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― Ele há de arrancar-lhe a cabeça por ter desobedecido às ordens. Se eu cair, caímos os dois.

― Ótimo ― respondeu Sestak. ― Mas eu sou o comandante tático. Não posso ser desautorizado. Quando me chamam, é o fim da conversa. Não quero que os criminosos pensem que podem atacar um agente federal. Essa é que é a realidade. Quanto ao resto, você e o diretor podem ir se foder.

― Vinte homens mortos ― murmurou Boxton.

― Que vão para o diabo. Você e o Cilke queriam que eu acabasse com eles, mas não tiveram tomates para dizê-lo abertamente.

E, de repente, Boxton soube que aquilo era verdade.

Kurt Cilke preparou-se para nova reunião com o diretor, em Washington. Tinha as suas notas, com um esboço do que ia dizer e um relatório sobre todas as circunstâncias que tinham rodeado o ataque a sua casa.

Como sempre, Bill Boxton acompanha-lo-ia, mas dessa vez por desejo expresso do diretor.

Cilke e Boxton estavam no gabinete do diretor, onde uma fila de monitores de Tv mostrava aspectos das diversas atividades da secção local do FBI. Sempre cortês, o diretor apertou a mão aos dois homens e convidou-os a sentarem-se, não sem dirigir a Boxton um olhar frio, desconfiado. Dois dos seus adjuntos encontravam-se igualmente presentes.

― Meus senhores ― disse, dirigindo-se a todo o grupo ―, temos um problema para resolver. Não podemos deixar passar uma coisa destas sem responder com todos os nossos recursos. Cilke, quer manter-se no lugar ou pedir a reforma?

― Fico ― respondeu Cilke.

O diretor voltou-se para Boxton, com uma expressão dura no rosto aristocrático.

― Você comandava a operação. Como é possível que todos os assaltantes tenham sido mortos e não tenhamos um único para interrogar? Quem deu a ordem de fogo? Você? E com base em quê?

Boxton sentou-se muito rígido na sua cadeira.

― Os atacantes lançaram uma bomba para dentro da casa e começaram a disparar ― respondeu. ― Não tínhamos alternativa.

O diretor suspirou. Um dos seus adjuntos emitiu um grunhido de troça.

― O capitão Sestak é um dos nossos rapazes-maravilha ― disse o diretor. ― Tentou, ao menos, conseguir um prisioneiro?

― A ação não demorou mais de dois minutos, senhor ― afirmou Boxton. ― Sestak é um táctico de campo muito eficiente.

― Bom, não houve reações dos meios de comunicação nem do público ― continuou o diretor. ― Mas devo dizer que considero o que se passou um banho de sangue.

― Foi o que foi ― comentou um dos adjuntos.

― Bom, agora não tem remédio ― concluiu o diretor. ― Cilke, preparou algum plano operacional?

Cilke sentira-se invadir pela raiva face às críticas de que ele e Boxton estavam a ser alvo, mas respondeu calmamente:

― Quero cem agentes colocados na minha delegação. Quero que peça uma auditoria, completa aos bancos Aprile. Vou cavar fundo no passado de todos os envolvidos neste assunto.

― Não se sente minimamente em dívida para com esse Astorre Viola por tê-lo salvo a si e à sua família? ― inquiriu o diretor.

― Não. É preciso conhecer essa gente. Primeiro arranjam-nos os sarilhos, e depois ajudam-nos a sair deles.

― Não esqueça, um dos nossos interesses primordiais e apropriarmo-nos dos bancos Aprile. Não só porque beneficiamos, mas também porque esses bancos estão destinados a ser um centro de branqueamento de dinheiro da droga. E através deles chegamos ao Portella e ao Tulippa. Temos de olhar para tudo isto de uma forma global. Astorre Viola recusa vender os bancos, e o cartel está a tentar eliminá-lo. Até ao momento, não conseguiram. Sabemos que os dois assassinos contratados que abateram o Don desapareceram. Dois detetives da polícia de Nova Iorque foram vítimas de um atentado à bomba.

―Astorre Viola é um homem astuto e escorregadio, e não está envolvido em qualquer atividade criminosa ― lembrou Cilke ―, pelo que não podemos verdadeiramente acusá-lo seja do que for. É possível que o cartel consiga desembaraçar-se dele, e nesse caso os filhos do Don venderão os bancos. Estou certo de que então, mais cedo ou mais tarde, cometerão um erro qualquer.

Não era invulgar as agências policiais do governo entrarem em jogos a longo prazo, sobretudo com a gente da droga. Mas, para fazê-lo, tinham de permitir que fossem cometidos alguns crimes.

― Não seria a primeira vez que fazíamos uma jogada desse tipo ― concordou o diretor. ― O que não significa dar carta branca ao Portella.

― Claro que não ― respondeu Cilke, sabendo perfeitamente que estavam todos a falar para o gravador.

― Dou-lhe cinqüenta homens ― disse o diretor. ― E vou pedir uma auditoria completa aos bancos, só para agitar as águas.

― Já os investigamos noutras ocasiões ― interveio um dos adjuntos ― e nunca encontramos fosse o que fosse.

― Há sempre uma possibilidade ― disse Cilke. ― O Astorre não é banqueiro, pode ter cometido erros.

― Sim ― corroborou o diretor. ― Um pequeno deslize, é tudo aquilo de que o Procurador-Geral precisa.

De volta a Nova Iorque, Cilke reuniu-se com Boxton e Sestak para planear a sua campanha.

― Vão dar-nos mais cinqüenta agentes para investigar o assalto a minha casa ― disse-lhes. ― Temos de ter muito cuidado. Quero tudo o que possam arranjar-me sobre o Astorre Viola. Quero investigar essa história da bomba no carro dos dois detetives. Quero tudo o que houver sobre o desaparecimento dos irmãos Sturzo e toda a informação que conseguirmos juntar sobre o cartel. Concentrem-se no Astorre e também na detetive Washington. Tem fama de corrupta e brutal, e a história que conta a respeito da explosão e do dinheiro encontrado no local é muito suspeita.

― E o tal Tulippa? ― perguntou Boxton. ― Pode sair do país a qualquer momento.

― O Tulippa anda em digressão, a fazer conferências sobre a legalização da droga e a cobrar dinheiro de chantagem a várias grandes empresas.

― Não podemos deitar-lhe a mão com base nisso? ― inquiriu Sestak

― Não ― respondeu Cilke. ― Oficialmente, tem uma seguradora, e vende-lhes seguros. Talvez conseguíssemos qualquer coisa, mas os tipos das empresas opõem-se. Resolveram o problema da segurança do seu pessoal na América do Sul. E o Portella não tem para onde ir.

Sestak sorriu-lhe com frieza.

― Quais são as regras de confrontação neste caso?

― As ordens do diretor foram: nada de matanças, mas protejam-se ― respondeu Cilke, calmamente. ― Sobretudo contra o Astorre.

― Por outras palavras, podemos abatê-lo ― comentou Sestak.

Durante alguns instantes, Cilke pareceu perdido em pensamentos.

― Se necessário ― respondeu.

Foi só uma semana mais tarde que os auditores federais se abateram como um enxame de moscas sobre os registros dos bancos Aprile e que Cilke em pessoa se apresentou no gabinete do sr. Pryor, a quem, depois de lhe apertar a mão, disse com um sorriso divertido:

― Gosto sempre de conhecer pessoalmente as pessoas que posso ter de vir a mandar para a prisão. Ora bem, pode ajudar-nos de alguma maneira e saltar do comboio antes que seja demasiado tarde?

O sr. Pryor olhou para ele com um ar de benevolente preocupação. ― Palavra? ― perguntou. ― Está totalmente enganado, asseguro-lhe. Dirijo estes bancos impecavelmente, de acordo com a lei nacional e internacional.

― Bem, só queria que soubesse que ando a investigar o seu passado. O seu e o de toda a gente. Espero que estejam todos limpos. Especialmente os irmãos Aprile.