou um e deu-mo.

- Aqui tem uma lista dos nossos cursos. Analisei-a.

- Isto é ótimo.

Marquei todos os cursos que queria e em seguida devolvi-lha. Ela olhou para a lista.

Está a marcar o número máximo de cursos?

- Exatamente. Franzi o sobrolho. Mas o Latim não está aí e eu estou muito interessado em tirar Latim.

Olhou outra vez para mim.

- Acha mesmo que consegue lidar com tudo isto? Sorri.

- Claro.

Ela escreveu ”Latim”.

Da secretaria passei para a cozinha da cafeteria.

- Vocês precisam de um ajudante?

- Sempre.

Bom, já tinha mais um emprego, mas ainda não chegava. Sentia-me impelido a fazer mais, como se tentasse recuperar tempo perdido. Nessa tarde, dirigi-me aos escritórios do Daily Northwestern, o jornal da universidade.

- Chamo-me Sidney Schechtel disse ao homem por detrás de uma secretária com um letreiro que dizia ”Redator”. Gostava muito de trabalhar num jornal.

- Lamento, mas já temos o quadro preenchido. Tenta para o ano.

- Para o ano será demasiado tarde. - Fiquei parado a pensar - Têm alguma secção dedicada ao mundo do espetáculo?

- Uma secção dedicada ao mundo do espetáculo?

- Sim. Há sempre celebridades a vir a Chicago para fazer espetáculos. Não têm ninguém do jornal que as entreviste?

- Não. Nós...

- Faz idéia de quem está neste momento na cidade, desejosa de ser entrevistada? A Katherine Hepburn!

- Nós não estamos...

- O Clifton Webb.

- Nós nunca tivemos uma...

- O Walter Pidgeon.

- Posso falar com alguém, mas receio que...

- O George M. Cohan.

Ele começava a demonstrar interesse.

- Conhece toda essa gente? Eu não ouvi a pergunta.

- Não há tempo a perder. Quando os espetáculos deles chegarem ao fim, vão-se embora.

- Está bem. Vou dar-te uma oportunidade, Schechtel. Ele não fazia idéia de como eu estava excitado.

- Essa é a melhor decisão que alguma vez já tomou.

- Veremos. Quando podes começar?

- Já comecei. Vai ter a primeira entrevista para a próxima edição. Olhou para mim, surpreso. Já? E quem vai ser?

- É surpresa.

Era surpresa também para mim.

No pouco tempo que tinha, entrevistei muitas celebridades menores para o jornal. A minha primeira entrevista foi feita a Guy Kibbee, um ator sem importância da época. As grandes estrelas eram demasiado importantes para serem entrevistadas por um jornal universitário.

Eu trabalhava no bengaleiro, na drugstore, inscrevera-me na universidade no maior número possível de cursos incluindo Latim, tinha um emprego como ajudante de cozinha e pertencia ao quadro do Daily Northwestern. Mas, mesmo assim, ainda não me chegava. Era como estivesse possuído. Pensei no que mais podia fazer. A Northwestern tinha uma excelente equipa de futebol e não havia qualquer razão para que eu não fizesse parte dela. Tinha a certeza de que os WzTd Caís teriam todo o interesse em me terem na equipa deles.

Na manhã seguinte, dirigi-me ao campo de futebol onde a equipa treinava. Pug Rentner, que veio a ter uma gloriosa carreira na NFL, era a estrela da equipa nesse ano. Dirigi-me ao treinador, que estava numa das linhas laterais a observar o treino.

- Posso falar um minuto consigo?

- O que é que queres?

- Gostava de fazer testes para a equipe. Ele analisou-me.

National Football League (N. da T.)

- Gostavas, era? És bem constituído. Onde é que jogaste antes? Não respondi.

- No liceu? Na universidade?

- Não, senhor.

- Na preparatória?

- Não, senhor.

Ele olhava fixamente para mim.

- Tu nunca jogaste futebol?

- Não, mas sou muito rápido e...

- E gostavas de pertencer a esta equipa? Filho esquece. E a atenção dele voltou para os jogadores.