- Obrigada.
- Peter vai levá-la numa excursão pela Casa Branca. Se tiver qualquer problema, estamos aqui para ajudá-la.
- É muito gentil.
- Se não se importa, gostaria que se reunisse com o sr. Werner, o secretário de Estado. Será importante que ele ouça um relato direto sobre a situação na Herzegovina.
- Terei o maior prazer em atender - respondeu Dana.
Havia uma dúzia de homens sentados na sala de reunião do secretário de Estado, ouvindo Dana descrever suas experiências.
- Quase todos os prédios em Sarajevo foram atingidos ou destruídos por completo... Não há eletricidade e as pessoas que ainda têm carro retiram a bateria de noite para ver televisão... As ruas da cidade estão obstruídas pelos destroços de carros, carroças e bicicletas atingidos por bombas. O principal meio de transporte é andar a pé... Quando chove, as pessoas recolhem em baldes a água que sai das calhas... Não há o menor respeito pela Cruz Vermelha ou os jornalistas por lá. Mais de quarenta correspondentes já foram mortos enquanto cobriam a guerra na Bósnia, e dezenas foram feridos... Quer a atual revolta, contra Slobodan Milosevic seja ou não bem-sucedida, a impressão geral é a de que seu regime foi bastante prejudicado pelo levante popular...
A reunião prolongou-se por duas horas. Para Dana, foi ao mesmo tempo traumática e catártica, porque ao descrever os acontecimentos ela se viu revivendo as cenas terríveis, e por outro lado, experimentou um alívio por ser capaz de falar a respeito. Sentia-se esgotada quando terminou. O secretário de Estado disse:
- Quero lhe agradecer, srta. Evans. - Ele sorriu. Fico contente por ter voltado sã e salva.
- Eu também, sr. secretário.
Na noite de sexta-feira, Dana sentou-se ao lado de Jeff Connors na tribuna da imprensa em Camden Yards, para assistir ao jogo de beisebol. E pela primeira vez desde que voltara, pôde pensar em outra coisa que não a guerra. Enquanto olhava para os jogadores no campo, Dana ouvia o locutor relatando a partida:
- ...é o início do sexto turno e Nelson está lançando. Alomar posta-se numa linha no lado esquerdo para tentar uma jogada dupla. Palmeiro se vira para o quadrado do batedor. A vantagem é de dois e um. Nelson lança uma bola rápida pelo meio e Palmeiro desfere sua rebatida. Que lance! Parece que vai passar acima do muro da direita... Passou! Palmeiro está correndo pelas bases para fazer um home-run que deixará o Orioles na dianteira...
No décimo sétimo turno, Jeff levantou-se e olhou para Dana.
- Está se divertindo?
Ela fitou-o nos olhos e acenou com a cabeça.
- Estou.
De volta a Washington, depois do jogo, eles foram jantar no Bistro Twenty Fifteen.
- Quero pedir desculpas pela maneira como me comportei no outro dia - disse Dana.
- Acontece apenas que eu vivia num mundo em que... - ela parou, sem saber direito como explicar.
- Em que tudo é uma questão de vida e morte. Mas tudo mesmo. É terrível. Aquelas pessoas não têm qualquer esperança se alguém não acabar com a guerra.
- Dana, você não pode deixar sua vida em suspenso por causa das coisas que acontecem por lá - disse Jeff, gentilmente.
- Precisa recomeçar a viver. Aqui.
- Sei disso. Mas... não é fácil.
- Claro que não é. Eu gostaria de ajudá-la. Vai me permitir?
Dana fitou-o em silêncio por um longo momento.
- Por favor...
No dia seguinte, Dana tinha um almoço marcado com Jeff Connors.
- Pode ir me buscar? - perguntou ele e deu o endereço.
- Claro.
Dana especulou o que Jeff fazia ali. Era um dos bairros mais conturbados da cidade. Ao chegar, Dana descobriu a resposta.
Jeff estava cercado por dois times de beisebol, os jogadores variando na idade dos nove aos treze anos, vestindo os mais variados uniformes. Dana estacionou junto ao meio fio para observar.
- E não se esqueçam de uma coisa: nada de pressa - disse Jeff. - Quando o lançador arremessar a bola, imaginem que está se aproximando bem devagar, de tal maneira que dispõem de tempo bastante para acertá-la. Sintam o bastão acertando na bola. Deixem a mente ajudar a guiar suas mãos...
Jeff virou o rosto, viu Dana e acenou.
- Muito bem, pessoal. É isso aí, por enquanto...
Um dos garotos perguntou:
- Aquela é sua garota, Jeff?
- Só se eu tiver muita sorte. - Jeff sorriu. - Até mais.
Ele se encaminhou para o carro de Dana.
- Parece um clube e tanto - comentou Dana.
- São bons meninos. Eu os treino uma vez por semana.
Ela sorriu.
- Gosto disso.
E Dana se perguntou como Kemal estaria, o que andaria fazendo.
À medida que os dias passavam, Dana percebeu que gostava mais e mais de Jeff Connors. Ele era sensível, inteligente e divertido. Ela gostava de sua companhia. Pouco a pouco, as horríveis recordações de Sarajevo começaram a se desvanecer. Veio a manhã em que acordou sem ter tido pesadelos noturnos. Quando contou isso a Jeff, ele pegou sua mão e murmurou:
- É assim que gosto de ver minha garota.
E Dana especulou se não havia um sentido mais profundo naquelas palavras.
Havia uma carta escrita a mão esperando por Dana no escritório. Dizia: "srta. Evans, não se preocupe comigo. Estou feliz. Não me sinto sozinho. Não tenho saudade de ninguém e vou mandar as roupas que comprou para mim porque não preciso mais delas. Tenho minhas próprias roupas agora. Adeus." Estava assinado "Kemal".
A carta fora remetida de Paris e o cabeçalho era do "Lar Xavier Para Meninos". Dana leu a carta duas vezes e depois pegou o telefone. Levou quatro horas para conseguir falar com Kemal. Ouviu a voz dele, hesitante:
- Alô...
- Kemal, aqui é Dana Evans. - Não houve resposta.
- Recebi sua carta.
Silêncio.
- Só queria lhe dizer que estou contente porque você está feliz e se divertindo tanto. - Ela esperou por um momento, depois continuou:
- Eu gostaria de me sentir tão feliz quanto você. E quer saber por que não me sinto? Porque tenho saudade de você. E penso muito em você.
- Não, não pensa - murmurou Kemal.
- Não se importa comigo.
- Está enganado. Gostaria de vir para Washington e viver comigo?
Houve um longo silêncio.
- Hã... fala sério?
- Pode apostar que sim. Gostaria disso?
- Eu... - o menino começou a chorar.
- Gostaria, Kemal?
- Gostaria, madame.
- Tomarei as providências necessárias.
- Srta. Evans...
- O que é?
- Eu amo você.
Dana e Jeff Connors passeavam pelo West Potomac Park.
- Acho que vou ter um companheiro de apartamento - anunciou Dana.
- Ele deverá chegar a Washington nas próximas semanas.
Jeff fitou-a, aturdido.
- Ele?
Dana ficou satisfeita com a reação de Jeff.
- Isso mesmo. Seu nome é Kemal. Ele tem doze anos. Ela contou a história.
- Parece um ótimo garoto.
- E é mesmo. Ele passou por um verdadeiro inferno, Jeff. Quero ajudá-lo a esquecer.
Ele fitou Dana nos olhos.
- Eu gostaria de ajudar também.
E naquela noite eles fizeram amor pela primeira vez.
Washington são duas cidades. A primeira é uma cidade de excepcional beleza, arquitetura imponente, museus de categoria internacional, estátuas, monumentos aos gigantes do passado, como Lincoln, Jefferson, Washington... uma cidade de parques verdejantes, cerejeiras em flor e ar suave.
A outra Washington é uma cidadela dos desabrigados, uma cidade com um dos maiores índices de criminalidade na nação, um labirinto de assaltos e assassinatos.
O Monroe Arms é um pequeno e elegante hotel, discreto, não muito longe da esquina das ruas 27 e K. Não faz propaganda e atende principalmente a sua clientela regular. Foi construído há alguns anos por uma jovem e dinâmica empresária do setor imobiliário, Lara Cameron.