Johnny jamais comia muito, mas sabia que as moças bonitas passavam fome a fim de comprar roupas bonitas, e geralmente comiam bastante quando eram convidadas, de forma que havia comida em abundância na mesa. Havia também muita bebida; champanha num balde, uísque, conhaque e licores no aparador. Johnny serviu as bebidas e os pratos de comida já preparados. Quando acabaram de comer, ele a levou para a enorme sala de estar com a sua parede de vidro, pela qual se tinha uma magnífica vista sobre o mar. Pôs uma pilha de discos de Ella Fitzgerald no hi-fi e instalou-se no divã com Sharon. Bateu um papo com a moça, procurando descobrir o que ela fora quando criança, se tinha sido masculinizada ou louca por meninos, se tinha sido feia ou bonita, triste ou alegre. Ele sempre achava esses detalhes emocionantes, isso sempre lhe evocava o carinho que ele precisava para deitar com uma mulher.
Eles aconchegaram-se no sofá, cordial e confortavelmente. Johnny beijou-lhe os lábios, um beijo cordialmente frio, e como ela continuasse a se comportar desse jeito ele deixou que a coisa ficasse assim. Através da enorme janela panorâmica, ele podia ver o lençol azul-escuro do Pacífico deitado horizontalmente sob o luar.
— Por que não botou um de seus discos para tocar? — perguntou Sharon.
Sua voz era irritante. Johnny sorriu para ela. Achava graça por ela querer irritá-lo.
— Não sou desse tipo de Hollywood — respondeu ele.
— Toque algum para mim — pediu ela. — Ou então cante. Você sabe, como no cinema. Vou me babar e me derreter toda por você tal como aquelas garotas fazem na tela.
Johnny deu uma boa gargalhada. Quando era mais moço, fazia justamente essas coisas e o resultado era sempre teatral, as garotas procurando mostrar-se sensuais e derretendo-se, fazendo os olhos transbordar de desejo para uma câmara cinematográfica imaginária. Ele jamais pensaria em cantar para uma pequena agora; simplesmente, porque há meses não cantava, não tinha confiança em sua voz. Além disso, os amadores não imaginam como os profissionais dependem de ajuda técnica para parecerem tão bons como são. Ele podia tocar os seus discos, mas sentia a mesma timidez em ouvir sua voz apaixonada de rapaz que um homem idoso, careca, cada vez mais gordo se sente em mostrar seus retratos quando era moço e estava na flor da idade.
— Minha voz está fora de forma — desculpou-se. — E, honestamente estou enjoado de ouvir a mim mesmo.
Ambos tomaram um gole da bebida.
— Disseram-me que você está formidável nesse filme — disse ela. — É verdade que você trabalhou nele de graça?
— Apenas uni pagamento simbólico — replicou Johnny.
Ele se levantou para encher novamente de conhaque o copo dela, deu-lhe um cigarro com o monograma de ouro e fez funcionar o isqueiro a fim de acendê-lo. A garota tirou uma baforada, tomou um gole de bebida, e ele sentou-se ao seu lado. O copo dele tinha muito mais conhaque do que o dela, Johnny precisava da bebida para esquentar-se, para animar-se, para embriagar-se. A situação dele era o inverso do que normalmente ocorre. Tinha de embriagar-se em lugar da garota. Geralmente as garotas desejavam muito o que ele não desejava. Os dois últimos anos haviam sido um inferno para o seu ego, e ele usava esse meio simples para recuperá-lo, dormindo uma noite com uma garota apetitosa, levando-a para jantar algumas vezes, ofertando-lhe um presente caro e depois dando-lhe o fora da maneira mais delicada possível para não melindrá-la. E depois elas poderiam sempre dizer que tiveram um “caso” com o grande Johnny Fontane. Não era amor verdadeiro, mas não se podia deixar de falar nele se a garota era bonita e realmente simpática. Johnny detestava aquelas mulheres antipáticas, prostituídas, que queriam fazer amor com ele e depois corriam para dizer que tinham trepado com o grande Johnny Fontane, acrescentando sempre que tinham gozado mais. O que o espantava mais do que qualquer outra coisa em sua carreira eram os maridos condescendentes que quase lhe diziam no rosto que perdoavam às esposas, pois que era permitido até mesmo à mulher casada mais virtuosa ser infiel com um grande cantor e artista de cinema como Johnny Fontane. Isso realmente o desconcertava.
Johnny gostava de Ella Fitzgerald em discos. Gostava desse tipo de canto limpo, desse tipo de linguagem limpa. Era a única coisa na vida que ele realmente entendia, e sabia que entendia melhor do que qualquer outra pessoa no mundo. Agora, deitado de costas no divã, com o conhaque aquecendo-lhe a garganta, ele sentia um desejo de cantar, não música, mas de pronunciar as palavras com os discos, embora isso fosse uma coisa impossível de se fazer na frente de uma outra pessoa. Pôs a sua mão livre no colo de Sharon, tomando a bebida que segurava com a outra mão. Sem qualquer malícia, mas com a sensualidade de uma criança buscando carinho, a sua mão que estava no colo da garota levantou-lhe o vestido de seda, deixando à mostra a coxa branca como leite acima da meia de pura malha de ouro e, como sempre, apesar de todas as mulheres, de todos os anos, de toda a familiaridade, Johnny sentiu o calor fluido pegajoso correr pelo seu corpo à vista disso. O milagre ainda acontecia, e que faria ele quando isso lhe falhasse como a sua voz estava falhando?
Ele estava pronto agora. Pôs o copo de bebida na comprida mesa de coquetel embutida e virou o corpo para ela. Johnny era muito seguro, muito decidido e contudo delicado. Não havia nada malicioso nem de exageradamente lascivo em seus carinhos. Ele beijou-lhe os lábios enquanto suas mãos subiam para os seios de Sharon. A sua mão não caiu em suas coxas quentes, cuja pele ele sentia ser tão macia. O beijo que ela deu nele era quente, mas não apaixonado, e ele preferia que fosse assim naquele momento. Detestava garotas que se inflamavam de repente, procurando o gozo rápido, através de movimentos mecânicos.
Depois ele fez uma coisa que sempre fazia, e que até então nunca deixara de excitá-lo. Delicadamente, e tão leve quanto era possível, introduziu a ponta de seu dedo médio entre as coxas de Sharon. Algumas garotas nem mesmo sentiam esse movimento inicial para a cópula. Outras ficavam atordoadas, sem terem certeza de que era um contato físico porque ao mesmo tempo ele sempre as beijava ardentemente na boca. Outras ainda pareciam sugar-lhe o dedo ou fazê-lo entrar mais com um impulso pélvico. E naturalmente, antes de ele se tomar famoso, algumas garotas esbofetearam-lhe o rosto por causa disso. Era uma técnica especial sua e, geralmente, lhe trazia bons resultados.
A reação de Sharon foi esquisita. Ela aceitou tudo, o contato do dedo, o beijo, depois afastou seus lábios dos dele, afastou o corpo deslizando levemente para trás ao longo do sofá, e pegou o seu copo de bebida. Era uma recusa fria, mas decisiva. Acontecia às vezes. Raramente; mas acontecia. Johnny pegou o seu copo de bebida e acendeu um cigarro.
Sharon começou a falar de maneira meiga, muito suave:
— Não é que eu não goste de você, Johnny, você é muito mais agradável do que eu pensava. E não é porque eu não seja esse tipo de garota. Ë que eu preciso ser excitada para fazer isso com um homem, você entende o que quero dizer?
Johnny Fontane sorriu para ela. Ele ainda gostava dela.
— E eu não a excitei?
Ela mostrou-se um tanto embaraçada.
— Bem, você sabe, quando você já era um grande ator e cantor, eu ainda era uma menina pequena. Em relação a você, eu era a geração seguinte; Honestamente, não é que eu queira fazer-me de “gostosa”. Se você fosse James Dean ou alguém mais ou menos da minha idade, eu tiraria as calças num segundo.