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A grama havia murchado na frente de cada tronco, mas crescia alta e intocada no centro do triângulo. No vértice, a grama crescia outra vez porque ninguém se sentava lá. Em torno do lugar de reunião, elevavam-se os troncos cinzentos, retos ou inclinados, apoiando o teto baixo das folhas. Nos dois lados, a praia; atrás, a lagoa; na frente, a escuridão da ilha.

Ralph virou-se para o lugar do chefe. Nunca haviam tido uma reunião em hora tão avançada assim. Por isso, o lugar parecia tão diferente. Normalmente, a parte inferior do telhado verde era iluminada por uma massa confusa de reflexos dourados e os rostos eram clareados de modo invertido, como — pensou Ralph — quando se tem nas mãos uma lanterna elétrica. Mas agora a luz do sol chegava obliquamente, de modo que as sombras eram o que deveriam ser.

Sentiu outra vez aquela estranha inclinação de especular, que lhe parecia tão estranha. Se os rostos eram diferentes quando iluminados de cima ou de baixo, o que era um rosto? O que era qualquer coisa?

Ralph mexeu-se, impaciente. Que problema! Sendo chefe, você tem de pensar, tem de saber. E as ocasiões passavam, portanto era preciso decidir logo. Isso era uma coisa para pensar; porque pensar era uma coisa preciosa, que dava resultado...

Só que não consigo pensar — concluiu Ralph de frente para o lugar do chefe. Não como Porquinho.

Novamente nessa noite, Ralph teve de ajustar seus valores. Porquinho conseguia pensar. Ele caminhava passo a passo dentro daquela cabeça gorda, só que Porquinho não era chefe. Mas Porquinho, apesar de todo seu corpo ridículo, tinha cérebro. Ralph agora era um especialista em pensar e podia reconhecer isso em outra pessoa.

O sol nos olhos lembrou-o de que o tempo passava. Pegou a concha ao pé da árvore e examinou a sua superfície. A exposição ao ar desbotara os amarelos e rosados até um quase branco, próximo da transparência. Ralph sentiu uma espécie de afetuosa reverência pela concha, embora ele próprio a tivesse tirado da lagoa. Ficou de frente para o lugar de reunião e levou a concha aos lábios.

Os outros esperavam por isso e vieram imediatamente. Os que sabiam que um navio passara ao largo da ilha enquanto a fogueira estava apagada mortificavam-se ante o pensamento da cólera de Ralph; mas aqueles, entre eles os pequenos, que nada sabiam ficaram impressionados pelo ar geral de solenidade. O lugar de reunião encheu-se logo; Jack, Simon, Maurice, a maioria dos caçadores, à direita de Ralph; o resto à esquerda, sob o sol. Porquinho veio e ficou fora do triângulo. Isso indicava que queria ouvir, mas sem falar. Porquinho pretendia mostrar assim sua desaprovação.

— O negócio é o seguinte: precisamos de uma reunião.

Ninguém disse nada, mas os rostos que se viraram para Ralph estavam atentos. Ele sacudiu a concha. Aprendera na prática que declarações fundamentais como essa tinham de ser ditas pelo menos duas vezes antes que todo mundo entendesse. Era preciso sentar, atrair todos os olhares para a concha e lançar palavras como pesadas pedras redondas entre os grupinhos que esperavam agachados ou de cócoras. Buscava na mente palavras simples para que até os pequenos entendessem o que se tratava na reunião. Depois, talvez, debatedores hábeis — Jack, Maurice, Porquinho — usariam toda a sua arte para distorcer a reunião; mas agora, no começo, o tema do debate devia ser apresentado claramente.

— Precisamos de uma reunião. Não para brincar. Não para rir nem cair do tronco — o grupo dos pequenos na árvore empenada deu risadinhas e se entreolhou. — Não para fazer piadas ou para... — levantou a concha num esforço para achar a palavra convincente — para espertezas. Não para essas coisas. Para arrumar as coisas.

Fez uma pausa.

— Eu andei por aí. Andei sozinho, pensando no jeito das coisas. Sei do que precisamos. Uma reunião para acertar tudo. E antes de mais nada, tenho de falar.

Fez outra pausa e, automaticamente, puxou o cabelo para trás. Porquinho entrou no triângulo nas pontas dos pés, feito seu protesto ineficaz. Juntou-se aos outros.

Ralph continuou.

— Tivemos uma porção de reuniões. Todo mundo gosta de falar e de ficar junto dos outros. Decidimos coisas. Mas elas não foram feitas. Iríamos trazer água do rio e deixá-la nas cascas de coco sob as folhas frescas. Foi assim, por alguns dias. Agora não há mais água. As cascas estão secas. A gente bebe no rio.

Houve um sussurro de assentimento.

— Não que haja mal em beber no rio. Só quero dizer que eu mesmo prefiro tomar água ali, vocês sabem onde, naquele tanque onde há a cachoeira... do que numa velha casca de coco. Só que nós dissemos que iríamos trazer a água. E não trouxemos. Só havia duas cascas cheias esta tarde.

Passou a língua pelos lábios.

— Depois foi a vez das cabanas. Dos abrigos.

O murmúrio cresceu novamente e morreu.

— A maioria dorme nos abrigos. Esta noite, a não ser Sameeric junto à fogueira, todos dormiram neles. Quem construiu os abrigos?

Logo irrompeu um clamor. Todo mundo fizera as cabanas. Ralph teve de sacudir a concha de novo.

— Esperem um pouco! Quero dizer, quem construiu as três? Nós todos fizemos a primeira, quatro fizeram a segunda e eu e Simon fizemos a última ali. Por isso está cai não cai. Não. Não é para rir. Essa cabana poderá cair se chover outra vez. Precisaremos delas então.

Fez uma pausa e limpou a garganta.

— E mais uma coisa. Escolhemos aquelas pedras bem pra lá da piscina como banheiro. Foi bem-escolhido também. A maré limpa aquele lugar. Os pequenos sabem disso.

Houve risadas aqui e ali, olhares furtivos.

— Mas muita gente parece usar qualquer lugar. Até perto das cabanas e da plataforma. Vocês, pequenos, quando estão pegando frutas, se ficarem apertados...

A assembleia rugiu.

— Digo que se ficarem apertados, devem ir para longe do lugar das frutas. É sujo.

Desta vez, gargalhadas.

— Eu disse que é sujo!

Puxou a camisa cinza e dura.

— É sujo de verdade. Se ficarem apertados, corram pela praia até as pedras.

Porquinho estendeu a mão para a concha, mas Ralph sacudiu a cabeça. Aquele discurso fora planejado, ponto por ponto.

— Todos teremos de usar as pedras de novo. Este lugar está ficando sujo. — Fez uma pausa. A assembleia, sentindo a proximidade de uma crise, estava tensa e na expectativa. — E mais: sobre a fogueira.

Ralph deixou escapar o ar com um pequeno som que foi repetido pelo auditório. Jack começou a cortar um pedaço de madeira com sua faca e cochichou algo com Robert, que olhou para longe.

— A fogueira é a coisa mais importante da ilha. Como poderemos ser salvos algum dia, a não ser por sorte, se não tivermos uma fogueira? É demais para nós fazer uma fogueira?

Estendeu os braços.

— Olhem! Quantos somos? Mesmo assim não podemos manter a fogueira soltando fumaça. Não entendem? Não podem ver que devemos morrer antes de deixar o fogo apagar?

Houve um risinho afetado entre os caçadores. Ralph virou-se vivamente para eles.