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Acompanhou-a até embaixo; o chofer abriu a porta do carro.

— Mantenha-se fi rme: não conhece os detalhes do contrato, é a sua agente quem se ocupa disso. E aproveite a festa.

A festa.

Na verdade, o jantar — mas não vê mesas ou comida, apenas garçons andando de um lado para o outro com todo tipo de bebida possível, inclusive água mineral. Os pequenos grupos se formam, as pessoas que chegaram sozinhas parecem perdidas. Está em um gigantesco jardim com poltronas e sofás espalhados por todos os cantos, vários pilares de um metro de altura onde estão modelos se-mivestidas, corpos esculturais, dançam ao som da música que sai de alto-falantes estrategicamente escondidos.

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As celebridades continuam a chegar. Os convidados parecem felizes, estão sorrindo, tratam-se uns aos outros com a intimidade de quem se conhece há muitos anos, mas Jasmine sabe que é mentira: devem se encontrar vez ou outra em ocasiões como essa, jamais lembram o nome da pessoa com quem estão conversando, mas precisam mostrar a todos que são infl uentes, conhecidos, admirados, cheios de contatos.

A moça — que antes parecia irritada — agora demonstra que está completamente perdida. Pede um cigarro e se apresenta. Em poucos minutos, uma já sabe a vida da outra. Consegue levá-la até a amurada, fi cam olhando o oceano enquanto a festa se enche de conhecidos e desconhecidos. Descobrem que estão agora trabalhando para o mesmo homem, embora em projetos diferentes. Nenhuma das duas o conhece, e para ambas tudo aconteceu no mesmo dia.

Volta e meia algum grupo de homens passa, tenta puxar conversa, mas as duas fi ngem que não é com elas. Gabriela era a pessoa que precisava encontrar para dividir o sentimento de abandono que carrega, apesar de todas as palavras bonitas que sua companheira lhe dissera. Se tivesse que escolher entre sua carreira e o amor de sua vida, não teria dúvidas — deixaria tudo de lado, embora isso fosse um comportamento típico de adolescente. Acontece que o amor de sua vida deseja que escolha sua carreira, e aceitou a proposta de HH apenas para que se orgulhe de tudo que fez por ela, o cuidado como guiou seus passos, o carinho com que corrigiu seus erros, o entusiasmo presente em cada palavra e cada ação — mesmo as mais agressivas.

Gabriela também precisava encontrar Jasmine. Para pedir conselhos, agradecer não estar sozinha naquele momento, acreditar que coisas boas acontecem para todo mundo. Confessar que estava preocupada com a maneira como seu companheiro a havia deixado ali, quando na verdade tinha ordens de apresentá-la a pessoas que deveria conhecer.

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— Ele acha que pode disfarçar suas emoções. Mas sei que alguma coisa de errado está acontecendo.

Jasmine diz que não se preocupe, relaxe, beba um pouco de champagne, aproveite a música e a paisagem. Imprevistos sempre acontecem, e existe um exército de pessoas para lidar com eles, de modo que ninguém, absolutamente ninguém descubra o que acontece nos bastidores do luxo e do glamour. Em breve a Celebridade estará chegando.

— Mas, por favor, não me deixe sozinha; não vou demorar muito.

Gabriela garante que não a deixará sozinha. É sua única amiga no novo mundo que acaba de pisar.

Sim, é sua única amiga, mas é jovem demais, e isso a faz sentir como se já tivesse passado da idade de começar alguma coisa. A Celebridade demonstrara ser uma pessoa absolutamente superfi cial enquanto se dirigiam para o tapete vermelho, o encanto havia desaparecido por completo, precisa estar ao lado de um alguém do sexo masculino, arranjar uma companhia para aquela noite, por mais que a menina ao seu lado seja agradável e simpática. Nota que o tal homem que vira no bar também está na amurada do grande jardim, contemplando o oceano, de costas para a festa, completamente alheio ao que se passa no grande jantar de gala. É carismático, bonito, elegante, misterioso. Quando chegasse o momento certo, iria sugerir à sua nova amiga que fossem até lá e iniciassem uma conversa

— sobre qualquer assunto.

Afi nal de contas, e apesar de tudo, aquele era o seu dia de sorte, e isso incluía encontrar um novo amor.

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8:21 PM

O legista, o comissário, o detetive Savoy e uma quarta pessoa

— que não se identifi cou, mas que foi trazida pelo comissário — es-tão sentados em torno de uma mesa.

A tarefa não é exatamente discutir um novo crime, mas a declara-

ção conjunta que deve ser feita para os jornalistas que se aglomeram na frente do hospital; desta vez uma Celebridade mundial acaba de morrer, um famoso diretor se encontra na unidade de terapia intensiva, e as agências de notícias do planeta devem ter enviado uma mensagem radical aos seus jornalistas: ou conseguem alguma coisa de concreto, ou serão despedidos.

— A medicina legal é uma das ciências mais antigas do planeta.

Graças a ela, muitos traços de veneno podiam ser identifi cados, e antídotos produzidos. Mesmo assim, a realeza e os nobres preferiam ter sempre um “provador ofi cial de comida”, de modo a evitar surpresas não previstas pelos médicos.

Savoy já tinha encontrado o “sábio” durante a tarde. Desta vez, deixa que o comissário entre em cena e acabe com a conversa erudita.

— Chega de demonstrar sua cultura, doutor. Há um criminoso à solta na cidade.

O médico não se deixa impressionar.

— Como legista, não tenho autoridade para determinar a ocorrência de um assassinato. Não posso emitir opiniões, mas defi nir a causa da morte, a arma utilizada, a identidade da vítima, a hora aproximada que o crime foi cometido.

— O senhor vê alguma relação entre as duas mortes? Há algo que possa ligar o assassinato do produtor com o do ator?

— Sim. Ambos trabalhavam no cinema!

Dá uma gargalhada. Ninguém move um músculo; as pessoas ali naquela sala não têm o menor senso de humor.

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— A única relação é que nos dois casos foram usados produtos tóxicos que afetam o organismo com uma velocidade impressionan-te. Entretanto, a grande surpresa do segundo assassinato é a maneira como o cianureto foi embalado. O envelope possuía no seu interior uma fi na membrana de plástico hermeticamente selada a vácuo, mas fácil de ser rompida no momento em que se rasga o papel.

— Pode ter sido fabricado aqui? — pergunta o quarto homem, com forte sotaque estrangeiro.

— Pode. Mas seria muito difícil, porque a manipulação é comple-xa, e quem o manipulou sabia que o objetivo seria um assassinato.

— Ou seja, o assassino não o fabricou.

— Duvido. Com quase toda certeza foi encomendado a um grupo especializado. No caso do curare, o próprio criminoso poderia ter mergulhado a agulha no veneno, mas o cianureto exige métodos especiais.

Savoy pensa em Marselha, na Córsega, na Sicília, nos países do Leste Europeu, nos terroristas do Oriente Médio. Pede licença, sai da sala por um momento, e telefona para a Europol. Explica a gravidade da situação. Pede que façam um levantamento completo de laborató-

rios onde se podem produzir armas químicas daquela natureza.

É colocado em contato com alguém, que diz que o mesmo acaba de ser requisitado por uma central de inteligência dos Estados Unidos. O que está acontecendo?

— Nada. Por favor me respondam assim que tiverem uma pista. E

por favor, tenham essa pista nos próximos dez minutos.

— Impossível — diz a voz do outro lado da linha. — Daremos a resposta quando a tivermos; nem antes, nem depois. Precisamos fazer um requerimento para...

Savoy desliga ali mesmo, e torna a juntar-se ao grupo.

Papel.

Essa parece ser a obsessão de todos aqueles que trabalham com a segurança pública. Ninguém quer arriscar dar um passo sem antes 3 2 4

ter todas as garantias de que seus superiores aprovaram o que estão fazendo. Homens que tinham uma carreira brilhante pela frente, que começaram a trabalhar com criatividade e entusiasmo, fi cam agora amedrontados em um canto, sabendo que estão diante de desafi os sérios, é preciso agir com rapidez, mas a hierarquia precisa ser respeitada, a imprensa está pronta para acusar a polícia de brutalidade, os contribuintes vivem reclamando de que nada é resolvido