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© 1954, by William Golding.

© desta edição, 2011, by Editora Nova Fronteira Participações. Direitos de edição da obra em língua portuguesa adquiridos pela Editora Nova Fronteira Participações S.A. Todos os direitos reservados.

Coordenação: Daniel Louzada

Conselho editoriaclass="underline" Daniel Louzada, Frederico Indiani,

Leila Name, Maria Cristina Antonio Jeronimo

Projeto gráfico de capa e miolo: Leandro B. Liporage

Ilustração de capa: Cássio Loredano

Diagramação: Filigrana

Conversão para e-book: Celina Faria e Leandro B. liporage

Equipe editorial Nova Fronteira: Shahira Mahmud, Adriana Torres, Claudia Ajuz, Gisele Garcia

Preparação de originais: Gustavo Penha, José Grillo,

Luiz Alberto Monjardim

CIP-Brasil. Catalogação na fonte

Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

G571s

Golding, William, 1911-1993

O senhor das moscas / William Golding ; apresentação Santiago Nazarian ; tradução Geraldo Galvão Ferraz. - [Ed. especial]. - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2011.

(Saraiva de bolso)

Tradução de: Lord of the flies

ISBN 9788520928776

1. Sobrevivência após acidentes aéreos, naufrágios, etc. Ficção. 2. Romance inglês. I. Ferraz, Geraldo Galvão. II. Título. III. Série.

CDD: 823

CDU: 821.111-3

Apresentação

A força, a inteligência e o carisma

O paraíso perdido, a volta às origens, o fim da civilização. Histórias de náufragos sempre trazem temas como esses e mexem com imagens do inconsciente coletivo. Parece que a ideia de se encontrar perdido numa ilha deserta já está dentro de nós, muito antes de tomarmos conhecimento de Robinson Crusoé ou pegarmos A lagoa azul numa Sessão da Tarde (bem, agora as novas gerações têm ainda a série Lost, não é?). Quando William Golding pisou nesse terreno, em 1953, já não era algo novo na ficção, ainda assim, ele conseguiu lidar com todo o simbolismo da trama de naufrágio e levá-la a uma dimensão psicológica a que poucos chegaram.

Não estamos sozinhos. Essa seria a grande mensagem por trás de O senhor das moscas, com todas as suas implicações. Através do isolamento numa ilha, um grupo de meninos tem a dura tarefa de aceitar que, de fato, eles são um grupo. De que existe sim o outro e que esse também pode ser visto como o invasor, o “bicho”, aquele que vem de fora para limitar suas liberdades e testar suas selvagerias. Por tudo isso, O senhor das moscas é afinal um romance interno, um thriller psicológico, em que o cenário é apenas um palco, convidando a natureza humana a se manifestar plenamente. No atual momento em que vivemos — do isolamento do indivíduo na metrópole, de rompimento das relações tradicionais entre as pessoas — é especialmente interessante ver a questão do individualismo levada de volta às origens. Parece que tudo mudou e, ainda assim, nada é diferente. Nos faz pensar como a natureza humana pode se manifestar de forma semelhante, em situações tão diversas.

Em O senhor das moscas, essa natureza é dividida em três conceitos — a força, o carisma e a inteligência —, representados respectivamente por três personagens — Jack, Ralph e Porquinho. Existe ainda um quarto personagem, que seria a junção desses três aspectos anteriores, e que poderíamos chamar de “o Gênio”, e é exatamente esse que pôde trazer o título do romance. Na dramatização da natureza humana, esses personagens-conceito se alternam e medem suas forças. Caminham para a destruição mútua ou a harmonia? Conseguem viver isolados, precisam de cooperação ou um acaba se sobrepondo aos demais? São essas as perguntas propostas ao decorrer de O senhor das moscas. E a pergunta pessoal que eu, durante a leitura, muitas vezes me fiz é: “Com quem está a minha concha?” Qual desses três personagens tem a voz ativa em minhas próprias ações, qual deles eu estou disposto a ouvir?

Cá entre nós, confesso que ao ler o livro a maior vontade que tive foi de quebrar os óculos de Porquinho e tirá-lo de vez do páreo (hahá). Será essa uma demonstração da minha grande falha de caráter? Será que o autor, como artista, realmente não favoreceu o personagem da beleza/carisma? Ou será que parte da beleza da obra está aí, em dar ao leitor a possibilidade de escolher seu próprio herói?

Isso é você quem vai descobrir, ao fazer sua escolha. Cada um poderá decidir se o melhor é se isolar por proteção, curtir a natureza ou colocar fogo na floresta. Uma coisa eu tenho certeza: você vai adorar se perder com esses personagens. Vai querer passar mais tempo com eles, assim como eu quis. E é isso o que uma boa leitura pode proporcionar de mais gostoso — ainda que, provavelmente, O senhor das moscas será o último livro que você vai querer levar para uma ilha deserta.

Santiago Nazarian

A minha mãe e meu pai

1

A voz da concha

O menino louro deixou-se escorregar ao pé da rocha e avançou rumo à lagoa. Havia tirado o suéter da escola e o carregava agora na mão, mas a camisa cinza estava colada no seu corpo e os cabelos aderiam à sua testa. Em torno dele, um banho de calor: a ampla cicatriz aberta na selva. Avançou com dificuldade por entre trepadeiras e troncos quebrados. Foi quando um pássaro, uma visão de vermelho e amarelo, faiscou, subindo, com um grito de bruxo. Grito que foi ecoado por outro.

— Ei! — dizia. — Espere um pouco!

Os arbustos rasteiros se agitaram, ao lado da escarpa; caiu uma multidão de gotas de chuva, tamborilantes.

— Espere um pouco — a voz repetiu. — Fiquei preso.

O menino louro parou e puxou as meias com um gesto automático, e a selva, por um instante, fez-se um lugar muito familiar.

A voz falou de novo.

— Mal posso me mexer com essas trepadeiras.

O dono da voz apareceu, retrocedendo por entre os arbustos, deixando os espinhos riscarem um blusão sujo. As rótulas gorduchas dos joelhos também estavam espetadas por espinhos. Ele se abaixou, tirou cuidadosamente os espinhos e se virou. Era mais baixo que o menino louro e muito gordo. Avançou, procurando pôr os pés em lugar seguro e, então, deu uma olhada pelos óculos grossos.

— Onde está o homem do megafone?

O menino louro balançou a cabeça.

— Isto é uma ilha. Pelo menos, acho que é. Há recifes no mar. Talvez não haja nenhum adulto aqui.

O menino gordo parecia espantado.

— Mas havia aquele piloto. E ele não estava na cabina de passageiros, ficou lá na frente.

O menino louro, apertando os olhos, examinava o recife.

— Todos aqueles meninos — continuou o gordinho —, entre eles deve haver alguns que escaparam. Deve mesmo, não é?

O menino louro começou a andar do modo mais casual possível rumo à água. Tentava agir normalmente e não parecer desinteressado demais, mas já o menino gordo corria atrás dele.

— Não há nenhum adulto aqui?

— Acho que não.

O menino louro disse isso em tom solene, mas aí o prazer de uma ambição afinal realizada tomou conta dele. No meio da clareira, plantou uma bananeira e fez uma careta para o menino gordo, de cabeça para baixo.

— Nenhum adulto!

O menino gordo pensou um instante.