— Muito bem — disse ele —, gostaria de pedir alguma ordem para esta reunião, se for possível. Todo mundo de acordo? — sorriu cordialmente. — Num minuto. Quando todos estiverem prontos.
A conversa foi diminuindo gradativamente até a clareira ficar em silêncio, exceto pelo gaiteiro que parecia estar num mundo particular selvagem e desabitado. Alguns dos que estavam próximos a ele lhe atiraram algumas folhas. Se havia algum motivo para isso, escapou à compreensão de Ford Prefect.
Um pequeno grupo de pessoas tinha se reunido em torno do Capitão e um deles estava claramente se preparando para falar. Fez isso ficando em pé, limpando a garganta e então deitando o olhar na distância, como querendo dizer à multidão que estaria com ela num minuto.
A multidão naturalmente estava atenta e voltou os olhos para ele. Seguiu-se um momento de silêncio, que Ford julgou ser o exato momento dramático para fazer sua entrada. O homem virou-se para falar. Ford pulou da árvore.
— Oi, pessoal — disse.
A multidão girou para o seu lado.
— Ah, meu caro rapaz — disse o Capitão. — Tem fósforos com você? Ou isqueiro? Algo assim?
— Não — disse Ford, soando como se tivesse sido um pouco esvaziado. Não era o que tinha preparado. Decidiu que seria melhor ser mais efusivo no assunto.
— Não, não tenho — prosseguiu —, não tenho fósforos. Em vez disso trago notícias...
— Que pena — disse o Capitão. — Estamos todos sem, sabe. Há semanas que não tomo um banho quente.
Ford recusou-se a ser dirigido.
— Trago notícias — disse — de uma descoberta que poderia interessá-los.
— Está na pauta? — perguntou asperamente o homem que Ford tinha interrompido.
Ford abriu um largo sorriso de cantor de country-rock.
— Não, pêra aí — disse.
— Muito bem, lamento — disse o homem com arrogância —, mas enquanto consultor de gerência de muitos anos de experiência, devo insistir na importância de se observar a estrutura do comitê.
Ford olhou para a multidão.
— Ele está louco, sabem — disse. — Este é um planeta pré-histórico.
— Dirija-se à mesa — ralhou o consultor de gerência.
— Não tem mesa nenhuma — explicou Ford —, só uma pedra.
O consultor de gerência decidiu que o que a situação agora requeria era impaciência.
— Ora, chame de mesa — disse impacientemente.
— Por que não chamar de pedra? — perguntou Ford.
— Você obviamente não tem concepção — disse o consultor de gerência, sem abandonar a impaciência em favor da velha e boa soberba — dos modernos métodos de negócios.
— E você não tem concepção do lugar em que está — disse Ford. Uma garota de voz estridente levantou-se de um salto e usou-a.
— Calem-se, vocês dois — disse ela —, quero enviar uma moção ao plenário.
— Você quer enviar uma moção à clareira — disse um cabeleireiro, dando uma risadinha.
— Ordem, ordem! — gritou o consultor de gerência.
— Muito bem — disse Ford —, vamos ver como estão se saindo. — Agachou-se no chão para ver quanto tempo agüentava manter a calma.
O Capitão fez uma espécie de ruído conciliatório.
— Gostaria de pedir ordem — disse amavelmente. — A cinco centésima septuagésima terceira reunião do comitê de colonização de Flintevudlevix... Dez segundos, pensou Ford, e ergueu-se de um pulo.
— Isso é frívolo — exclamou. — Quinhentas e setenta e três reuniões de comitê e vocês ainda não descobriram o fogo!
— Se você se desse o trabalho — disse a garota da voz estridente — de consultar a folha de pauta da reunião...
— A pedra de pauta — gorjeou o cabeleireiro alegremente.
— Obrigado, eu coloquei essa questão — murmurou Ford.
— ... você... vai... ver... — continuou a garota com firmeza — que teremos
um
relatório
do
Subcomitê
de
Desenvolvimento
do
Fogo
dos
cabeleireiros esta tarde.
— Oh... ah — disse o cabeleireiros com um olhar encabulado, que é
reconhecido em toda a Galáxia como significando: "Ahn, será que dava pra ser pra terça-feira?".
— Muito bem — disse Ford, cercando-o. — O que você fez? O que você vai fazer? Quais são suas idéias a respeito do desenvolvimento do fogo?
Bom, não sei — disse o cabeleireiro —, só me deram uns pauzinhos...
— E então? O que você fez com eles?
Nervoso, o cabeleireiro procurou nos bolsos do seu macacão e entregou a Ford o fruto de seu trabalho. Ford os levantou para que todos vissem.
— Pinças para cachear cabelos — disse. A multidão aplaudiu.
— Não importa — disse Ford. — Roma não se fez num dia.
A multidão não tinha a mais remota idéia do que ele estava dizendo, mas mesmo assim adoraram. E aplaudiram.
— Bem, você está sendo totalmente ingênuo, obviamente — disse a garota. —
Quando você tiver trabalhado com marketing tanto quanto eu vai saber que antes que um novo produto possa ser desenvolvido ele tem que ser devidamente pesquisado. Precisamos descobrir o que as pessoas esperam do fogo, como se relacionam com ele, que tipo de imagem ele tem para elas. A multidão estava tensa. Esperavam algo de sensacional de Ford.
— Enfia no nariz — disse ele.
— O que é precisamente o tipo de coisa que precisamos saber — insistiu a garota. — As pessoas querem fogo que possa ser introduzido nasalmente?
— Vocês querem? — perguntou Ford à massa.
— Queremos! — gritaram alguns.
— Não! — gritaram outros alegremente. Não sabiam, só achavam ótimo.
— E a roda? — disse o Capitão. — Como vai essa roda? Parece um projeto terrivelmente interessante.
— Ah — disse a garota de marketing —, estamos encontrando alguma dificuldade aí.
— Dificuldade? — exclamou Ford. — Dificuldade? Como assim, dificuldade? É
a máquina mais simples de todo o Universo!
A garota de marketing olhou para ele com mau humor.
— Muito bem, Sabe-Tudo — disse. — Já que você é tão esperto, então diga de que cor ela deve ser.
A massa delirou. Um ponto para o time da casa, pensaram. Ford sacudiu os ombros e sentou-se de novo,
— Zarquon Todo-Poderoso — disse —, nenhum de vocês fez nada?
Como que em resposta a sua pergunta houve um repentino clamor na entrada da clareira. A multidão não acreditava na quantidade de diversão que estava tendo aquela tarde: uma tropa de cerca de uma dúzia de homens vestindo os restos de seus uniformes do terceiro regimento de Golgafrincham entrou marchando. Estavam bronzeados, saudáveis e totalmente exaustos e enlameados. Pararam a um "alto" e perfilaram-se atentos. Um deles desfaleceu e não se moveu mais.
— Capitão! — gritou Número Dois, que era o líder. — Permissão para informe, senhor!
— Tá, tudo bem, Número Dois, sejam bem-vindos e tudo o mais. Acharam alguma fonte de água quente? — disse o Capitão, desesperançado.
— Não, senhor!
— Foi o que pensei.