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“Mentira. Dez ou vinte celebridades no mundo inteiro podem dizer que ganham uma fortuna. O resto vive de aparências; a casa alugada pelo estúdio, os costureiros e joalheiros emprestando roupas, os carros cedidos por determinado período de tempo, de modo que possam ser associados ao luxo. O estúdio paga tudo que signifi ca glamour, e os atores ganham um salário pequeno. Esse não é o caso da pessoa que está aqui sentada conosco, mas este será seu caso.”

A Celebridade não sabe se Gibson estava sendo verdadeiro, se realmente acreditava estar ainda diante de um dos maiores atores do mundo, ou estava lhe jogando uma farpa. Mas isso não faz a menor diferença, desde que assinem o contrato, o produtor não mude de idéia na última hora, os roteiristas sejam capazes de entregar o texto na data marcada, o orçamento seja rigorosamente cumprido, e uma 1 5 2

excelente campanha de relações públicas comece a funcionar. Já tinha visto centenas de projetos serem interrompidos; isso fazia parte da vida. Mas depois de seu mais recente trabalho ter passado quase despercebido pelo público, precisava desesperadamente de um sucesso avassalador. E Gibson tinha condições de fazer isso.

— Aceito — disse a moça.

— Já conversamos tudo com sua agente. Você assinará um contrato exclusivo conosco. No primeiro fi lme, ganhará 5 mil dólares por mês, durante um ano — e terá que aparecer em festas, ser pro-movida por nosso departamento de relações públicas, viajar para onde mandarmos, dizer aquilo que queremos, não dizer o que pensa. Está claro?

Gabriela faz um sinal positivo com a cabeça. O que mais podia dizer: que 5 mil dólares é o salário de uma secretária na Europa? Era pegar ou largar, e ela não queria mostrar qualquer hesitação: claro que entendia as regras do jogo.

— Portanto — continua Gibson — irá viver como uma milioná-

ria, irá se comportar como uma grande estrela, mas não esqueça que nada disso é verdade. Se tudo correr bem, aumentamos seu salário para 10 mil dólares no próximo fi lme. Depois voltamos a conversar, já que você sempre terá um único pensamento em sua cabeça: “Um dia eu vou me vingar de tudo isso.” Sua agente, é claro, ouviu nossa proposta; ela já sabia o que esperar. Não sei se você sabia.

— Isso não tem importância. Não pretendo tampouco me vingar de nada.

Gibson fi ngiu que não escutou.

— Não a chamei aqui para falar do seu teste: ele foi ótimo, o melhor que vi em muito tempo. Nossa encarregada de selecionar o elenco pensou a mesma coisa. Chamei-a aqui para que fi que claro, desde o início, em que terreno está pisando. Muita atriz ou ator, depois do primeiro fi lme, depois de entender direito que o mundo está aos seus pés, quer mudar as regras. Mas assinaram contratos, 1 5 3

sabem que é impossível, e partem então para crises depressivas, auto-destrutivas, coisas do gênero. Hoje em dia, a nossa política mudou: explicamos claramente o que vai acontecer. Você terá que conviver com duas mulheres: se tudo der certo, uma delas será a que o mundo inteiro adora. A outra é a que sabe, a todo o momento, que não tem absolutamente nenhum poder.

“Portanto, aconselho que antes de ir ao Hilton para pegar a roupa desta noite, pense bem em todas as conseqüências. No momento em que você entrar na suíte, terá quatro cópias de um gigantesco contrato lhe esperando. Antes de assiná-lo, o mundo inteiro lhe pertence, e pode fazer de sua vida o que desejar. No momento em que colocar sua assinatura no papel, já não é dona de mais nada; controlaremos desde sua maneira de cortar o cabelo até os lugares onde deve comer — mesmo que não tenha apetite. Evidente que poderá ganhar dinheiro em publicidade, usando sua fama, e é por causa disso que as pessoas aceitam essas condições.”

Os dois homens se levantam.

— Sente-se bem em contracenar com ela?

— Dará uma excelente atriz. Mostrou emoção em um momento em que todos querem mostrar apenas efi ciência.

— Não pense que este iate é meu — diz Gibson, depois de chamar alguém para acompanhá-la até a lancha que a levaria de volta ao porto.

Ela havia entendido direito o recado.

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3:44 PM

— Vamos até o primeiro andar tomar um café — diz Ewa.

— Mas temos o desfi le daqui a uma hora. E você sabe como está o trânsito.

— Dá tempo para um café.

Sobem as escadas, dobram à direita, vão até o fi nal do corredor, o segurança colocado na porta já os conhece e apenas os cumprimenta.

Passam por algumas vitrines de jóias — diamantes, rubis, esmeraldas

— e saem de novo para o sol do terraço que se encontra no primeiro andar. Ali, a famosa marca de jóias alugava todos os anos o espaço, para receber amigos, celebridades, jornalistas. Móveis de bom gosto, um farto bufê com iguarias selecionadas constantemente abastecido, sentam-se em uma mesa protegida por um guarda-sol. Um garçom aproxima-se, pedem água mineral com gás e café expresso. O gar-

çom pergunta se desejam algo do bufê. Agradecem, dizem que já tinham almoçado.

Em menos de dois minutos ele volta com o que pediram.

— Está tudo bem?

— Está tudo ótimo.

“Está tudo péssimo”, pensa Ewa. “Exceto o café.”

Hamid sabe que algo estranho está se passando com sua mulher, mas deixaria a conversa para outro momento. Não quer pensar nisso. Não quer arriscar-se a ouvir algo como “vou deixá-lo”. Tem disciplina sufi ciente para controlar-se.

Em uma das outras mesas está um dos mais famosos estilistas do mundo, com sua máquina fotográfi ca ao lado, e um olhar distante —

como quem deseja deixar claro que não quer ser incomodado. Ninguém se aproxima, e quando alguma pessoa desavisada tenta ir até ele, a relações públicas do local, uma simpática senhora de 50 anos, pede gentilmente que o deixem em paz, precisa descansar um pouco do constante assédio de modelos, jornalistas, clientes, empresários.

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Lembra-se de quando o vira pela primeira vez, tantos anos atrás que parecia uma eternidade. Já estava em Paris há mais de onze meses, fi zera alguns amigos no meio, batera em várias portas, e graças aos contatos do sheik (que dissera não conhecer ninguém no meio, mas que tinha amigos em outras posições de poder) conseguira um emprego como desenhista em uma das mais respeitadas marcas de alta-costura. Em vez de fazer apenas os esboços baseados nos ma-teriais que tinha diante de si, costumava permanecer no ateliê até altas horas da noite, trabalhando por conta própria com as amostras do material que trouxera da sua terra. Durante este período, foi chamado duas vezes de volta: na primeira soube que seu pai tinha morrido e lhe deixara como testamento a pequena empresa familiar de compra e venda de tecidos. Antes mesmo que tivesse tempo de refl etir, soube por um emissário do sheik que alguém se encarregaria de administrar o negócio, investiriam o que fosse necessário para que prosperasse, e todos os direitos continuariam em seu nome.

Perguntou qual a razão, já que o sheik demonstrara total desco-nhecimento ou falta de interesse pelo tema.

— Uma fi rma francesa, fabricante de malas, pretende instalar-se aqui. A primeira coisa que fi zeram foi procurar nossos fornecedores de tecido, prometendo que o usariam em alguns de seus produtos de luxo. Então já temos clientes, honramos nossas tradições, e mante-mos o controle da matéria-prima.