Embora tenha um incrivelmente agradável sistema de hidromassagem na banheira extra grande. É como estar num jacúzi.
Durante a viagem, mantivemo-nos de olho no retrovisor para garantir que não havia jornalistas a seguir-nos. O último troço do trajeto estava bastante deserto, pelo que, se houvesse alguém no nosso encalço, facilmente teria sido visto. O Russell disse à Marybeth que ia numa viagem de negócios. Prospeção de móveis ou assim. A mim, não interessa o que lhe disse. Ela já não tem importância.
– Estou tão feliz – murmuro. – Acho que já não me sentia tão feliz há muito tempo.
O Russell sorri, embora haja algo tenso na sua expressão. Não fez segredo de que não queria matar o Douglas.
Ainda não posso acreditar que me obrigou a fazer o trabalho sujo enquanto se encolhia de medo na cozinha. Tem sorte em ser atraente, pois perdi muito do respeito que lhe tinha nessa noite. Devia estar agradecido, não a olhar para mim como se eu fosse alguma espécie de monstro, por amor de Deus.
Bem, se não estiver feliz, pode voltar para a megera da sua mulher e eu arranjarei alguém novo com quem gozar os meus milhões de dólares.
Verto o resto do champanhe no copo do Russell.
– É delicioso – observo. – Onde o arranjaste?
– A Marybeth gosta. – Ultimamente, parece ter começado a falar da mulher com mais frequência e menos ressentimento do que antes. Não é bom sinal.
– Tens mais? – pergunto.
– Acho que não há mais champanhe. Mas talvez haja algum vinho na cozinha.
Irrita-me que o Russell não se ofereça para o ir buscar. Os homens são todos iguais – no início, fazem todos os esforços para nos dar tudo o que queremos, mas depois acabam por nos tomar por garantidas. Que tipo de cavalheiro não se oferece para ir buscar uma garrafa de vinho a uma mulher?
Mas apetece-me, e o champanhe que temos estado a beber só estava meio cheio para começar, por isso agarro numa toalha para enrolar em torno do meu corpo nu e saio da casa de banho para a sala de estar, deixando um rasto de pegadas húmidas na madeira do soalho. A chuva cai pesadamente no alpendre, gotejando do telhado. O que é bom, na eventualidade de alguém nos ter tentado seguir. Não haverá marcas de pneus para rastrear.
Entro na cozinha e, com efeito, está uma garrafa em cima da bancada. É pinot noir, está três quartos cheia e parece um pouco barata, mas é melhor do que nada. Agarro-a e começo a dirigir-me de novo à casa de banho, mas então paro bruscamente.
Uma das janelas da cabana está escancarada.
67
Estaria aquela janela aberta quando cá chegámos? Não me lembro de estar aberta. Por outro lado, estávamos mais concentrados em celebrar o detetive Ramirez me ter dito que planeava prender a Millie Calloway. Saímos impunes – saímos realmente impunes.
Estava aberta, então, quando entrámos? Não me consigo realmente lembrar. Podia certamente ter estado.
E a janela chama bastante mais a atenção agora que está a chover. Jorram gotas para o interior, humedecendo a madeira em volta. Aquela janela devia estar fechada.
Pouso a garrafa de vinho na mesa de apoio junto ao sofá e dirijo-me à janela. As gotas de chuva são gélidas, atingindo-me no rosto e salpicando os meus braços nus. Após uma breve luta, consigo fechar as vidraças.
Pronto.
Agarro no vinho e levo-o para a casa de banho, onde o Russell continua na banheira, o cabelo escuro colado ao crânio. Inicialmente, julgo que tem o rosto molhado da água da banheira, mas então percebo o que se passa.
– Estás a chorar? – atiro-lhe.
O Russell limpa os olhos, constrangido.
– Eu só... não posso crer que o matámos. Nunca tinha feito nada assim.
Não compreendo por que está o Russell a chorar. Fui eu quem matou o Douglas. E não o lamento minimamente. No que me diz respeito, o Douglas merecia tudo o que teve.
– Recompõe-te – atiro-lhe. – O que está feito, feito está.
Seja como for, era uma pessoa terrível. Andava a atormentar-me.
– Porque o traíste.
E isso basta para me deixar na miséria? Ainda que o Russell não saiba que menti ao Douglas sobre não poder ter filhos. É melhor não lhe dizer. Fá-lo-á sentir-se ainda pior.
– Olha... – Abro a toalha e deixo-a cair no chão. Em seguida, encho-lhe o copo com o líquido bordeaux, fazendo o mesmo com o meu. – Por que não me deixas ajudar-te a esquecer isso?
Enquanto subo de novo para a banheira, mergulhando no líquido quente, o Russell engole o conteúdo do copo de vinho, deixando para trás uma mancha vermelha nos seus lábios. Decido que é a ideia certa e esvazio o meu próprio copo de vinho. É do barato, por isso não é como se precisasse de o saborear. Ao fim de mais um copo ou dois, sentir-nos-emos ambos muito melhor.
68
Tinha toda a razão.
Ao fim de dois copos de vinho, o Russell já não está a chorar. E eu sinto uma agradável euforia. Há muito tempo que as coisas não corriam exatamente como eu queria. Depois dos últimos seis meses, precisava de uma vitória, e a de hoje foi das grandes. O Douglas está morto, vou receber uma herança enorme, e a Millie vai arcar por completo com as culpas de tudo. Serviu bastante bem o seu propósito.
– Podia ficar nesta banheira para sempre – suspiro ao reclinar-me, a minha pele nua a roçar contra a do Russell. – É agradável, não é?
– Ahã – responde. – Mas estou meio sonolento. Talvez esteja um pouco ébrio.
Eu não estou ébria, mas sinto-me decididamente um pouco alegre. É agradável. Está tudo tão tranquilo na banheira, exceto por uma música qualquer a tocar ao longe.
– Wendy – diz o Russell. – Não é o teu telemóvel?
Tem razão.
Deve ser o Joe Bendeck. Pedi-lhe para me ligar acerca do substancial património do Douglas. Tiro um certo prazer de o Joe nunca ter gostado de mim e agora eu ser a proprietária de todo o património do Douglas, incluindo a sua empresa, pelo que sou basicamente a sua chefe. Não tem alternativa a não ser bajular-me. Vou gostar de ser uma cabra rica.
Desta vez, agarro num roupão, que aperto sobre o meu
corpo nu antes de sair apressadamente para a sala de estar, onde deixei o meu telemóvel sobre a mesa de café. Com efeito, aparece no ecrã o nome de Joseph Ben-deck. Apanho-o mesmo antes de a chamada ir para o correio de voz.
– Olá, Joe – digo.
– Olá, Wendy.
Tiro prazer de quão absolutamente miserável soa. Sabe bem vencer.
– Era suposto ligar-me esta tarde – recordo-lhe. – São quase dez horas.
– Desculpe. – Há um fio de amargura na sua voz. – O meu melhor amigo acaba de ser assassinado. Não estou propriamente a funcionar a cem por cento neste momento.
– Bem, isso é um problema – digo com rigidez, deambulando até à cozinha. Olho pela janela. Está realmente a chover a cântaros. – É o executor do património do Douglas e, se não consegue fazer o seu trabalho, talvez devesse dar o seu lugar a outro.
– Não. O Doug queria-me a mim. É... O mínimo que posso fazer é seguir os seus desejos.
– Tudo bem. – Se tentar algum truque, certificar-me-ei de que é afastado da empresa. Na verdade, devia provavelmente afastá-lo de qualquer modo. Não confio mais nele do que confiava no Douglas no fim. – Quando vão os bens dele ser transferidos para mim? Preciso de poder pagar as contas.
A morte do Douglas não significa que a hipoteca não precisa de ser paga. Nem sequer tenho um cartão de crédito ativo, pois cancelou-os a todos. Só a penthome tem uma hipoteca de seis dígitos, por isso vou precisar de algum dinheiro – e depressa.
– Quer que o dinheiro do Doug seja transferido para si? – pergunta o Joe.
– Sim. – Tamborilo os dedos na bancada da cozinha. – É assim que funciona, não é?