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O Dr. No tossiu delicadamente. Olhou para Bond, depois para a jovem, e, novamente, para Bond. — E esta, meus amigos, é a minha história — ou antes o primeiro capítulo do que eu espero venha a ser uma saga muito comprida e interessante. O isolamento foi restabelecido. Agora não existem mais espátulas rosadas e por isso não haverá também guardas. Não há dúvida de que a Sociedade Audubon aceitará a minha oferta, cobrindo o período final de seu arrendamento. De qualquer forma, se recomeçar as suas operações, outras desgraças lhe cairão sobre a cabeça. Isto foi-me uma advertência. Não haverá mais interferências.

— Interessante — disse Bond. — Uma história muito interessante. Esse então foi o motivo pelo qual Strangways teve de ser eliminado? Que fez o senhor com ele e a garota?

— Estão no fundo do Reservatório de Mona. Encarreguei disso três dos meus melhores homens. Disponho de uma máquina pequena mas muito eficiente em Jamaica. Preciso dela. Por outro lado, estabeleci uma estreita vigilância sobre os serviços secretos, em Jamaica e em Cuba. Isso se tornou necessário para as minhas operações ulteriores. O seu sr. Strangways começou a suspeitar e tornou-se inquiridor. Felizmente, na ocasião, os hábitos desse homem me eram conhecidos. A sua morte e a de sua colega eram apenas uma questão de coordenação. Esperava desembaraçar-me do senhor com a mesma presteza, mas o senhor foi mais feliz. Contudo, sabia a espécie de homem que o senhor era, graças aos arquivos existentes em King’s House. Pensei que a mosca viria procurar a aranha. Preparei-me então para recebê-lo. Quando a sua canoa apareceu na tela do radar, sabia que não me escaparia mais.

Bond disse: — O seu radar não é muito eficiente, pois foram duas as canoas. A que o senhor viu foi a canoa da jovem. E eu já lhe disse que ela nada tinha a ver comigo.

— Então ela foi infeliz. Acontece que estou precisando de uma mulher branca para uma pequena experiência. Como concordamos antes, sr. Bond, tem-se geralmente o que se procura.

Bond olhou pensativamente para o Dr. No. Refletiu se valeria mesmo a pena tentar um golpe contra este homem inexpugnável. Valeria a pena perder tempo com ameaças ou blefes? Bond nada mais tinha senão um miserável dois de paus sob a sua manga, e o pensamento de jogá-lo quase o entediava. Todavia, com negligência e indiferença, lançou-o sobre a mesa.

— Então, agora quem está sem sorte é o senhor, Dr. No. Agora o senhor já é uma pasta de arquivo em Londres. As minhas reflexões sobre esse caso, as provas da colocação de veneno nas frutas, a centopéia, o acidente com o carro, tudo isto foi cuidadosamente registrado. Da mesma forma o estão os nomes da srta. Chung e da srta. Taro. Foram deixadas instruções, com certa pessoa em Jamaica, segundo as quais o meu relatório deveria ser aberto e levado ao conhecimento das autoridades competentes se eu não voltasse de Crab Key dentro de três dias.”

Bond fez uma pausa. O rosto do Dr. No estava impassível. Nem um só movimento nos olhos ou na boca. A veia jugular pulsava regularmente. Bond inclinou-se para a frente e disse suavemente: — Apenas por causa da jovem, Dr. No, eu lhe oferecerei uma negociação. Em troca de nosso seguro retorno a Jamaica, dou-lhe uma semana de dianteira. O senhor poderá tomar o seu avião, recolher o seu envelope de selos e procurar escapar.

Bond recostou-se no espaldar da caldeira, e perguntou: — Algum interesse na minha proposta, Dr. No?

XVI - HORAS DE AGONIA

Uma voz, por trás de Bond, disse serenamente: — O jantar está servido.

Bond voltou-se para trás. O anunciante fora o guarda-costas, que tinha a seu lado outro homem que bem poderia ser seu irmão gêmeo. Ali ficaram eles, duas barricas de musculatura, com as mãos mergulhadas nas mangas dos quimonos, olhando, por cima da cabeça de Bond, para o Dr. No.

— Ah, já nove horas. — O Dr. No levantou-se lentamente e disse: — Vamos. Podemos continuar a nossa conversação em ambiente mais íntimo. Foi muita bondade dos senhores terem ouvido a minha história com paciência tão exemplar. Espero que a modéstia de minha cozinha e de minha adega não representem mais uma imposição.

Portas duplas tinham sido conservadas abertas por trás dos dois homens de jaquetas brancas. Bond e a jovem atravessaram-nas seguindo o Dr. No, indo ter a uma sala octogonal, com as paredes recobertas de painéis de mogno, e ao centro um candelabro de prata, sob o qual estava posta uma mesa para três pessoas. O tapete simples, azul-escuro, era luxuosamente espesso. O Dr. No tomou a cadeira central, de espaldar alto, e indicou cortesmente, com uma inclinação, a cadeira à sua direita para a jovem. Sentaram-se e abriram guardanapos de seda branca.

A cerimônia vazia e a encantadora sala deixavam Bond louco. Ansiava por despedaçar tudo aquilo com as próprias mãos, por passar o seu guardanapo de seda à volta do pescoço do Dr. No e apertá-lo até que aquelas lentes de contato saltassem daqueles malditos olhos negros.

Os dois guardas usavam luvas de algodão branco. Serviram as iguarias com suave eficiência que era instigada por uma ocasional palavra chinesa proferida pelo Dr. No.

A princípio o Dr. No parecia preocupado. Lentamente, ingeriu três taças de diferentes sopas, utilizando-se de uma colher dotada de um cabo curto e que se adaptava perfeitamente entre as pinças de sua mão mecânica. Bond esforçou-se por esconder os seus temores da jovem. Sentou-se afetando uma atitude de relaxamento e comeu e bebeu com forçado apetite. Falou ainda animadamente com a jovem sobre Jamaica — sobre aves e animais, assim como fores, que constituíam fáceis assuntos de conversação para Honeychile. De vez em quando os seus pés tocavam nos dela, sob a mesa. Ela quase chegou a ficar alegre. Bond pensou que ambos estavam fazendo uma bela imitação de namorados comprometidos, que estivessem saboreando um jantar oferecido por um tio detestável.