— Meu nome é Michael Corleone — disse à enfermeira — quero ficar sentado com meu pai. Que aconteceu aos detetives que deviam estar guardando o velho?
A enfermeira era uma pequena muito bonita, denotando um ar de autoconfiança e segurança.
— Ah, o seu pai recebia muitas visitas, isso atrapalhava o serviço do hospital — respondeu ela. — A polícia veio e fez todos eles saírem há coisa de dez minutos. Depois, há apenas cinco minutos, tive de chamar os detetives ao telefone para um alarma de emergência na polícia, e assim, eles partiram também. Mas não se preocupe, estou cuidando bem do seu pai e posso ouvir qualquer som vindo do seu quarto. Por isso é que deixamos a porta aberta.
— Muito obrigado — retrucou Michael. — Vou ficar sentado com ele um pouco. Está bem?
— Apenas por alguns minutos e lamento que tenha de mandá-lo logo embora. Ë o regulamento, você sabe — respondeu a enfermeira, sorrindo.
Michael voltou para o quarto do pai. Tirou o fone do gancho e pediu à telefonista do hospital que o ligasse com a casa de Long Beach, com o aparelho da sala do escritório do canto. Sonny respondeu. Michael falou em voz baixa:
— Sonny, estou aqui no hospital, cheguei atrasado. Sonny, não há ninguém aqui. Nenhum dos homens de Tessio. Nenhum detetive na porta. O velho estava completamente desprotegido.
Sua voz tremia.
Houve um longo silêncio e depois ele ouviu a voz de Sonny em tom baixo e impressionante:
— Isso é o golpe de Sollozzo de que você falou.
— Isso foi o que pensei também — retrucou Michael. — Mas como ele conseguiu que os tiras todos saíssem daqui, e para onde foram? Que aconteceu aos homens de Tessio? Jesus, será que o patife do Sollozzo tem o Departamento de Polícia de Nova York na gaveta também?
— Tenha calma, garoto. — A voz de Sonny era tranqüilizadora. — Tivemos sorte novamente pelo fato de você ir visitar o hospital tão tarde. Permaneça no quarto do velho. Tranque a porta por dentro. Terei alguns homens aí, dentro de quinze minutos, assim que eu der alguns telefonemas. Mantenha-se aí firme e não fique apavorado. Está bem, garoto?
— Não ficarei apavorado — respondeu Michael.
Pela primeira vez desde que tudo tinha começado, sentiu uma raiva furiosa subir dentro dele, um ódio frio pelos inimigos de seu pai.
Desligou o telefone e tocou a campainha chamando a enfermeira. Resolveu usar o seu próprio raciocínio e não levar em conta as ordens de Sonny. Quando a enfermeira entrou, ele disse:
— Não quero que você se assuste, mas temos que mudar meu pai agora mesmo. Para outro quarto ou outro andar. Você pode desligar todos esses tubos para que possamos levar a cama para fora daqui?
— Isso é ridículo — disse a enfermeira. — Temos de obter permissão do médico.
— Você leu sobre o meu pai nos jornais — falou Michael rapidamente. — Você viu que não há ninguém aqui hoje à noite para protegê-lo. Eu soube agora que alguns homens estão vindo para o hospital, a fim de matá-lo. Por favor, acredite em mim e ajude-me.
Ele podia ser extraordinariamente persuasivo quando queria.
— Não precisamos desligar os tubos — replicou a enfermeira. — Podemos levar o aparelho junto com a cama.
— Você tem um quarto vazio? — sussurrou Michael.
— No fim do corredor — respondeu a enfermeira.
A mudança foi feita em questão de momentos, de modo muito rápido e eficiente. Depois Michael disse para a enfermeira:
— Fique aqui com ele até chegar ajuda. Se você ficar lá fora no seu posto pode ser atacada.
Nesse momento, ele ouviu a voz do pai vindo da cama, rouca, mas bem forte:
— Michael, é você? Que aconteceu, que é que há?
Michael inclinou-se sobre a cama. Tomou a mão do pai na sua.
— É Mike — respondeu. — Não tenha medo. Agora, ouça, não faça absolutamente qualquer barulho, especialmente se alguém chamar o seu nome. Algumas pessoas querem matá-lo, entende? Mas estou aqui, portanto não te nha medo.
Don Corleone, ainda não plenamente consciente do que lhe acontecera. no dia anterior, com terrível dor, embora sorrindo carinhosamente para o filho mais moço, queria dizer-lhe, mas era esforço demasiado:
— Por que devo ter medo agora? Muita gente tem procurado matar-me desde os meus doze anos de idade.
CAPÍTULO 10
O HOSPITAL ERA PEQUENO e dispunha apenas de uma entrada, Michael olhou pela janela para a rua lá embaixo. Havia um pátio em curva com alguns degraus que davam para a rua, na qual não havia nenhum carro.Quem quisesse penetrar no hospital teria de vir forçosamente por essa entrada. Ele sabia que não tinha muito tempo, assim saiu correndo do quarto, desceu precipitadamente os quatro pavimentos e atravessou as portas largas da entrada do andar térreo. Olhando para o lado, viu o pátio das ambulâncias e aí não havia qualquer carro, nem ambulância, estacionado.
Michael postou-se na calçada do lado de fora do hospital e acendeu um cigarro. Desabotoou o paletó e ficou sob a luz de um poste de modo que se podiam ver suas feições. Um rapaz estava vindo rapidamente da Nona Avenida, com um embrulho debaixo do braço. Usava uma túnica militar e tinha uma enorme cabeleira preta. Michael notou que o rosto lhe era familiar, quando o rapaz se aproximou da luz, mas não conseguiu reconhecê-lo. O rapaz, porém, parou em frente dele e estendeu a mão, dizendo num sotaque italiano carregado:
— Don Michael, lembra-se de mim? Enzo, o ajudante de padeiro de Nazorine, o Paniterra; o genro dele. Seu pai salvou a minha vida conseguindo que o governo me deixasse ficar aqui na América,
Michael apertou-lhe a mão. Lembrava-se dele agora.
— Vim apresentar meus respeitos a seu pai — continuou Enzo. — Será que me deixarão entrar no hospital tão tarde?
— Não, mas muito obrigado assim mesmo. Direi ao velho que você esteve aqui — disse Michael, sorrindo e balançando a cabeça.
Um carro vinha fazendo barulho pela rua e Michael ficou em expectativa. Disse para Enzo:
— Saia daqui depressa. Pode haver barulho. Você não vai querer envolver-se com a polícia.
Ele viu o medo estampar-se no rosto do rapaz. Barulho com a polícia podia significar ser deportado ou recusa de cidadania. Mas o rapaz ficou ali firme e sussurrou em italiano:
— Se houver barulho eu ficarei para ajudar. Devo muito ao Padrinho.
Michael ficou emocionado. Estava para dizer novamente ao rapaz que fosse embora, mas então pensou, por que não deixá-lo ficar? Dois homens na frente do hospital podiam intimidar qualquer bando de Sollozzo enviado para executar um trabalho. Deu um cigarro a Enzo e o acendeu para ele. Os dois estavam sob o poste de iluminação na noite fria de dezembro. As vidraças amarelas do hospital, bifurcadas pelas decorações verdes de Natal, cintilavam neles. Haviam quase acabado de fumar os cigarros, quando um carro preto comprido e baixo virou na Rua 30 vindo da Nona Avenida, e cruzou na direção deles, muito perto do meio-fio. Quase parou. Michael olhou para dentro do veículo na tentativa de ver o rosto dos ocupantes, com o corpo recuando involuntariamente. O carro parecia que ia parar, mas acelerou a marcha novamente. Alguém o reconhecera. Michael deu outro cigarro a Enzo e notou que as mãos do padeiro tremiam. Para sua surpresa, as suas próprias mãos estavam firmes.