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Nessa altura, Maranzano havia enviado emissários pedindo paz. Vito Corleone recusou-se a recebê-los, esquivando-se deles com base num ou noutro pretexto. Os soldados de Maranzano começaram a abandonar o líder por não desejarem morrer por uma causa perdida. Os bookmakers e agiotas passaram a pagar à organização Corleone a sua proteção. A guerra estava quase terminada.

Então, finalmente, na véspera de Ano-Novo, em 1933, Tessio penetrou nas defesas do próprio Maranzano. Os lugares-tenentes de Maranzano estavam ansiosos para entrar em acordo e aceitaram em levar o chefe para o local de sacrifício. Disseram-lhe que tinham combinado uma reunião num restaurante do Brooklyn com Corleone e o acompanharam como guarda-costas. Deixaram-no sentado numa mesa axadrezada, mastigando lentamente um pedaço de pão, e fugiram do restaurante quando Tessio e quatro de seus homens entraram. A execução foi rápida e certeira. Maranzano, com a boca cheia de pão meio mastigado, foi crivado de balas. A guerra terminara.

O império de Maranzano foi incorporado à organização de Corleone. Don Corleone estabeleceu um sistema de tributo, permitindo que todos os titulares permanecessem em seus lugares de bookmakers e controladores sindicais. Em compensação, passou a ter apoio nos sindicatos do setor de roupas feitas, o que nos anos vindouros se tornaria extremamente importante. E agora que havia resolvido seus negócios, Don Corleone viu-se às voltas com dificuldades domésticas.

Santino Corleone, Sonny, estava com 16 anos de idade e uma altura espantosa de 1,80m, ombros largos e um rosto grave e um tanto sensual, mas de modo algum afeminado. Porém, enquanto Fredo era um menino sossegado e Michael, naturalmente um fedelho, Santino estava constantemente metido em complicações. Vivia brigando na rua, era mau aluno na escola e, finalmente, Clemenza, que era o padrinho do rapaz e tinha o dever de falar, veio a Don Corleone uma noite e informou-o de que o filho tomara parte num assalto à mão armada, uma aventura estúpida que podia ter conseqüências bem desagradáveis. Sonny era obviamente o chefe do bando, sendo que os outros dois rapazes que participaram do assalto eram seus subordinados.

Foi uma das pouquíssimas vezes em que Vito Corleone perdeu as estribeiras. Tom Hagen já vivia em sua casa há três anos, e ele perguntou a Clemenza se esse rapaz órfão tinha-se envolvido no assalto. Clemenza balançou a cabeça negativamente. Don Corleone mandou um carro apanhar Santino e levá-lo ao seu escritório na Companhia de Azeite Genco Pura.

Pela primeira vez, Don Corleone enfrentava a derrota. Sozinho com o filho, deixou transbordar sua ira, xingando o grandalhão Sonny em dialeto siciliano, uma língua muito mais satisfatória do que qualquer outra para se expressar ira. Terminou perguntando:

— Que é que lhe deu o direito de cometer essa besteira? Que foi que fez você desejar cometer tal ato? — Sonny estava ali em pé, zangado, recusando-se, a responder. Don Corleone disse com desprezo: — É tão estúpido. Que foi que vocês ganharam com essa noite de trabalho? Cinqüenta dólares cada um? Vinte dólares? Você arriscou sua vida por vinte dólares, hem?

Como se não tivesse ouvido estas últimas palavras, Sonny respondeu desafiadoramente:

— Eu vi você matar Fanucci.

— Ah, ah — retrucou Don Corleone, e voltou a afundar-se na poltrona, esperando.

— Quando Fanucci deixou o edifício — acrescentou Sonny — mamãe disse que eu podia subir para casa. Vi você subir pelo telhado e segui você. Vi tudo o que você fez. Fiquei ali e vi você jogar fora a carteira e a arma.

Don Corleone suspirou.

— Bem, então não posso falar com você sobre como você tem de se comportar. Você não quer acabar a escola, você não quer ser advogado? Os advogados podem roubar mais dinheiro com uma pasta do que mil homens com armas e máscaras.

Sonny arreganhou os dentes para ele e disse manhosamente:

— Quero entrar no negócio da Família. Quando viu que o rosto de Don Corleone continuava impassível, que ele não rira da piada, Sonny acrescentou prontamente: — Quero aprender a vender azeite.

Don Corleone também não respondeu. Finalmente, deu de ombros.

— Todo homem tem um destino — sentenciou. Não acrescentou que o fato de o filho ter testemunhado o assassinato de Fanucci decidira o destino de Sonny. Ele apenas virou-se para o outro lado e falou calmamente: — Venha amanhã às nove horas. Genco mostrará a você o que fazer.

Mas Genco Abbandando, com aquela intuição sagaz que um consigliori deve ter, compreendeu a verdadeira intenção de Don Corleone e passou a usar Sonny principalmente como guarda-costas do pai, uma posição na qual ele podia também aprender as sutilezas de ser um Don. E isso pôs em relevo o instinto professoral do próprio Don Corleone, que começou a dar ao filho mais velho preleções sobre como deveria sucedê-lo.

Além de repetir amiúde a teoria de que um homem tem apenas um destino, Don Corleone constantemente censurava Sonny pelas suas explosões temperamentais. Don Corleone considerava a utilização de ameaças como a mais tola atitude: o desencadeamento de raiva sem premeditação como a atitude habitual mais perigosa. Ninguém jamais ouvira Don Corleone pronunciar uma simples ameaça, ninguém jamais o vira numa raiva incontrolável. Era inconcebível. E assim ele procurava ensinar a Sonny suas próprias disciplinas. Alegava que não havia maior vantagem natural na vida do que ter um inimigo que sobrestimasse nossos defeitos, a não ser ter um amigo que subestimasse nossas virtudes.

O caporegime Clemenza tomou Sonny pela mão e ensinou-lhe a atirar e a manejar o garrote. Sonny não apreciava a corda italiana, ele era muito americanizado. Preferia o simples, direto, impessoal revólver anglo-saxão, o que entristecia Clemenza. Mas Sonny tornou-se um constante e agradável companheiro do pai, dirigindo o carro dele, ajudando-o nos pequenos detalhes. Nos dois anos seguintes, ele se parecia com qualquer filho que tivesse entrado no negócio do pai, nem muito brilhante, nem muito ansioso, contente por ter um trabalho leve.

Entrementes, seu companheiro de infância e irmão semi-adotivo Tom Hagen freqüentava a faculdade. Fredo estava ainda na escola secundária; Michael, o irmão menor, cursava a escola primária, e a irmãzinha Connie era um fedelho de quatro anos de idade. A família há muito se mudara para um edifício de apartamentos no Bronx. Don Corleone estava considerando a possibilidade de comprar uma casa em Long Island, mas queria enquadrar isso em outros planos que estava formulando.

Vito Corleone era um homem de visão. Todas as grandes cidades da América estavam travando uma luta tremenda no submundo. Guerrilhas rebentavam em toda parte, “maus elementos” ambiciosos procuravam arrancar para si um pedaço do império; homens como o próprio Corleone procuravam garantir as suas fronteiras e os seus negócios de extorsão. Don Corleone via que os jornais e as entidades governamentais estavam usando esses assassinatos para conseguir leis cada vez mais rigorosas, para empregar métodos policiais mais severos. Previu que a indignação pública podia até levar à suspensão do processo democrático, o que poderia ser fatal para ele e sua gente. Seu próprio império, internamente, se achava seguro. Ele resolveu estabelecer a paz entre todas as facções em guerra em Nova York e depois no país inteiro.