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— Eu podia fazer isso — respondeu Sonny brandamente.

Hagen balançou a cabeça impacientemente.

— Sollozzo não deixaria você chegar a dois quilômetros de distância dele nem que estivesse em companhia de dez capitães da polícia. Além disso, você é o chefe interino da Família. Não pode expor-se ao perigo. — Hagen fez uma pausa e perguntou a Clemenza e Tessio: — Algum de vocês dois tem um homem de categoria, alguém realmente especial, que pudesse encarregar-se desse trabalho? Ele não precisaria preocupar-se com dinheiro pelo resto da vida.

Clemenza falou primeiro.

— Ninguém que Sollozzo não conhecesse, ele compreenderia imediatamente. Ele também compreenderia se eu ou Tessio fosse também.

— Que tal alguém realmente duro que ainda não fez cartaz, um tipo com cara de bobo? — perguntou Hagen.

Os dois caporegimes balançaram a cabeça negativamente. Tessio sorriu para abrandar o que ia dizer e respondeu:

— Isso é como tirar um sujeito da liga barbante para disputar o campeonato mundial.

— Tem de ser Mike — atalhou Sonny rispidamente. Por um milhão de razões. A mais importante é que eles o desmoralizaram. E ele pode executar o trabalho, garanto isso, o que é importante porque esse é o único golpe que podemos dar nesse nojento turco. Assim, temos de imaginar qual o melhor meio de ajudá-lo. Tom, Clemenza e Tessio, descubram para onde Sollozzo o levará, a fim de realizar a reunião, não me importo quanto custará isso. Quando descobrirmos, poderemos imaginar um meio de fazer uma arma chegar ás suas mãos. Clemenza, quero que você arranje para ele uma arma completamente “segura” de sua coleção, a “mais fria” que você tiver. Impossível de se identificar a quem pertence. Procure fazê-la de cano curto com um bocado de pólvora de explosão. Não precisa estar bem calibrada. Ele estará bem em cima deles quando atirar. Mike, assim que você tiver atirado, jogue a arma no chão. Não se deixe apanhar com ela na mão. Clemenza, enrole o cano e o gatilho com esse “negócio” especial que você tem para não deixar impressões digitais. Lembre-se, Mike, podemos subornar tudo, testemunhas etc., mas se o apanharem com a arma na mão vai ser difícil resolver isso. Teremos transporte e proteção, depois faremos você desaparecer para umas boas longas férias até que a situação se acalme. Você vai estar ausente por muito tempo, Mike, mas não quero que você se despeça de sua garota nem mesmo que telefone para ela. Depois que tudo estiver terminado e você estiver fora do país, mandarei dizer a ela que você está bem. Estas são as ordens.

Sonny sorriu para o irmão.

— Agora vá com Clemenza e acostume-se a manejar a arma que ele escolher. Talvez seja preciso praticar um pouco. Eu cuidarei de tudo o mais. Tudo. Está bem, garoto?

Outra vez, Michael Corleone sentiu aquele delicioso frio refrescante percorrer-lhe todo o corpo. Ele disse para o irmão:

— Você não devia ter-me dito essa bobagem a respeito de não falar com a minha garota sobre uma coisa como essa. Que diabo você pensava que eu ia fazer, telefonar para ela para dizer-lhe adeus?

— Está bem, mas você ainda é um caipira e assim tenho de lhe lembrar bem as coisas. Esqueça isso — retrucou Sonny.

— Que diabo quer você dizer com caipira? — perguntou Michael sarcasticamente. Prestei tanta atenção no velho quanto você. Como acha que fiquei tão esperto?

Ambos deram uma gargalhada.

Hagen serviu bebidas para todos. Parecia um pouco taciturno. O estadista obrigado a ir para a guerra, o advogado obrigado a ir para a sua banca.

— Bem, de qualquer forma, agora sabemos o que é que vamos fazer — declarou ele.

CAPÍTULO 11

O CAPITÃO MARK MCCLUSKEY estava sentado em seu gabinete, manuseando três envelopes cheios de talões de apostas. Franzia as sobrancelhas e desejava poder decifrar as anotações constantes dos talões. Era muito importante que conseguisse isso. Os envelopes eram os talões de apostas que a sua caravana policial havia apreendido numa batida a um dos bookmakers na noite anterior. Agora o bookmaker teria de comprar os talões na mão dele para que os apostadores não pudessem alegar que tinham ganho e levá-lo à ruína.

Era importante que o Capitão McCluskey decifrasse os talões porque não queria ser tapeado quando os vendesse ao bookmaker. Se houvesse cinqüenta mil dólares em jogo, talvez pudesse vendê-los por cinco mil. Mas se houvesse um bocado de apostas altas e os talões representassem cem mil dólares ou talvez mesmo duzentos mil, então o preço seria bem mais elevado. Mc Cluskey brincou algum tempo com o “envelope” e depois resolveu deixar que o bookmaker suasse um pouco e fizesse a primeira oferta. Isso podia dar alguma idéia sobre o valor real da coisa.

McCluskey olhou para o relógio da parede de seu gabinete. Era hora de apanhar aquele seboso turco, Sollozzo, e levá-lo até onde ele iria encontrar-se com a Família Corleone. McCluskey foi até o seu armário e começou a trocar o seu uniforme por uma roupa à paisana. Quando terminou, telefonou para a mulher dizendo que não iria jantar em casa aquela noite, porque estaria de serviço na rua. Não confiava na mulher para coisa alguma. Ela pensava que eles viviam daquele modo graças ao salário da polícia. McCluskey rosnou de alegria. A mãe dele pensava a mesma coisa, mas ele aprendera cedo. O pai lhe ensinara a viver.

O pai tinha sido sargento da policia, e toda semana pai e filho percorriam a jurisdição do velho, enquanto este ia apresentando o filho de seis anos de idade aos donos de lojas e armazéns dizendo:

— Este é o meu garotinho.

Os donos de lojas e armazéns apertavam-lhe a mão e o cumprimentavam de modo significativo, fazendo tilintar as suas caixas registradoras a fim de abri-las para dar ao garotinho um presente de cinco ou dez dólares. No fim do dia, o pequeno Mark McCluskey tinha todos os bolsos de sua roupa abarrotados de notas e sentia-se muito orgulhoso porque os amigos do pai gostavam dele o bastante para dar-lhe um presente toda vez que o viam. Naturalmente, o pai punha o dinheiro no banco para ele, para a sua educação escolar, e o pequeno Mark ficava no máximo com uma moeda de cinqüenta centavos para ele mesmo gastar.

Depois, quando Mark voltava para casa, seus tios, também policiais, perguntavam-lhe o que ele queria ser quando crescesse, e ele balbuciava infantilmente: “Polícia.” Eles davam gostosas gargalhadas. E mais tarde naturalmente, embora o pai quisesse que ele fosse para a faculdade primeiro, Mark, depois de concluir o curso secundário, preparou-se para ingressar diretamente na força policial.

Ele fora um bom policial, um valente policial. Os desordeiros que aterrorizavam as esquinas das ruas fugiam quando ele se aproximava e finalmente desapareceram por completo de sua zona. Mark era um policial duro e cortês. Nunca levava o filho para visitar os donos de lojas e armazéns a fim de arrecadar presentes em dinheiro, para não tomar conhecimento de violações de colocação de lixo e violações de estacionamento; ele apanhava o dinheiro diretamente com a própria mão, diretamente porque achava que o tinha ganho. Nunca penetrava num cinema ou entrava por engano em restaurante, quando estava fazendo a ronda a pé, como os outros policiais faziam, especialmente nas noites de inverno. Sempre cumpria os seus deveres. Dava às lojas e armazéns uma proteção eficiente, fazendo um bom trabalho. Quando bêbados vindos do Bowery se infiltravam em sua zona para pedir dinheiro, ele os escorraçava de modo tão violento que eles nunca mais voltavam. Os comerciantes de sua zona eram-lhe muito gratos. E gostavam de demonstrar sua gratidão.

Ele também obedecia ao sistema. Os bookmakers de sua zona sabiam que McCluskey jamais criaria qualquer dificuldade para conseguir uns trocados a mais, pois ele se sentia satisfeito com a parte que lhe destinavam. Seu nome estava na lista juntamente com os outros e ele nunca procurava conseguir dinheiro extra. Era um policial decente que só recebia “gaita” limpa por fora e sua ascensão no departamento de polícia foi firme, se não espetacular.