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Michael esperou que Neri servisse as bebidas. Depois falou calmamente:

— Quero apenas dizer a todos os que estão aqui que compreendo como se sentem. Sei que todos vocês respeitavam meu pai, mas agora devem se preocupar com vocês mesmos e com as suas famílias. Alguns de vocês estão em dúvida sobre como tudo o que aconteceu vai afetar os planos que tracei e as promessas que fiz. Bem, a resposta a isso é: nada. Tudo realmente continua como antes.

Clemenza balançou a sua grande cabeça de búfalo. O seu cabelo era grisalho e as suas feições, mais profundamente acentuadas em camadas adicionais de gordura, apresentavam um aspecto desagradável.

— Os Barzini e os Tattaglia vão começar agora a nos dar duro mesmo, Mike. Você tem de lutar ou fazer acordo com eles.

Todos na sala perceberam que Clemenza não se dirigira de modo formal a Michael nem tampouco usara o título de Don ao falar com ele.

— Vamos esperar para ver o que acontece — retrucou Michael. — Vamos deixar que eles rompam a paz primeiro.

— Eles já romperam, Mike — acrescentou Tessio na sua voz macia. — Abriram duas agências de bookmaker no Brooklyn esta manhã. Eu soube disso por intermédio do capitão da polícia que faz a “lista de proteção” no distrito policial. Dentro de um mês, não terei mais nem um lugar para pendurar o chapéu em todo o Brooklyn.

Michael olhou para ele pensativamente.

— Você já fez algo a respeito?

Tessio balançou a sua pequena cabeça de furão.

— Não — respondeu. — Eu não quis criar problemas para você.

— Ótimo — retrucou Michael. — Agüente firme. E acho que é isso o que quero dizer a todos vocês. Agüentem firme. Não reajam a qualquer provocação. Dêem-me algumas semanas para acertar as coisas, para ver em que direção o vento vai soprar. Então farei a melhor coisa que puder para todos os que estão aqui. Então faremos uma reunião definitiva e tomaremos algumas decisões finais.

Michael não tomou conhecimento da surpresa demonstrada por eles e mandou Albert Neri acompanhá-los até a saída. E abruptamente falou:

— Tom, espere alguns minutos.

Hagen foi até a janela que dava para a alameda. Esperou até ver que os caporegimes e Carlo Rizzi e Rocco Lampone acompanhados de Neri haviam atravessado o portão guardado. Depois voltou-se para Michael e perguntou:

— Vocês já têm todas as ligações políticas sob seu controle?

— Todas, não. Preciso de mais uns quatro meses. O Don e eu estávamos trabalhando nisso. Mas já conheço todos os juízes, fizemos isso primeiro, e alguns dos elementos mais importantes do Congresso. E a rapaziada do grande partido aqui em Nova York não foi problema, naturalmente. A Família Corleone é bem mais forte do que muita gente pensa, mas eu esperava tornar isso claro.

Ele sorriu para Hagen e arrematou:

— Acho que você compreendeu tudo agora.

Hagen acenou com a cabeça.

— Não foi difícil. A não ser quando você me pôs fora do negócio. Mas comecei a raciocinar à moda siciliana e finalmente compreendi isso também

Michael deu uma gargalhada.

— O velho disse que você compreenderia. Mas isso é um luxo a que não posso mais me dar. Preciso de você aqui. Pelo menos nas próximas semanas. É melhor você telefonar para Las Vegas e falar com sua mulher. Diga a ela que você ficará aqui apenas algumas semanas.

— Como é que você acha que eles virão a você? — perguntou Hagen pensativamente.

Michael suspirou.

— O Don me instruiu. Por intermédio de alguém íntimo. Barzini entrará em contato comigo através de alguém íntimo, de quem, aparentemente eu não desconfie.

Hagen sorriu para ele e disse:

— Alguém como eu.

Michael retribuiu o sorriso e retrucou:

— Você é irlandês, eles não confiarão em você.

— Eu sou teuto-americano — respondeu Hagen.

— Para eles, isso é irlandês — retrucou Michael. — Eles não procurarão você e não procurarão Neri porque ele é um ex-policial. Ainda mais, vocês dois são muito chegados a mim. Eles não podem arriscar tanto. Rocco Lampone não é bastante íntimo. Nem tampouco Clemenza, Tessio ou Carlo Rizzi o são.

— Aposto que vai ser Carlo — comentou Hagen.

— Veremos — respondeu Michael. — Não vai demorar muito.

Foi na manhã seguinte, enquanto Hagen e Michael estavam tomando o breakfast juntos. Michael atendeu um telefonema na biblioteca, e quando voltou para a cozinha, disse para Hagen:

— Está tudo combinado. Vou-me encontrar com Barzini daqui a uma semana. Para estabelecer uma nova paz agora que o Don morreu.

Michael deu uma gargalhada.

— Quem telefonou para você, quem fez o contato? — perguntou Hagen.

Ambos sabiam que o elemento da Família Corleone, quem quer que fosse que tivesse feito o contato se tornaria traidor.

Michael respondeu a Hagen com um sorriso pesaroso:

— Tessio.

Comeram o resto do breakfast em silêncio. Ao café, Hagen balançou a cabeça.

— Eu poderia jurar que seria Carlo ou talvez Clemenza. Jamais imaginei Tessio. É o melhor da turma.

— É o mais inteligente — respondeu Michael. — E ele fez o que lhe parece ser a coisa mais engenhosa. Ele me expõe ao golpe de Barzini e herda a Família Corleone. Ele está do meu lado e sai limpo do negócio; pensa que eu não posso ganhar.

Hagen fez uma pausa e perguntou com relutância:

— Até onde ele está pensando certo?

Michael deu de ombros.

— A coisa não parece boa. Mas meu pai era a única pessoa que sabia que ligações e poder políticos valem dez regimes. Penso que tenho agora nas mãos a maior parte do poder político do meu pai, mas sou a única pessoa que realmente sabe disso.

Ele sorriu para Hagen tranqüilizadoramente:

— Eu os farei chamar-me de Don. Mas me sinto enojado com Tessio.

— Você concordou em comparecer à reunião com Barzini? — perguntou Hagen.

— Concordei — respondeu Michael. — Daqui a uma semana. No Brooklyn, no território de Tessio, onde estaremos seguros.

Michael deu outra gargalhada.

— Tome cuidado até lá — aconselhou Hagen.

Pela primeira vez Michael falou friamente a Hagen:

— Não preciso de um consigliori para me dar esse tipo de conselho.

Durante a semana que precedeu a reunião de paz entre as Famílias Corleone e Barzini, Michael mostrou a Hagen como podia ser cauteloso. Não pôs o pé fora da alameda uma só vez, nem tampouco recebeu qualquer pessoa sem ter Neri a seu lado. Houve apenas uma complicação desagradável. O filho mais velho de Connie e Carlo devia ser crismado na Igreja Católica e Kay pediu a Michael que fosse o padrinho. Michael não aceitou.

— Não lhe peço muitas coisas — respondeu Kay. — Por favor, faça isso por mim. Connie deseja tanto que você faça. Carlo também. É muito importante para eles. Por favor, Michael.

Kay percebeu que ele ficou zangado com ela por insistir e esperava que ele recusasse. Portanto, ficou surpresa quando ele acenou com a cabeça e respondeu:

— Está bem. Mas não sairei da alameda. Diga a eles que arranjem para que o padre venha crismar o menino aqui. Eu pagarei, custe o que custar. Se eles encontrarem alguma dificuldade com o pessoal da igreja, Hagen acertará as coisas.

E assim, no dia anterior à reunião com a Família Barzini, Michael Corleone serviu de padrinho do filho de Carlo e Connie Rizzi. Ele presenteou o menino com um relógio de pulso extremamente caro e uma pulseira de ouro. Houve uma pequena festa na casa de Carlo, para a qual foram convidados os caporegimes, Hagen, Lampone e todas as pessoas que moravam na alameda, inclusive, naturalmente, a viúva de Don Corleone. Connie estava tão emocionada que abraçou e beijou o irmão e Kay durante toda a noite. E até Carlo Rizzi se tornou sentimental, apertando a mão de Michael e chamando-o de Padrinho a todo momento — um velho costume da Sicília. O próprio Michael nunca foi tão amável, tão expansivo. Connie sussurrou no ouvido de Kay: