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Johnny ocupava-se com o andamento de seu próprio filme. O autor do livro no qual se baseou o filme em que trabalhara como artista tinha terminado outra novela, e viera à Califórnia a convite de Johnny, para tratar diretamente do assunto, sem interferência de agentes ou estúdios. O segundo livro se adaptava perfeitamente ao desejo de Johnny. Ele não teria de cantar. A novela tinha um enredo picante, muitas mulheres, sexo e havia um papel que para Johnny logo pareceu ter sido feito sob medida para Nino. O tipo falava como Nino, agia e até parecia com ele. Era fantástico! Tudo o que Nino teria de fazer era mover-se ante as câmaras cinematográficas com a maior naturalidade.

Johnny trabalhava depressa. Achava que entendia muito mais de produção cinematográfica do que imaginara. Contratou um produtor executivo, um homem que conhecia o assunto, mas que tinha dificuldade em encontrar trabalho, porque estava na lista negra. Johnny não tirou proveito da situação e deu-lhe um bom contrato.

— Espero que você desse jeito me poupe mais grana — falou ao homem com franqueza.

Ficou surpreso, quando o produtor executivo veio dizer-lhe que o representante do sindicato estava exigindo uma “gratificação” de cinqüenta mil dólares. Havia uma série de problemas a respeito de extraordinários e contratos de pessoal, de forma que os cinqüenta mil dólares seriam bem gastos. Johnny perguntou-se se o produtor executivo o estava pressionando e arrematou:

— Mande o cara do sindicato falar comigo.

O cara do sindicato era Billy Goff. Johnny disse a ele:

— Pensei que esse negócio do sindicato era arranjado pelos amigos. Disseram-me para não me preocupar com isso, de modo algum.

Goff perguntou:

— Quem lhe disse isso?

— Você sabe muito bem — respondeu Johnny. — Não revelarei o nome dele, mas quando esse indivíduo me diz uma coisa acredito piamente.

— As coisas estão mudadas — retrucou Goff. — Seu amigo está em situação difícil e a palavra dele não tem mais valor aqui na Califórnia.

Johnny deu de ombros.

— Venha falar comigo daqui a alguns dias. Está bem?

Goff sorriu.

— Perfeitamente, Johnny. Mas telefonar para Nova York não vai lhe ajudar coisa alguma.

Telefonar para Nova York na verdade ajudou. Johnny falou com Hagen em seu escritório. Hagen disse-lhe rudemente para não pagar.

— Seu Padrinho vai ficar danado da vida, se você pagar um níquel a esse salafrário — falou ele a Johnny. — Isso fará Don Corleone perder prestígio e, no momento, ele não pode admitir tal coisa.

— Posso falar com Don Corleone? — perguntou Johnny. — Você fala com ele? Preciso rodar o filme.

— Ninguém pode falar com Don Corleone no momento — disse Hagen. — Ele está muito doente. Vou dizer a Sonny para arranjar a coisa. Po rém, a decisão deve basear-se nisso. Não pague um níquel a esse espertalhão safado. Se houver alguma mudança, avisa-lo-ei.

Aborrecido, Johnny desligou o telefone. Uma complicação com o sindicato poderia aumentar uma fortuna no custo da produção do filme e prejudicar o trabalho de modo geral. Por um momento, pensou em passar os cinqüenta mil dólares para Goff, na surdina. Afinal, Don Corleone dizer-lhe alguma coisa e Hagen dar-lhe ordens eram duas coisas diferentes. Contudo, resolveu esperar alguns dias.

Com a espera, ele poupou cinqüenta mil dólares. Duas noites depois, Goff foi encontrado morto a tiros em sua casa, em Glendale. Não se falou mais em complicação com o sindicato. Johnny ficou um tanto abalado com o assassinato. Era a primeira vez que o comprido braço de Don Corleone dava um golpe mortal tão perto dele.

A medida que as semanas passavam e ele se ocupava cada vez mais com a preparação do roteiro, com a escolha do elenco do filme e com os detalhes da produção Johnny Fontane se esquecia de sua voz, de que não podia cantar. Contudo, quando surgiu a lista de nomes ao prêmio da Academia e viu o seu entre os candidatos, ficou deprimido, porque não o escolheram para cantar uma das melodias indicadas para o Oscar na cerimônia que seria televisada para toda a nação. Todavia, conformou-se e continuou trabalhando. Não tinha esperança de ganhar o prêmio da Academia, agora que seu Padrinho não era mais capaz de exercer pressão, mas ser indicado como candidato já era alguma coisa.

O disco de canções italianas que ele e Nino gravaram estava sendo vendido muito mais do que qualquer outra coisa que ele tinha gravado ultimamente, apesar de reconhecer que o sucesso era mais de Nino do que seu. Resignou-se então à idéia de que jamais seria capaz de cantar novamente como profissional.

Uma vez por semana, jantava com Ginny e as meninas. Não importava quão complicadas estivessem as coisas, ele nunca faltava a esse dever, embora não dormisse com Ginny. Entrementes, sua segunda mulher conseguira o divórcio no México, e, assim, estava solteiro novamente. Era estranho que não estivesse tão “seco” para apanhar aquelas estrelinhas que cairiam facilmente na sua conversa. Ele estava muito esnobe. Ficara magoado, porque qualquer daquelas estrelas jovens que ainda estavam no apogeu jamais lhe dera a mínima bola. Mas era bom trabalhar com afinco. Quase toda noite ele ia para casa sozinho, punha seus velhos discos na vitrola, tomava a sua bebidazinha e cantarolava um pouco. Ele tinha sido bom, muito bom mesmo. E não compreendera como tinha sido bom. Mesmo sem levar em conta a sua voz excepcional, que poderia ter acontecido a qualquer um, ele era bom. Fora um verdadeiro artista e nunca soube quanto gostava disso. Estragara a voz com bebida, fumo e mulheres, justamente quando veio a compreender quanto isso valia.

Às vezes, Nino vinha tomar um trago e escutava os discos em sua companhia, e Johnny dizia-lhe desdenhosamente:

— Você, seu carcamano safado, jamais cantou assim em sua vida.

E Nino lhe respondia com aquele riso curioso e encantador e balançava a cabeça dizendo:

— Não, e jamais cantarei — pronunciando as palavras com uma voz complacente, como se adivinhasse o que Johnny estava pensando.

Finalmente, uma semana antes de rodar o novo filme, chegou a noite da outorga do prêmio da Academia. Johnny convidou Nino para acompanhá-lo, mas Nino recusou. Johnny suplicou:

— Companheiro, nunca lhe pedi um favor, certo? Faça-me um favor esta noite e venha comigo. Você é o único sujeito que vai sentir, realmente, se eu não ganhar.

Por um momento, Nino ficou espantado. Depois respondeu:

— Perfeitamente, meu velho, irei com você. — Fez uma pausa e acrescentou: — Se você não ganhar, esqueça o assunto. Fique tão embriagado o quanto você puder, que tomarei conta de você. Diabo, eu mesmo nem vou beber esta noite. Que tal, só por ser companheiro?

— Homem respondeu Johnny Fontane — é ser mesmo muito companheiro.

Na hora de ir para a cerimônia da Academia, Nino manteve a sua promessa. Compareceu à casa de Johnny completamente sóbrio, e os dois partiram juntos para o local da apresentação. Nino ignorava por que Johnny não convidara nenhuma de suas ex-garotas ou ex-esposas para o jantar daquela noite. Especialmente Ginny. Será que pensava que ela não torceria por ele? Nino desejaria tomar apenas um trago, parecia que ia ter uma noite horrivelmente longa.

Nino Valenti achou toda a cerimônia da concessão do prêmio da Academia muito chata, até que foi anunciado o vencedor do melhor artista masculino. Quando ouviu as palavras “Johnny Fontane”, deu um pulo para cima e começou a aplaudir. Johnny estendeu a mão e Nino apertou-a. Sabia que o seu companheiro precisava do contato humano, de alguém em quem confiasse, e Nino sentia uma enorme tristeza pelo fato de Johnny não ter ninguém melhor do que ele para partilhar esse momento de glória.

O que se seguiu foi um verdadeiro pesadelo. O filme de Jack Woltz arrebatou todos os prêmios importantes e, assim, a festa do estúdio estava cheia de gente de jornal e de todos os futuros malandros do sexo masculino e feminino. Nino manteve a sua promessa de conservar-se sóbrio, e procurou vigiar Johnny. Mas as mulheres da festa insistiam em puxar Johnny Fontane para os quartos a fim de bater um papo e Johnny ficava cada vez mais bêbedo.