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— Beber não lhe adianta nada — ponderou.

— Foda-se! — respondeu Johnny.

O rosto de Hagen de repente tomou-se serenamente impassível. Então ele disse:

— Muito bem, vou pôr isso na conta do seu descontrole.

Johnny Fontane largou o corpo de bebida e foi postar-se em frente a Hagen.

— Lamento ter dito aquilo — falou ele. — Por Deus, eu lamento. Estou desabafando em cima de você porque quero matar esse canalha do Jack Woltz, mas tenho medo de complicar o meu Padrinho. Assim eu me zanguei com você.

Havia lágrimas nos seus olhos. Ele atirou o copo de uísque vazio de encontro à parede, mas com tão pouca força que o pesado copo nem mesmo lascou e rolou no chão, voltando em sua direção, de modo que ele olhou para baixo com fúria frustrada. Depois deu uma gargalhada.

— Jesus Cristo! — exclamou. Caminhou até o outro lado da sala e sentou-se em frente a Hagen. —. Você sabe, tive tudo ao meu dispor durante muito tempo. Depois me divorciei de Ginny e tudo começou a desandar. Perdi minha voz. Meus discos pararam de vender. Não consegui mais trabalho em nenhum filme. E aí meu Padrinho ficou zangado comigo e não queria falar-me pelo telefone nem me ver quando eu ia a Nova York. Você era sempre o sujeito que me embargava o caminho, e eu punha a culpa em você, embora soubesse que não faria isso sem ordem de Don Corleone. Assim, insultei-o. Mas você foi sempre muito direito. E para mostrar-lhe que as minhas desculpas são válidas, vou tomar o seu conselho. Não beberei mais, enquanto não recuperar a minha voz. Está bem?

As desculpas eram sinceras. Hagen esqueceu a sua raiva. Devia haver algo de aproveitável nesse menino de trinta e cinco anos de idade ou Don Corleone não gostaria tanto dele.

— Esqueça o assunto, Johnny — disse Hagen.

Ele estava embaraçado com a profundidade do sentimento de Johnny e também com a suspeita de que devia ter sido inspirado pelo medo de que ele podia fazer Don Corleone virar-se contra o ator. E naturalmente Don Corleone jamais podia virar-se contra uma pessoa por instigação de alguém, qualquer que fosse o motivo. A sua afeição só podia ser mudada por ele mesmo.

— As coisas não estão assim tão ruins — disse Hagen. — Don Corleone diz que pode anular tudo o que Woltz fizer contra você. Que você quase com certeza ganhará o prêmio. Mas ele sente que isso não resolverá o seu problema. Quer saber se tem cabeça e coragem para se tornar um produtor por sua própria conta, para fazer os seus próprios filmes de cabo a rabo.

— Como diabo vai ele conseguir o prêmio para mim? — perguntou Johnny incredulamente.

Hagen respondeu bruscamente:

— Como é que você acha tão fácil acreditar que Woltz pode consegui-lo ardilosamente e seu Padrinho não? Agora, como é necessário que eu consiga a sua crença na outra parte do nosso negócio, devo confessar-lhe uma coisa. Mas guarde isto para você. O seu Padrinho é um homem muito mais poderoso do que Jack Woltz. E é muito mais poderoso em terrenos muito mais difíceis. Como pode ele dar um jeito no prêmio? Ele controla, ou controla o pessoal que controla todos os sindicatos trabalhistas da indústria, todo o pessoal ou quase todo o pessoal que vota. Naturalmente você tem de ser bom, tem de estar disputando o prêmio por seus próprios méritos. E o seu Padrinho tem mais cabeça do que Jack Woltz. Ele não vai a essas pessoas e põe o revólver na cabeça delas dizendo: “Vote em Johnny Fontane ou você está desempregado.” Não usa a violência onde a violência não funciona ou deixa fortes ressentimentos. Ele fará essas pessoas votarem em você porque elas querem. Elas, porém, não quererão, a não ser que tenham algum interesse. Agora, confie na minha palavra de que ele pode conseguir o prêmio para você. E que se ele não agir, você não o conseguirá.

— Está bem — respondeu Johnny. — Acredito em você. E tenho coragem e cabeça para ser produtor, mas não tenho o dinheiro. Nenhum banco me financiará. Um filme custa milhões.

— Quando você conseguir o prêmio — retrucou Hagen secamente — comece a traçar planos para produzir três filmes por sua própria conta. Contrate o melhor pessoal existente, os melhores técnicos, os melhores artistas, quem quer que você precise. Planeje de três a cinco filmes.

— Você está maluco . respondeu Johnny. — Esses filmes todos poderiam significar vinte milhões de dólares.

— Quando precisar do dinheiro — retrucou Hagen — entre em contato comigo. Darei o nome do banco aqui na Califórnia ao qual você deve pedir financiamento. Não se preocupe, eles estão sempre financiando filmes. Apenas peça a eles dinheiro de maneira normal, com as justificativas habituais, como um negócio comum. Eles aprovarão. Mas primeiro você tem de me ver e me dizer as quantias necessárias e os planos. Está bem?

Johnny manteve-se calado por algum tempo. Depois perguntou tranqüilamente:

— Mais alguma coisa?

Hagen sorriu.

— Você quer dizer, vai ter de fazer algum favor em troca de um empréstimo de vinte milhões de dólares? Certamente vai. — Esperou que Johnny dissesse alguma coisa e depois concluiu: — Nada que você não pudesse fazer, de qualquer modo, se Don Corleone pedisse a você que fizesse.

— O próprio Don Corleone tem de me pedir se for algo muito sério — frisou Johnny. — Você entende o que quero dizer? Não atenderei a pedido seu ou de Sonny.

Hagen ficou surpreso com esse bom senso. Finalmente, Fontane tinha algum miolo. Tinha senso para saber que Don Corleone gostava muito dele e era muito esperto para não pedir a ele que fizesse algo arriscado, enquanto Sonny o faria.

— Deixe-me assegurar-lhe uma coisa — acentuou Hagen. — Seu Padrinho deu a mim e a Sonny instruções rigorosas para não envolvê-lo, de qualquer modo, em algo que possa resultar em publicidade desfavorável para você em virtude de alguma falha nossa. E ele próprio jamais fará isso. Posso garantir que qualquer favor que ele lhe pedir, você lhe oferecerá, antes mesmo que ele solicite. Está bem?

Johnny sorriu.

— Está bem — respondeu.

— Don Corleone também tem confiança em você — acrescentou Hagen. — Acha que você tem cabeça e, assim, pensa que o banco fará dinheiro com o investimento, o que significa que ele ganhará dinheiro com isso. Assim é realmente um negócio, não esqueça isso. Não vá gastar esse dinheiro com mulheres. Você pode ser seu afilhado predileto, mas vinte milhões de dólares é um bocado de grana. Ele vai ter de se arriscar muito para conseguir esse dinheiro para você.

— Diga a ele que não se preocupe — respondeu Johnny. — Se um cara como Jack Woltz pode ser um grande gênio do cinema, qualquer pessoa pode.

— Isso é o que pensa o Padrinho — retrucou Hagen. — Você pode providenciar um carro para me levar de volta ao aeroporto? Já disse tudo o que tinha a dizer. Quando você começar a assinar contratos para tudo, arranje os seus próprios advogados, não quero estar metido nisso. Mas gostaria de ver tudo antes de você assinar, se você concordar com tal coisa. Além disso, você nunca terá qualquer dificuldade trabalhista. Isso reduzirá os custos de seus filmes até certo ponto. Assim, quando os contadores introduzirem alguma quantia por conta disso, não faça caso dela.

— Terei de conseguir a sua aprovação para qualquer outra coisa, roteiros, artistas, coisas assim? — indagou Johnny cauteloso.

Hagen balançou a cabeça.

— Não. Pode acontecer que Don Corleone se oponha a algo mas falará diretamente com você, se isso ocorrer. Mas não posso imaginar o que seja. Os filmes não o afetam em nada, de qualquer forma, assim ele não tem interesse. E ele não acredita em intromissão, isso posso garantir a você por experiência própria.

— Bem — disse Johnny. — Eu mesmo o levarei de carro ao aeroporto. E agradeça ao Padrinho por mim. Eu poderia telefonar para ele a fim agradecer, mas ele nunca atende o telefone. A propósito, por que isso?

Hagen deu de ombros.