Estavam perto da ponte que levava de uma torre à outra. Através de uma grande janela o sol brilhante de Beta da Ursa Menor lançava blocos de luz onde dançavam pontinhos de poeira. Uma sombra passou por um momento.
— Abandonado por um elevador — murmurou Zaphod, que pelo menos estava se sentindo vivaz.
Os dois olharam em ambas as direções.
— Sabe de uma coisa? — disse Zaphod a Marvin.
— Mais do que você pode imaginar.
— Tenho certeza absoluta de que este prédio não devia estar balançando —
disse Zaphod.
Foi apenas um leve tremor na sola do pé, e depois outro. Nos raios de sol as partículas de poeira dançavam mais vigorosamente. Passou uma outra sombra.
Zaphod olhou para o chão.
— Das duas uma — disse, não muito confiante —: ou eles têm algum sistema vibratório para exercitar os músculos enquanto trabalham, ou... Foi andando em direção à janela e de repente tropeçou porque naquele momento seus Óculos Escuros Supercromáticos Perigo-Sensitivos Joo Janta 200
tinham ficado completamente pretos. Uma sombra imensa passou pela janela com um zumbido agudo.
Zaphod arrancou os óculos, e assim que o fez o edifício sacudiu com um ruído de trovão. Ele saltou para perto da janela.
— Ou então — disse — este prédio está sendo bombardeado!
Outro tremor ressoou pelo edifício.
— Quem na Galáxia ia querer bombardear uma -editora? — perguntou Zaphod, mas não ouviu a resposta de Marvin porque naquele momento o prédio sacudiu com outro bombardeio. Tentou ir cambaleando de volta ao elevador — uma manobra sem sentido, ele sabia, mas a única em que conseguiu pensar. De repente, no final de um corredor em ângulo reto, avistou uma figura, um homem. O homem o viu.
— Beeblebrox, aqui! — gritou o homem.
Zaphod o encarou, desconfiado, enquanto uma nova bomba atingia o edifício.
— Não — gritou Zaphod. — Beeblebrox aqui! Quem é você?
— Um amigo! — respondeu o homem. Ele veio correndo em direção a Zaphod.
— Ah, é? — disse Zaphod. — Amigo de alguém em particular, ou simplesmente bem disposto para com todas as pessoas?
O homem corria pelo corredor, com o chão enrugando-se a seus pés como um cobertor. Era baixo, atarracado, maltratado pelo tempo e suas roupas pareciam ter dado duas voltas pela Galáxia com ele dentro.
— Você sabia — gritou Zaphod em seu ouvido quando ele chegou — que seu prédio está sendo bombardeado?
O homem atestou seu conhecimento do fato.
De repente não estava mais claro. Olhando pela janela para descobrir por que, Zaphod ficou boquiaberto ao ver uma imensa nave espacial cinza-chumbo com uma consistência de lesma arrastando-se pelo ar em torno do edifício. Outras duas a seguiam.
— O governo que você desertou está em seu encalço, Zaphod — sussurrou o homem —, mandaram um esquadrão de Lutadores Astrossapos.
— Lutadores Astrossapos! — murmurou Zaphod. — Zarquon!
— Sentiu o drama?
— O que são Lutadores Astrossapos? — Zaphod tinha certeza de ter ouvido alguém falar sobre eles quando era presidente, mas nunca prestava muita atenção a assuntos oficiais.
O homem o estava puxando para uma porta. Ele o acompanhou. Com um gemido, um objeto em forma de aranha cortou chamuscando o ar e desapareceu no fim do corredor.
— O que foi isso? — sussurrou Zaphod.
— Um robô classe A da Patrulha Astrossapa à sua procura — disse o homem.
— Ah, é?
— Abaixe-se!
Da direção oposta veio um objeto maior em forma de aranha. Passou por eles zunindo.
— E isso foi...?
— Um robô classe B da Patrulha Astrossapa à sua procura.
— E aquilo? — disse Zaphod quando um terceiro vinha chamuscando pelo ar.
— Um robô classe C da Patrulha Astrossapa à sua procura.
— Ei — disse Zaphod consigo mesmo com um risinho de escárnio —, uns robôs bem estúpidos, ehn?
Do outro lado da ponte veio um estrondo retumbante. Uma gigantesca forma negra movia-se sobre ela, vinda do outro prédio, do tamanho e da forma de um tanque.
— Fóton Sagrado, o que é aquilo? — disse Zaphod, resfolegante.
— Um tanque — disse o homem —, um robô classe D da Patrulha Astrossapa que veio te pegar.
— Não é melhor irmos embora?
— Acho que sim.
— Marvin! — gritou Zaphod.
— O que você quer?
Marvin ergueu-se de uma pilha de entulho de alvenaria mais adiante no corredor e olhou para eles.
— Você está vendo aquele robô vindo em nossa direção?
Marvin olhou para a gigantesca forma negra que se dirigia em sua direção atravessando a ponte. Olhou para seu franzino corpo metálico. Olhou de novo para o tanque.
— Imagino que você quer que eu o detenha — disse.
— Isso.
— Enquanto vocês salvam suas peles.
— Isso — disse Zaphod —, faça isso!
— Apenas pelo tempo em que eu souber onde estou — disse Marvin. O homem deu um puxão no, braço de Zaphod, e Zaphod o seguiu pelo corredor.
Ocorreu-lhe uma questão a esse respeito.
— Onde estamos indo? — perguntou.
— Ao escritório de Zarniwoop.
— Isso é hora de manter um compromisso?
— Venha!
CAPITULO 7
Marvin ficou de pé no fim do corredor da ponte. Na verdade ele não era exatamente um robô pequeno. Seu corpo de prata reluzia nos raios de sol empoeirados e agitava-se com o contínuo bombardeio que o prédio continuava sofrendo.
Ele parecia, no entanto, miseravelmente pequeno diante do gigantesco tanque negro que parou na sua frente. O tanque o examinou detalhadamente com uma sonda. Retraiu a sonda.
Marvin ficou ali parado.
— Fora do meu caminho, robozinho — rugiu o tanque.
— Lamento — disse Marvin —, mas fui deixado aqui para detê-lo. A sonda estendeu-se de novo para uma rápida conferida. Retraiu-se outra vez.
— Você? Me deter? — urrou o tanque. — Qual é?
— Não, é verdade, realmente — disse Marvin simplesmente.
— Com o que você está armado? — urrou o tanque, incrédulo.
— Adivinha — disse Marvin.
Os motores do tanque retumbaram, as engrenagens rangeram. As peças eletrônicas do tamanho de moléculas no fundo de seu microcérebro vibravam para a frente e para trás de consternação.
— Adivinha? — disse o tanque.
Zaphod e o homem ainda sem nome viraram por um corredor, cambalearam por outro, correram por um terceiro. O prédio continuava a sacudir e balançar e isso Zaphod não entendia. Se eles queriam explodir o prédio por que estavam demorando tanto?
Com dificuldade chegaram a uma das várias portas anônimas e sem indicações e pararam arfando diante dela. Num solavanco repentino ela se abriu e eles caíram para dentro.
Toda essa estória, pensou Zaphod, toda essa encrenca, todo esse nãoestar-deitado-numa-praia-divertindo-se-pra-caramba, tudo isso para quê? Uma única cadeira, uma única mesa e um único cinzeiro sujo num escritório sem decoração. A mesa, a não ser por um pouco de poeira tremulante e um único clipe de papel de uma nova forma revolucionária, estava vazia.
— Onde — disse Zaphod — está Zarniwoop? — sentindo que a compreensão já
tênue que ele tinha de tudo aquilo começava a se desfazer.
— Está num cruzeiro intergaláctico — disse o homem. Zaphod procurou fazer uma avaliação do homem. Do
tipo austero, pensou, não um saco de risadas. Dedica provavelmente boa parte do seu tempo a correr para cima e para baixo por corredores sinuosos, arrombar portas e fazer comentários críticos em escritórios vazios.