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A viagem pelo mar durou três semanas, com paragens na Madeira e em Santa Helena, para reabastecimento de carvão. Foi um percurso duro, no auge do Inverno, e Jamie enjoou virtualmente a partir do momento em que subiu para bordo. Não obstante, nunca perdeu a coragem, pois cada dia que passava colocava-o mais próximo da sua arca de tesouros. A medida que o navio se acercava do Equador, o clima modificava -se. Miraculosamente, o Inverno começou a ceder gradualmente o lugar ao Verão e, com a proximidade da costa africana, os dias e as noites tornaram-se mais quentes e húmidos.

O Walmer Castle chegou à Cidade do Cabo ao amanhecer, movendo-se prudentemente ao longo do estreito canal que dividia o vasto e leproso aglomerado populacional de Robben Island do continente, até que fundeou em Table Bay.

Jamie surgiu na coberta antes do nascer do Sol, para observar, mesmerizado, a dissipação lenta da neblina matinal e o espectáculo admirável de Table Mountain, sobranceira à cidade. Chegara ao seu destino.

Assim que o navio acostou ao cais, as cobertas fora invadidas por uma horda de pessoas de aspecto estranho. Havia cor-retores de todos o s hotéis - indivíduos negros, amarelos, castanhos e vermelhos, que se ofereciam freneticamente para transportar a bagagem - e garotos que corriam de um lado para o outro com jornais, doces e fruta para vender. Condutores de cabrioles que eram mestiços; parses ou negros vociferavam a ansiedade por que contratassem os seus serviços. Vendedores impelindo pequenos carros de mão apregoavam os artigos mais variados. A atmosfera estava cheia de moscas enormes. Marinheiros e empregados de bordo abriam caminho por entre a multidão com dificuldade, enquanto os passageiros desenvolviam esforços desesperados para manter a

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bagagem junta e sob as suas vistas. Imperava uma babel de vozes e ruídos. As pessoas falavam umas com as outras num idioma que Jamie nunca ouvira.

- Yulle kom van de Kaap, neh?

- H et julle mine papa zyn wagen gezien?

- Wat bedui'di?

- Huistoe!

Não conseguia entender uma palavra.

A Cidade do Cabo era totalmente diferente de tudo o que Jamie vira até então.

Não havia duas casas iguais. Ao lado de um largo armazém de dois ou três pisos, de tijolos ou alvenaria, viam-se uma pequena cantina de ferro galvanizado, uma ourivesaria, uma mercearia e uma tabacaria.

Sentia-se impressionado com os homens, mulheres e crianças que percorriam as ruas. Viu um cafre, de calças de xadrez e casaco de um tecido que parecia serapilheira, que se movia atrás de dois chineses, de mãos dadas, trajados de uma forma não menos exótica. Agricultores bóeres conduzindo carroças carregadas de batatas, milho e legumes vários. Homens de casacos de veludo e chapéus de feltro, caminhando, altivos, ao lado de mulheres ataviadas de forma mais modesta. Lavadeiras parses com volumosas trouxas de roupa à cabeça abriam caminho por entre militares de uniforme vermelho e capacete. Na realidade, era um espectáculo fascinante.

A primeira coisa que ele fez foi procurar uma pensão pouco dispendiosa que lhe fora recomendada por um marinheiro do navio em que viajara. A proprietária, uma mulher de meia-idade, busto avultado e faces rechonchudas, examinou-o dos pés à cabeça e inquiriu:

- Zoek yulle goud?

- Desculpe, mas não compreendo - balbuciou ele, corando.

- Ah, é inglês? Veio à procura de ouro? Diamantes?

- Sim, diamantes.

- Vai gostar disto - afirmou ela, convidando-o a entrar. - Tenho todas as comodidades para jovens como você - e fez uma pausa, enquanto Jamie perguntava a si próprio se se trataria de uma comerciante de prazeres de alcova. - Sou Mistress Venster, mas os amigos tratam-me por Dee-Dee - e sorriu, revelando um dente de ouro. -

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Pressinto que nos vamos entender muito bem. Peça tudo o que quiser.

- É muito amável. Onde posso obter um mapa da cidade?

Munido do mapa, Jamie iniciou as explorações. Num dos lados da cidade, encontravam-se os subúrbios de Ronde-bosch, Claremont e Wynberg, que se estendiam ao longo de quilómetros de plantações e vinhedos. No outro, situavamse os arrabaldes marítimos de Sea Point e Green Point. Ele percorreu a zona residencial dos ricos, por Strand Street e Bree Street, admirando as imponentes construções de dois pisos que exsudavam opulência por todos os poros. A excursão foi terminada prematuramente pelos densos enxames de moscas que povoavam as ruas e lhe pareceram reproduzidos no momento em que entrou no quarto da pensão, onde cobriam as paredes, a mesa e a cama.

Abismado com o que se lhe deparava, resolveu procurar a dona da pensão.

- Mistress Venster, pode fazer alguma coisa acerca das moscas no meu quarto?

São positivamente…

No entanto, ela interrompeu-o com uma risada e uma palmada cordial no ombro.

- Myn magtib. Há-de habituar-se, verá.

O saneamento básico da Cidade do Cabo era primitivo e inadequado e, quando o Sol se punha, um vapor odorífero envolvia a atmosfera como um cobertor nocivo, insuportável. Não obstante, Jamie sabia que o suportaria. Necessitava de mais dinheiro antes de iniciar a etapa seguinte, pois tinham-no advertido de que não sobreviveria nos campos de diamantes sem o mínimo de fundos, em virtude de os preços e a exploração praticados excederem tudo o que se podia conceber.

No seu segundo dia na Cidade do Cabo, encontrou trabalho sob a forma de condução de uma parelha de cavalos para uma firma de transportes. No terceiro, começou a lavar loiça num restaurante, após o jantar. Alimentava -se dos restos que conseguia pôr de parte e levava para a pensão, embora tivessem um sabor estranho que o levava a sentir saudades dos petiscos da mãe. De qualquer modo, não se lamentava, mesmo a si próprio, enquanto sacrificava a alimentação e o conforto para

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aumentar as suas economias. Tomara uma decisão inabalável, da qual nada o desviaria. Entretanto, sentia-se profundamente só. Não conhecia ninguém naquela cidade estranha e custava-lhe suportar a ausência da família e dos amigos.

Conquanto gostasse da solidão, a sensação de isolamento constituía uma amargura constante.

Por fim, chegou o dia mágico. A sua bolsa continha a magnífica quantia de duzentas libras. Estava, pois, preparado para o empreendimento supremo. Partiria da Cidade do Cabo na manhã seguinte, rumo aos campos de diamantes.

As reservas de lugares para as carruagens de passageiros com destino aos campos de diamantes de Klipdrift eram asseguradas pela Inland Transport Company, num pequeno barracão perto das docas. Quando Jamie chegou, às sete da manhã, havia tanta gente em volta que nem sequer conseguiu aproximarse.

Calculou estarem reunidas várias centenas de pesquisadores de fortunas, empenhados em obter lugar num dos próximos transportes. Provinham de pontos distantes como a Rússia, a América, a Austrália, a Alemanha e a Inglaterra e vociferavam numa dezena de idiomas diferentes, implorando aos vendedores de passagens que encontrassem espaço para cies. Jamie avistou um corpulento irlandês que acabava de transpor a saída e abordou-o.

- Desculpe, mas que se passa lá dentro?

- Nada - grunhiu o outro, em voz rouca. - As malditas carruagens têm a lotação esgotada para as próximas seis semanas - e apercebendo-se da expressão de desalento do interlocutor, acrescentou: - O pior não é isso, amigo. Os bandidos exigem cinquenta libras por cabeça.

Era incrível!

- Deve haver outra maneira de chegar aos campos de diamantes.

- Há duas: o Expresso holandês ou a pé.

- O que é o Expresso holandês?

- Um transporte de gado, que se desloca a três quilómetros horá rios. Quando se chega lá, já não há diamantes.

Jamie McGregor não estava disposto a aguardar até que as pedras preciosas desaparecessem, pelo que passou o resto da manhã à procura de um transporte alternativo. E encontrou-o, pouco antes do meio-dia. Passava diante de uma cocheira de