— O que que isso faz com o cara? — perguntou ofegante.
— O Universo — disse Gargravarr com simplicidade —, todo o Universo infinito. Os sóis infinitos, as infinitas distâncias entre eles, e você um pontinho invisível sobre um pontinho invisível, infinitamente pequeno.
— Ei, eu sou Zaphod Beeblebrox, cara, sabia? — sussurrou Zaphod, tentando agitar os últimos restos do seu ego.
Gargravarr não retrucou, mas apenas retomou seu zunido pesaroso até que chegaram ao deslustrado domo de aço no meio da planície. Ao chegarem, a porta abriu de um lado, revelando uma pequena câmara escura no interior.
— Entre — disse Gargravarr. Zaphod sentiu medo.
— Ei, o quê, já? — disse.
— Já.
Zaphod observou o interior nervosamente. A câmara era muito pequena. Era de aço e quase não havia espaço para mais de um homem dentro dela.
— Ahn... não... não parece muito com um Vórtice para mim — disse Zaphod.
— E não é mesmo — disse Gargravarr. — É apenas o elevador. Entre. Com uma trepidação infinita, Zaphod deu um passo para dentro. Sabia que Gargravarr estava no elevador com ele, embora o homem sem corpo não estivesse falando naquele momento.
O elevador iniciou a descida.
— Preciso achar o estado de espírito certo para isso — murmurou Zaphod.
— Não há estado de espírito certo — disse Gargravarr duramente.
— Você sabe mesmo como fazer um cara se sentir inadequado.
— Eu não. O Vórtice sabe.
No fundo do poço, o elevador se abriu e Zaphod foi cair numa câmara de aço pequena e funcional.
Do outro lado havia uma única cabine vertical de aço, do tamanho exato para caber um homem em pé.
Era simples assim.
Estava conectada a uma pequena pilha de componentes e instrumentos através de um único fio grosso.
— É isso aí? — disse Zaphod, surpreso.
— É isso.
Não parecia tão ruim, pensou Zaphod.
— E eu entro aí dentro, é isso? — disse Zaphod.
— Entra — disse Gargravarr —, e creio que deve fazê-lo já.
— OK,OK —disse Zaphod. Abriu a porta da cabine e entrou. Dentro da cabine, ficou esperando.
Passados cinco minutos ouviu um clique, e o Universo estava na cabine com ele.
CAPÍTULO 11
O Vórtice de Perspectiva Total desenvolve sua imagem do Universo como um todo a partir do princípio da análise extrapolada da matéria. Explicando — uma vez que cada pedaço de matéria no Universo está de alguma maneira afetado por todos os outros pedaços de matéria do Universo, é
teoricamente possível extrapolar o todo da criação — cada sol, cada planeta, suas órbitas, sua composição e sua história econômica e social a partir de, digamos, um pedaço de pão-de-ló.
O homem que inventou o Vórtice de Perspectiva Total fez isso basicamente para irritar sua mulher.
Trin Tragula — esse era o nome dele — era um sonhador, um pensador, um filósofo especulativo ou, como sua mulher o definiria, um idiota. E ela o apoquentava incessantemente por causa do tempo completamente fora de propósito que ele dedicava a observar o espaço, ou a meditar sobre o mecanismo dos alfinetes de segurança, ou a fazer análises espectrográficas de pedaços de pão-de-ló.
— Tenha um pouco de senso de proporção! — dizia ela, às vezes trinta e oito vezes em um só dia.
E então ele construiu o Vórtice de Perspectiva Total — só para mostrar para ela.
E numa ponta ele ligou a totalidade da realidade, extrapolada de um pedaço de pão-de-ló, e na outra ponta ligou sua esposa: de modo que quando pôs a máquina para funcionar ela viu num instante toda a infinidade da criação e viu-se a si mesma em relação a isso.
Para horror de Trin Tragula o choque aniquilou completamente seu cérebro; mas
para
sua
satisfação
ele
se
deu
conta
de
que
tinha
provado
conclusivamente que se a vida há de existir num Universo deste tamanho, uma coisa que ela não pode ter é senso de proporção.
A porta do Vórtice abriu-se.
Gargravarr observava de sua mente sem corpo. Tinha gostado de Zaphod Beeblebrox de um modo bastante estranho. Era claramente um homem de muitas qualidades, mesmo sendo más em sua maioria.
Esperava que ele tombasse para fora, como todos.
Em vez disso, ele saiu andando.
— Oi! — disse ele.
— Beeblebrox... — arfou a mente de Gargravarr, maravilhada.
— Será que eu posso beber alguma coisa, por favor?
— disse Zaphod.
— Você... você... esteve no Vórtice? — gaguejou Gargravarr.
— Você me viu, cara.
— E estava funcionando?
— Claro que estava.
— E você viu toda a infinidade da criação?
— Claro. Realmente, um lugar muito arrumado, sabe? A mente de Gargravarr girava atordoada. Se seu corpo estivesse com ela, teria caído sentado de boca aberta.
— E você se viu — disse Gargravarr — em relação a tudo?
— Ah, vi, vi.
— Mas... o que você sentiu?
— Zaphod deu de ombros, presunçosamente.
— Só vi o que sempre soube o tempo todo. Sou realmente um grande sujeito. Não disse, baby, eu sou Zaphod Beeblebrox!
Seu olhar passou pela maquinaria que fazia funcionar o Vórtice e parou subitamente, sobressaltado. Respirou pesadamente.
— Ei — disse —, aquilo é mesmo um pedaço de pão-de-ló?
Arrancou o pedaço de bolo dos sensores a que estava ligado.
— Se eu te dissesse o quanto eu estava precisando disso — falou vorazmente —, eu não teria tempo de comer.
Comeu.
CAPÍTULO 12
Pouco depois ele estava correndo pela planície em direção à cidade em ruínas.
O ar úmido chiava em seus pulmões e ele frequentemente tropeçava de cansaço. A noite também estava começando a cair, e o chão áspero era traiçoeiro.
A exaltação de sua experiência recente ainda estava com ele, no entanto. Todo o Universo. Tinha visto todo o Universo estender-se ao infinito à sua volta — tudo. E com isso viera o conhecimento claro e extraordinário de que ele era a coisa mais importante de todas. Ter um ego convencido é uma coisa. Ser realmente informado por uma máquina é outra.
Não tinha tempo para refletir sobre o assunto.
Gargravarr lhe havia dito que teria que alertar seus superiores sobre o que acontecera, mas que estava disposto a deixar um intervalo decente antes de fazê-lo. Tempo bastante para que Zaphod pudesse encontrar um lugar para se esconder.
O que ia fazer ele não sabia, mas sentindo-se a pessoa mais importante do Universo, tinha confiança em crer que alguma coisa ia pintar. Nada além disso naquele planeta empestado poderia lhe dar muita razão para otimismo.
Continuou correndo e logo atingiu a periferia da cidade abandonada. Andou por ruas tortuosas e destruídas, cobertas de ervas daninhas e sapatos em estado de putrefação. Os prédios por que ele passou estavam tão esfacelados e decrépitos que achou que não seria seguro entrar. Onde iria se esconder? Apressou-se.
Depois de um tempo, os restos de uma ampla avenida surgiram, saindo da rua por onde ele vinha andando, e no fim dela havia um prédio baixo e vasto rodeado de vários outros menores, sendo o conjunto circundado por uma paliçada perimetral. O prédio principal parecia razoavelmente sólido, e Zaphod resolveu ir ver se ele poderia lhe servir... bem se poderia lhe servir de alguma coisa.