Выбрать главу

— Amanhã — disse o chefe —, vamos caçar outra vez.

Apontou para um ou outro selvagem com a lança.

— Alguns de vocês ficarão aqui para melhorar a caverna e defender a entrada. Vou levar poucos caçadores comigo e trazer carne. Os defensores da porta não deixarão os outros entrar...

Um selvagem levantou a mão e o chefe virou um rosto pintado e gélido para ele.

— Por que eles iriam tentar entrar, chefe?

O chefe foi vago, mas sério.

— Eles tentarão. Tentarão estragar as coisas que fazemos. Os guardas da entrada precisarão tomar muito cuidado. E além...

O Chefe ficou quieto. Viram um triângulo de rosa espantoso surgir, passar pelos seus lábios e sumir.

— ...e, além disso, o bicho pode tentar entrar. Lembrem-se como ele se arrastava...

O semicírculo estremeceu e resmungou, concordando.

— Ele veio... disfarçado. Pode vir outra vez, embora nós tenhamos dado a ele a cabeça da nossa caça. Vigiem e tenham cuidado.

Stanley levantou o antebraço da pedra e apontou para cima um dedo interrogativo.

— Que é?

— Mas nós não, nós não...?

Retorceu-se e baixou os olhos.

— Não!

No silêncio que se seguiu, cada selvagem escapou da sua memória individual.

— Não! Como poderíamos... matar... ele?

Meio aliviados, meio apavorados pela possibilidade de novos terrores, os selvagens ficaram murmurando outra vez.

— Vamos deixar a montanha de lado — disse o chefe solenemente —, e dar a ele a cabeça do que matarmos.

Stanley levantou o dedo de novo.

— Acho que o bicho se disfarça sozinho.

— Talvez — disse o chefe. Uma especulação teológica surgia aí. — De qualquer modo, é melhor ficarmos do lado dele. Não sabemos o que pode fazer.

A tribo considerou isto e se abateu como sob uma rajada de vento. O chefe viu os efeitos das suas palavras e parou de repente.

— Mas amanhã vamos caçar e, quando tivermos carne, faremos uma festa...

Bill levantou a mão.

— Chefe.

— Sim?

— Que vamos usar para acender o fogo?

O rubor do chefe foi oculto pela argila branca e vermelha. No silêncio incerto, a tribo começou a murmurar outra vez. Então, o chefe levantou a mão.

— Vamos pegar o fogo dos outros. Ouçam. Amanhã vamos caçar e arranjar carne. Hoje à noite irei com dois caçadores... quem?

Maurice e Roger levantaram as mãos.

— Maurice...

— Sim, chefe.

— Onde está a fogueira deles?

— No mesmo lugar, perto da pedra do fogo.

O chefe concordou.

— Os outros podem dormir assim que o sol sumir. Mas nós três, Maurice, Roger e eu, temos o que fazer. Vamos partir antes do crepúsculo...

Maurice levantou a mão.

— Mas e se encontrarmos...

O chefe pôs a objeção de lado.

— Vamos pela areia. E se ele vier, faremos nossa... nossa dança de novo.

— Só nós três?

De novo o murmúrio cresceu e se extinguiu.

Porquinho estendeu os óculos a Ralph e esperou para receber novamente sua visão. A madeira estava úmida e era a terceira vez que acendiam. Ralph recuou, de pé, falando para si mesmo.

— Não queremos outra noite sem fogueira.

Olhou em volta, de modo culpado, para os outros três meninos. Era a primeira vez que admitia a dupla função da fogueira. Certamente, uma era mandar uma coluna de fumaça sinalizadora; mas a outra era ser uma espécie de lar agora e uma segurança até que dormissem. Eric soprou na madeira até haver um brilho e uma chamazinha. Uma fumaceira branca e amarela subiu para o céu. Porquinho pegou os óculos de volta e olhou com prazer para a fumaça.

— Se pudéssemos fazer um rádio!

— Ou um avião...

— ...ou um barco.

Ralph recorreu ao seu decadente conhecimento do mundo.

— Poderíamos ser aprisionados pelos vermelhos.

Eric puxou o cabelo para trás.

— Seria melhor que...

Ele não iria citar nomes e Sam acabou a sentença para ele, sacudindo a cabeça, ao longo da praia.

Ralph lembrou-se da desajeitada figura num paraquedas.

— Ele disse alguma coisa sobre um homem morto... — Corou penosamente pela confissão de ter estado na dança. Fez rápidos movimentos de exortação para a fumaça, com seu corpo. — Não pare, vá, para cima!

— A fumaça está diminuindo.

— Precisamos de mais madeira, mesmo molhada.

— Minha asma...

A resposta foi mecânica.

— Pro diabo com sua asma.

— Se eu trouxer troncos, minha asma vai piorar. Gostaria que não, Ralph, mas é o que acontecerá.

Os três foram para a floresta e pegaram montes de madeira podre. A fumaça subiu novamente, amarela e densa.

— Vamos arranjar comida.

Juntos, foram até as árvores frutíferas, carregando as lanças, falando pouco, fartando-se rapidamente. Quando saíram da floresta, o sol estava se pondo e não havia mais fumaça, apenas brasas brilhando na fogueira.

— Não posso trazer mais lenha — disse Eric. — Estou cansado.

Ralph limpou a garganta.

— Lá em cima ela ficava sempre acesa.

— Lá era pequena. Mas esta tem de ser grande.

Ralph jogou um pedaço de madeira no fogo e viu a fumaça que subia sob o crepúsculo.

— Precisamos deixá-la acesa.

Eric jogou-se no chão.

— Estou muito cansado. E o que adianta?

— Eric! — gritou Ralph, em tom chocado. — Não fale assim!

— Ora, o que adianta?

Ralph, indignado, tentou lembrar. Havia alguma coisa de bom sobre uma fogueira. Uma coisa muito, muito boa.

— Ralph já falou demais sobre isso — disse Porquinho, pensativo. — De que outro jeito poderemos ser salvos?

— Claro! Se não fizermos fumaça...

Agachou-se diante deles no crepúsculo cada vez mais avançado.

— Não entendem? Que adianta ficar sonhando com rádios e barcos?

Estendeu a mão e apertou os dedos até cerrar o punho.

— Só há uma coisa que podemos fazer para sair dessa trapalhada. Qualquer um pode brincar de caçar, qualquer um pode arranjar carne...

Olhou o resto de cada um deles. Então, nesse momento de maior paixão e convicção, aquela cortina desceu em sua cabeça e ele esqueceu para onde ia. Ajoelhou-se, o punho cerrado, olhando solenemente para cada um. Daí, a cortina se abriu.

— Oh, sim. Portanto temos de fazer fumaça, e mais fumaça...

— Mas não a conseguimos manter acesa! Veja só!

O fogo estava morrendo ao lado.

— Dois para cuidar do fogo — disse Ralph, meio para si. — São 12 horas por dia.

— Não podemos trazer mais madeira, Ralph...

— Não na escuridão...

— Não à noite...