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O senhorio, Sr. Roberto, vinha ao local todo dia para inspecionar os cinco conjuntos de moradias que ele possuía. Ele era um padrone, um homem que vendia trabalhadores italianos recém-chegados para as grandes companhias. Um homem educado do Norte da Itália, sentia apenas desprezo por esses sulistas analfabetos da Sicília e de Nápoles que pululavam como vermes pelos seus prédios, que atiravam lixo nas áreas internas, que deixavam as baratas e os ratos roerem as suas paredes sem sequer levantarem a mão para preservarem a propriedade dele. Não era um homem mau, era um bom marido e pai, mas tinha constante preocupação a respeito de seus investimentos, a respeito do dinheiro que ele ganhava, a respeito das despesas inevitáveis decorrentes do fato de ser ele um homem de propriedade, que tinha reduzido os seus nervos a frangalhos, de forma que vivia num constante estado de irritação. Quando Vito Corleone o deteve na rua para pedir-lhe que o ouvisse por um minuto, o Sr. Roberto foi frio, mas não rude, pois qualquer um desses sulistas podia enfiar uma faca no indivíduo que o irritasse, embora esse rapaz parecesse ser um sujeito calmo.

— Signor Roberto — disse Vito Corleone — a amiga de minha mulher, uma viúva pobre sem um homem para protegê-la, contou-me que por algum motivo recebeu ordem para se mudar do seu apartamento no edifício de propriedade do senhor. Ela está desesperada. Não tem dinheiro, não tem amigas, a não ser as que vivem aqui. Eu disse a ela que falaria com o senhor, que o senhor é um homem sensato que agiu assim por algum mal-entendido. Ela livrou- se do animal que causou toda a confusão e, assim, por que não deve ela ficar? De um italiano para outro, peço ao senhor que atenda ao favor.

O Signor Roberto estudava o homem postado diante de si. Viu um tipo de estatura média, mas de constituição forte, um camponês, mas não um bandido, embora ele tão irrisoriamente tivesse ousado chamar-se de italiano. O senhorio deu de ombros.

— Já aluguei o apartamento a outra família por um preço mais alto — retrucou. — Não posso decepcionar essa família em benefício de sua amiga.

Vito Corleone acenou com a cabeça numa compreensão razoável.

— Quanto mais por mês? — perguntou ele.

— Cinco dólares — respondeu o Sr. Roberto.

Isso era mentira. O apartamento ferroviário, com quartos escuros, era alugado por doze dólares por mês à viúva, e o Sr. Roberto não conseguiria arrancar mais do que isso do novo inquilino.

Vito Corleone tirou um maço de notas do bolso e destacou três notas de dez dólares.

— Aqui está o aumento de seis meses adiantado. O senhor não precisa falar com ela sobre isso, ela é uma mulher orgulhosa. Procure-me dentro de seis meses. Mas naturalmente o senhor deixará que ela fique com o cachorro.

— Não me diga — retrucou o Sr. Roberto. — E quem diabo é você para me dar ordens! Tome cuidado com os seus modos ou você será obrigado a voltar a andar no seu burrinho lá nas ruas da Sicília.

Vito levantou as mãos surpreso.

— Estou apenas pedindo isso. Nunca se sabe quando se vai precisar de um amigo, não é verdade? Receba esse dinheiro como sinal de minha boa vontade e tome a sua própria decisão. Eu não me atreveria a brigar por causa disso. — Meteu o dinheiro na mão do Sr. Roberto. — Faça.me esse pequeno favor, receba o dinheiro e pense no assunto. Amanhã de manhã, se o senhor quiser devolver o dinheiro, por quem é, faça-o. Se o senhor quiser a mulher fora de sua casa, como posso impedir o senhor? Afinal de contas, a propriedade é sua. Se o senhor não quer o cachorro lá, eu compreendo. Eu mesmo não gosto de animais. — Bateu de leve no ombro do Sr. Roberto. — Faça-me esse serviço, sim? Não esquecerei isso. Informe-se com seus amigos da redondeza sobre mim, eles lhe dirão que sou um homem que sabe mostrar sua gratidão.

Mas naturalmente o Sr. Roberto já começara a compreender. À tardinha, ele fez suas investigações sobre Vito Corleone. Não esperou até a manhã seguinte. Bateu na porta de Corleone naquela mesma noite, desculpando-se pelo adiantado da hora, e aceitou um copo de vinho oferecido pela Signora Corleone. Assegurou a Vito Corleone que tudo tinha sido um horrível mal-entendido, que naturalmente a Signora Colombo podia continuar no apartamento e naturalmente podia ficar com o cachorro. Quem eram esses miseráveis inquilinos para se queixarem do barulho de um pobre animal, quando pagavam um aluguel tão baixo? No fim, puxou os trinta dólares que Vito Corleone lhe tinha dado e os pôs sobre a mesa dizendo da maneira mais sincera:

— A sua bondade em ajudar essa pobre viúva me envergonhou e desejo mostrar que eu também pratico a caridade cristã. O aluguel dela continuará a ser o que era.

Todos os interessados desempenharam essa comédia com perfeição. Vito serviu mais vinho, pediu à mulher que trouxesse bolos, apertou a mão do Sr. Roberto e elogiou o seu boníssimo coração. O Sr. Roberto suspirou e respondeu que ter travado conhecimento com um homem como Vito Corleone restituía-lhe a fé na natureza humana. Finalmente, separaram-se efusivamente um do outro. O Sr. Roberto, com os nervos em pandarecos por ter escapado por um triz, pegou o bonde para a sua casa no Bronx e foi dormir. Só reapareceu no local três dias depois.

Vito Corleone era agora um “homem de respeito” nas redondezas. Era reputado como sendo um membro da Máfia da Sicília. Um dia, um homem que mantinha jogos de cartas num quarto mobiliado veio a ele e voluntariamente começou a pagar-lhe vinte dólares por semana pela sua “amizade”. Vito tinha apenas de visitar o jogo uma ou duas vezes por semana para que os jogadores compreendessem que estavam sob sua proteção.

Os comerciantes que tinham problemas com rapazes desordeiros pediam-lhe para intervir. Ele assim fazia e era convenientemente recompensado. Logo passou a ter renda, enorme para a época e o lugar, de cem dólares por semana. Desde que Clemenza e Tessio eram seus amigos, seus aliados, Vito tinha de dar a cada um deles parte do dinheiro, mas isso ele fazia sem que lhe pedissem. Finalmente resolveu entrar no negócio de importação de azeite com seu companheiro de infância, Genco Abbandando. Genco cuidaria do negócio, da importação do azeite da Itália, da compra ao preço adequado, da armazenagem no estabelecimento do pai. Clemenza e Tessio seriam os vendedores. Iriam a todas as mercearias italianas de Manhattan, em seguida às do Brooklyn, depois às do Bronx, para persuadir os merceeiros a estocar o azeite Genco Pura. (Com sua modéstia típica, Vito Corleone recusou-se a dar o seu próprio nome à marca do produto.) Vito naturalmente seria o chefe da firma desde que estava fornecendo a maior parte do capital. Também seria chamado em casos especiais em que merceeiros resistissem às conversas de venda de Clemenza e Tessio. Então Vito Corleone usaria os seus próprios poderes de persuasão.

Durante os anos seguintes, Vito Corleone levou a vida plenamente satisfatória de um pequeno comerciante inteiramente dedicado a consolidar sua empresa comercial numa economia dinâmica e em expansão. Ele era um pai e marido dedicado, mas tão ocupado que não podia devotar muito de seu tempo à família. À proporção que o azeite Genco Pura se tornava o óleo italiano importado mais vendido na América, a sua organização expandia-se rapidamente. Como qualquer bom negociante, começou a compreender os benefícios de suplantar os concorrentes vendendo por preço mais baixo, dificultando-lhes a distribuição por persuadir os merceeiros a estocar menos das marcas deles. Como qualquer bom negociante, Vito visava a conseguir um monopólio forçando os concorrentes a abandonar o campo ou fundir-se com a sua própria companhia. Contudo, desde que se iniciara relativamente fraco, economicamente, desde que não acreditava na publicidade, confiando apenas na palavra falada, e desde que, para dizer a verdade, seu azeite não era melhor do que o dos seus competidores, ele não podia usar os golpes decisivos comuns dos negociantes legítimos. Tinha de confiar na força de sua própria personalidade e na sua reputação de “homem de respeito”