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As palavras pareciam ainda mais aterradoras porque foram pronunciadas numa voz suave.

Ele se levantou.

- Este é o seu último aviso.

Dana observou-o sair.

Não vou deixar que ele me assuste pensou ela, em desafio.

Mas sentia-se assustada.

Chegou um pacote enviado por Matt Baker. Era um enorme pacote, com chocolate, barras de granola, alimentos enlatados e uma dúzia de outros produtos não-perecíveis. Dana levou para o saguão, a fim de partilhar com os outros repórteres. Todos ficaram exultantes.

- Isso é o que eu chamo de chefe! - exclamou Saton Asaka.

- Como posso arrumar um emprego no Washington Tribune? - gracejou Juan Santos.

Kemal esperava de novo na viela. O casaco fino e puído dava a impressão de que poderia se desfazer a qualquer momento.

- Bom dia, Kemal.

Ele permaneceu calado, observando-a através das pálpebras semicerradas.

- Vou fazer compras. Gostaria de me acompanhar?

Não houve resposta.

- Deixe-me falar de outro jeito - disse Dana, exasperada. Ela abriu a porta traseira do veículo.

- Entre no carro. Agora!

O menino ainda continuou imóvel por mais um momento, chocado, depois se encaminhou para o Land Rover, devagar. Dana e Jovan observaram-no subir para o banco traseiro. Ela perguntou a Jovan:

- Pode encontrar alguma loja de departamentos ou loja de roupas que esteja aberta?

- Conheço uma.

- Vamos até lá.

Seguiram em silêncio por alguns minutos.

- Você tem mãe ou pai, Kemal?

Ele sacudiu a cabeça.

- Onde você mora?

Ele deu de ombros.

Dana sentiu-o chegar mais perto dela, como se quisesse absorver o calor de seu corpo.

A loja de roupas ficava no Bascarsija, o antigo mercado de Sarajevo. A fachada fora bombardeada, mas a loja continuava a funcionar. Dana pegou a mão esquerda de Kemal e levou-o para a loja.

- Posso ajudar? - perguntou um vendedor.

- Quero comprar um casaco para um amigo. - Ela olhou para Kemal.

- Ele tem mais ou menos esse tamanho.

- Por aqui, por favor.

Havia uma arara com casacos na seção de meninos.

Dana virou-se para Kemal.

- Qual deles você gosta?

Kemal não respondeu. Ela acrescentou para o vendedor:

- Vamos levar o marrom. - Ela olhou para a calça de Kemal.

- E acho que também precisamos de uma calça de sapatos novos.

Ao deixarem a loja, meia hora depois, Kemal vestia roupas novas. Sentou-se no banco traseiro do Land Rover sem dizer nada.

- Não sabe dizer obrigado? - indagou Jovan, irritado.

Kemal desatou a chorar. Dana abraçou-o.

- Está tudo bem, está tudo bem... - murmurou ela. Que tipo de mundo faz isso com crianças?

Quando chegaram ao hotel, Dana observou Kemal se afastar sem dizer nada.

- Alguém sabe onde ele mora? - perguntou ela a Jovan.

- Nas ruas, madame. Há centenas de órfãos como ele em Sarajevo. Não têm casa, não têm família...

- Como sobrevivem?

Jovan deu de ombros.

- Não sei.

No dia seguinte, quando Dana deixou o hotel, deparou com Kemal à sua espera, vestindo as roupas novas. O menino lava o rosto.

A grande notícia à mesa do almoço era o tratado de paz e daria certo. Dana decidiu visitar de novo o professor Milac Staka, e perguntar o que ele pensava a respeito.

- Fico feliz em vê-la de novo, srta Evans. Soube que tem feito reportagens maravilhosas, mas... - ele deu de ombros.

- Infelizmente, não tenho eletricidade para o meu aparelho de televisão. Em que posso ajudá-la?

- Eu queria sua opinião sobre o novo tratado de paz, professor.

Ele recostou-se na cadeira e disse, pensativo:

- Acho muito interessante que em Dayton, Ohio, tenham tomado uma decisão sobre o que vai acontecer no futuro de Sarajevo.

- Concordaram com uma troca, uma presidência de três pessoas, um muçulmano, um croata e um sérvio. Acha que pode dar certo, professor?

- Sim se você acreditar em milagres. - Ele franziu o rosto.

- Haverá dezoito legislativos nacionais e cento e nove governos locais diferentes. É uma babel política. Nenhum deles quer renunciar à sua autonomia. Todos insistem em ter suas próprias bandeiras, suas placas para carros, sua moeda. - Ele fez uma pausa, balançou a cabeça.

- É uma manhã de paz. Tome cuidado com a noite.

Dana Evans tinha ido além de ser uma mera repórter, estava se tornando uma lenda internacional. O que passava em suas reportagens era um ser humano inteligente e cheio de paixão. E porque Dana se importava, seus espectadores se importavam e partilhavam seus sentimentos.

Matt Baker começou a receber telefonemas de outras emissoras de televisão, dizendo que queriam transmiti-la também. O que o deixou na maior satisfação. Ela foi até lá para fazer o bem, pensou ele, e vai acabar se saindo muito bem.

Com seu novo caminhão para transmissão por satélite, Dana se tornou mais ativa do que nunca. Não se encontrava mais à mercê da empresa iugoslava de satélite. Ela e Benn decidiam que reportagens queriam fazer, Dana escrevia e transmitia. Algumas eram apresentadas ao vivo, outras em gravação. Dana, Benn e Andy saíam pelas ruas e filmavam todas as cenas necessárias, depois Dana gravava seu comentário numa sala de edição e despachavam para Washington.

Na hora do almoço, no restaurante do hotel, enormes travessas com sanduíches foram postas no centro da mesa. Os jornalistas trataram de se servir. Roderick Munn, da BBC entrou na sala com uma notícia da APP na mão.

- Ei, escutem só isto! - Ele leu a notícia em voz alta. "Dana Evans, uma correspondente estrangeira da WTE, está sendo agora exibida por uma dúzia de emissoras. A srta. Evans foi indicada para o cobiçado Prêmio Peabody..."

- Não temos sorte por conhecer uma pessoa tão famosa? - comentou um repórter, sarcástico.

Dana entrou no restaurante nesse momento.

- Oi, todo mundo. Não tenho tempo para almoçar hoje. Vou levar alguns sanduíches comigo. - Ela pegou vários, embrulhou com guardanapos de papel.

- Até mais tarde.

Os outros observavam-na em silêncio: Quando Dana saiu encontrou Kemal à sua espera.

- Boa tarde, Kemal. Não houve resposta.

- Entre no carro.

Kemal se acomodou no banco traseiro. Dana entregou-lhe um sanduíche, observou enquanto ele devorava em silêncio. Entregou outro sanduíche, e o menino começou a comê-lo no mesmo instante.

- Mais devagar - murmurou Dana.

- Para onde? - perguntou Jovan.

Dana virou-se para Kemal.

- Para onde?

Ele fitou-a, sem entender.

- Vamos levá-lo para casa, Kemal. Onde você mora?

Ele sacudiu a cabeça.

- Preciso saber. Onde você mora?

Vinte minutos depois, o carro parou na frente de um enorme terreno vazio, perto da margem do Miljacka. Dezenas de caixas de papelão grandes estavam espalhadas por ali, em meio a detritos de todos os tipos. Dana saltou do carro e virou-se para Kemal.

- É aqui que você mora?

Ele acenou com a cabeça, relutante.

- E os outros meninos também moram aqui?

Ele tornou a acenar com a cabeça.

- Quero fazer uma reportagem sobre isto, Kemal.

Ele sacudiu a cabeça.

- Não.

- Por que não?

- A polícia virá e nos levará. Não faça nada.

Dana estudou-o por um momento.

- Está certo. Eu prometo.

Na manhã seguinte, Dana deixou seu quarto no Holiday Inn. Quando ela não apareceu para o desjejum, Gabriella Orsi, da Altre Station, da Itália, perguntou:

- Onde está Dana?

Roderick Munn respondeu:

- Ela foi embora. Alugou uma casa de fazenda. Disse que queria ficar sozinha.

Nikolai Petrovich, o russo da Gorizont 22, comentou:

- Todos nós gostaríamos de ficar sozinhos. Quer dizer que não somos bastante bons para ela?

Havia um sentimento geral de desaprovação.

Na tarde seguinte, chegou outro pacote grande para Dana. Nikolai Petrovich sugeriu: