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— Ah!

— Pois é, — disse Pleydell-Smith, apalpando os bolsos em busca de fósforos. No começo da guerra, esse chinês, que deve ser um diabo inteligente, achou que poderia obter bons resultados com o antigo depósito de Crab Key. O preço era de cerca de cinqüenta dólares por tonelada, deste lado do Atlântico, e ele nos comprou a ilha por mais ou menos dez mil libras esterlinas, se estou bem lembrado; trouxe operários e pôs-se a trabalhar. A exploração tem prosseguido desde aquela época. Ele deve ter feito fortuna. Embarca diretamente para a Europa, para Antuérpia. Mandam-lhe um cargueiro uma vez por mês. Ele instalou os mais modernos moinhos e separadores. Explora os seus operários, segundo dizem. Não pode fazer de outra forma, se quiser ter lucro satisfatório. Mormente agora. Ouvi dizer, no ano passado, que ele estava recebendo apenas de trinta e oito a quarenta dólares por tonelada. Só Deus sabe o quanto ele está pagando aos operários, para ter lucros com tão baixo preço. Nunca pude descobri-lo. Ele administra essa propriedade como se fosse uma praça de guerra — uma espécie de campo de trabalhos forçados. Ninguém sai de lá. Correram boatos estranhos, mas nunca vieram dar queixa. A ilha é dele, afinal, e ele pode fazer nela o que bem entender.

Bond começou a procurar pistas.

— Essa propriedade tem realmente muito valor? Quanto pensa o senhor que possa valer?

— O corvo-marinho — disse Pleydell-Smith, — é a ave mais valiosa do mundo. Cada casal produz cerca de dois dólares de guano por ano, sem despesa alguma para o proprietário. Cada fêmea põe em média três ovos e cria dois filhotes. Pode-se calcular em quinze dólares o valor de cada casal, e em cem mil o número das aves de Crab Key, o que é uma estimativa razoável, baseada em dados antigos. Seus pássaros representariam nessas condições um milhão e meio de dólares. É, portanto, uma propriedade bastante valiosa. Acrescentemos o valor das instalações, ou seja, digamos, mais um milhão de dólares, e o senhor terá uma boa fortunazinha nesse lugar horroroso. Isso me faz lembrar... — Pleydell-Smith tocou a campainha — que diabo foi feito daquelas pastas? O senhor encontrará nelas todas as informações necessárias.

Abriu-se a porta atrás de Bond.

Pleydell-Smith perguntou, irritado:

— Francamente, senhorita Taro! Que fim levaram as pastas?

— Sinto muito — respondeu a voz macia — mas não conseguimos encontrá-las em parte alguma.

— O que significa "não conseguimos encontrá-las"? Quem as teve em mãos por último?

— O comandante Strangways.

— Ora, mas eu me lembro muito bem quando ele as devolveu, nesta sala. Que aconteceu, desde então?

— Não saberia dizê-lo, sr. Secretário. — A voz não traía a menor emoção. — As capas estão no lugar, mas não há nada dentro.

Bond voltou-se para trás. Lançou um rápido olhar para a moça e tornou a acomodar-se na poltrona. Sorriu amargamente. Sabia onde tinham ido parar as pastas. Sabia também porque a velha pasta relativa à sua atuação passada tinha estado na escrivaninha da secretária de Pleydell-Smith. Compreendia como a significação verdadeira de "James Bond, Importador e Exportador" parecia ter transpirado de King's House, o único lugar onde era conhecida.

Assim como o Doutor No, assim como Annabel Chung, a secretariazinha de óculos de aro de chifre, de aparência séria e eficiente, era chinesa.

VI - O DEDO NO GATILHO

O Secretário para a Colônia convidou Bond para almoçar no Clube da Rainha. Sentaram-se num canto da elegante sala de jantar revestida de painéis de mogno, com quatro grandes ventiladores no teto, e conversaram sobre Jamaica. Quando serviram o café, Pleydell-Smith estava fazendo uma exploração por galerias subterrâneas, muito abaixo da superfície da ilha, próspera e pacífica, que o mundo inteiro conhece.

— O caso é este. — Ele recomeçou suas manobras com o cachimbo. — O jamaicano é um indivíduo preguiçoso e bonachão, que tem as qualidades e os defeitos de uma criança. Vive numa ilha riquíssima, mas não tira riqueza dela. Não sabe fazê-lo, e é demasiado preguiçoso. Os ingleses vêm e vão-se, levando quireras fáceis de se apanharem, mas há dois séculos que nenhum inglês enriquece verdadeiramente aqui. Não ficam o tempo suficiente. Tiram um bom naco e vão-se embora. São os judeus portugueses os que tiram o maior proveito. Eles vieram para cá com os ingleses e ficaram. Mas são esnobes e gastam demais com a construção de belas vivendas e com bailes e festas. São os seus nomes que enchem a coluna social do "Gleaner", depois que os turistas se foram. Negociam com rum e fumo, e representam grandes firmas inglesas: automóveis, seguros etc. Depois, vêm os sírios, muito ricos também, mas que não são tão bons negociantes. Têm em suas mãos a maioria das lojas e bazares, e alguns dos melhores hotéis. Seus negócios nem sempre são muito seguros. Às vezes, acumulam estoques em excesso e têm de recorrer a um incêndio para se porem de novo em dia. Em seguida, temos os índios, com seu comércio de miudezas vistosas, tapetes, almofadas, mantas etc. Não são muitos. Finalmente, vêm os chineses, que constituem um conjunto sólido, compacto, discreto, a sociedade fechada mais poderosa de toda Jamaica. São donos das padarias e lavanderias, e das melhores mercearias. Mantêm-se isolados e conservam sua raça pura. — Pleydell-Smith riu-se.

— Não que fujam das moças de cor quando as desejam. 0 senhor pode ver o resultado por toda Kingston: os "chigros", mestiços das raças negra e chinesa. Os "chigros" constituem uma minoria racial forte e esquecida. Desprezam os negros e são desprezados pelos chineses. Qualquer dia, vão dar o que fazer. Têm um pouco da inteligência dos chineses e muitos dos vícios dos negros. A polícia tem bastante trabalho com eles.

— Aquela sua secretária — disse Bond — não será uma deles?

— É, sim. Moça inteligente e muito capaz. Está comigo há cerca de seis meses. Era, sem favor algum, a melhor de todas quantas responderam a nosso anúncio.

— Parece inteligente, — disse Bond, com indiferença.

— Essa gente está bem organizada? A comunidade de negros chineses tem algum chefe?

— Ainda não. Mas qualquer dia alguém vai querer pôr-se à testa deles. Poderiam representar um pequeno grupo bem útil para pressões políticas. — Pleydell-Smith consultou o relógio. — Isso me faz lembrar... Tenho que ir. Vou fazer o diabo a respeito daquelas pastas. Não posso imaginar o que foi feito delas. Lembro-me perfeitamente... — Interrompeu-se. — Em todo caso, o pior é que não lhe pude fornecer muitas informações sobre Crab Key e aquele doutor. Mas garanto-lhe que o senhor não teria encontrado muito mais nos arquivos. Parece que era um camarada de conversa agradável. Muito hábil para negócios. Depois, houve a encrenca com a Sociedade Audubon. Penso que o senhor está a par. Quanto ao local em si, nada havia nas pastas, a não ser um relatório de antes da guerra e uma cópia do último levantamento do Serviço Topográfico. Parece que é um lugar pouco favorecido. Nada mais que quilômetros de pântanos cobertos de mangues, e um morro enorme de estéreo de aves numa das extremidades. Mas o senhor falou em ir ao Instituto. Eu poderia levá-lo até lá, a fim de apresentá-lo ao encarregado da Seção de Cartografia, não acha?