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— Desculpe eu ter vindo sem avisar, eu estava em Londres c tentei telefonar durante o dia.

— Entendo. Do que se trata? — A voz estava na defensiva.

— Está pretendendo ir ao funeral?

— Não. Martin e eu não éramos muito próximos e não posso me afastar do trabalho.

Mikael assentiu com a cabeça. Anita Vanger fizera o possível para se manter distante de Hedestad durante trinta anos. Desde que o pai voltara à ilha de Hedeby, ela praticamente não pusera mais os pés lá.

— Quero saber o que aconteceu a Harriet Vanger. A hora da verdade chegou.

— Harriet? O que está querendo dizer?

Mikael fez um trejeito, dando a entender que não estava disposto a se deixar enganar.

— Você era a amiga mais próxima de Harriet na família e foi a pessoa que ela procurou para contar sua terrível história.

— Você está completamente doido — disse Anita Vanger.

— Talvez você esteja certa — disse Mikael com a voz tranquila. — Anita, você esteve no quarto de Harriet naquele dia. Tenho fotos provando isso. Daqui a alguns dias farei um relatório a Henrik e depois ele assumirá o meu lugar. Por que não me conta o que aconteceu?

Anita Vanger levantou-se.

— Saia imediatamente da minha casa.

Mikael levantou-se.

— Tudo bem, mas cedo ou tarde será obrigada a me contar.

— Não tenho nada a lhe dizer.

— Martin está morto — disse Mikael com firmeza. —— Você nunca gostou dele. Acredito que veio morar em Londres não apenas para ficar longe de seu pai mas também para não ser obrigada a encontrar Martin. Isso significa que você também estava sabendo, e a única que pode ter lhe contado Harriet. A questão é saber o que você fez depois de ficar sabendo.

Anita Vanger bateu a porta na cara de Mikael.

Lisbeth Salander dirigiu um sorriso de satisfação a Mikael enquanto retirava o microfone que ele trazia sob a camisa.

— Ela deu um telefonema trinta segundos depois de ter batido a porta na sua cara — disse Lisbeth.

— A indicação do país é Austrália — acrescentou Trinity, repondo o aparelho de escuta em cima da mesinha dentro da kombi. Preciso verificar qual é o código da área.

Digitou alguma coisa no teclado de seu laptop.

— Aqui está, ela chamou este número: é um telefone numa localidade chamada Tennant Creek, ao norte de Alice Springs, no Território do Norte. Quer escutar a conversa?

Mikael fez que sim com a cabeça.

— Que horas são na Austrália agora?

— Mais ou menos cinco da manhã. — Trinity acionou a gravação digital e um alto-falante. Mikael contou oito chamadas antes de uma voz atender. Conversavam em inglês.

— Oi, sou eu.

— Humm, está certo que eu sou madrugador, mas...

— Eu quis te ligar ontem... Martin morreu. Matou-se num acidente de carro anteontem.

Silêncio. Depois, algo semelhante a uma ligeira tosse, mas que podia ser interpretado como "melhor assim".

— Só há um problema. Um jornalista detestável que Henrik contratou acabou de sair aqui de casa. Fez perguntas sobre o que aconteceu em 1966. Ele sabe de alguma coisa.

Silêncio outra vez. Depois, uma voz de comando.

— Anita, desligue agora. Devemos evitar qualquer contato por algum tempo.

— Mas...

— Escreva cartas. Mantenha-me informado do que se passa. — E a conversa foi interrompida.

— Cara esperto! — disse Lisbeth Salander com admiração na voz. Voltaram ao hotel um pouco antes das onze. A recepção encarregou-se de reservar lugares no primeiro voo disponível para a Austrália. Em quinze minutos, conseguiram lugar num avião que sairia às 19h05 no dia seguinte, com destino a Canberra, Nova Gales do Sul.

Resolvidos todos os detalhes, deitaram-se na cama, exaustos.

Era a primeira visita de Lisbeth Salander a Londres e eles saíram para passear de manhã, da Tottenham Court Road ao Soho. Pararam para beber um caffe latte na Old Compton Street. Por volta das três, voltaram ao hotel para pegar as malas. Enquanto Mikael fechava a conta, Lisbeth viu que havia uma mensagem de texto urgente no seu celular.

— Dragan Armanskij precisa falar com você.

Ela usou um telefone da recepção para falar com seu chefe. Mikael estava a seu lado e de repente viu Lisbeth virar-se para ele com o rosto paralisado.

— O que aconteceu?

— Minha mãe morreu. Preciso voltar.

Lisbeth parecia tão desesperada que Mikael abraçou-a. Ela o afastou. Beberam um café no bar. Quando Mikael disse que mudaria as reservas para a Austrália e a acompanharia a Estocolmo, ela balançou a cabeça.

— Não — disse secamente. — Não podemos abandonar o trabalho agora. Você irá sozinho à Austrália.

Separaram-se em frente ao hotel e cada um tomou o seu ônibus, com destino a aeroportos diferentes.

26. TERÇA-FEIRA 15 DE JULHO — QUINTA-FEIRA 17 DE JULHO

Mikael pegou um voo doméstico de Canberra a Alice Springs, única possibilidade de que dispunha no meio da tarde. Depois, pôde escolher entre um voo particular e um carro alugado. Escolheu o carro para enfrentar os quatrocentos quilômetros restantes.

Um desconhecido com o nome bíblico de Joshua, e que fazia parte da rede web internacional de Praga, ou talvez de Trinity, deixara um envelope destinado a Mikael na recepção do aeroporto de Canberra.

O número de telefone para o qual Anita ligara era de uma fazenda, Cochran Farm. Uma breve nota acompanhava a informação: criação de ovelhas.

Um artigo extraído na internet fornecia detalhes sobre a criação de ovelhas na Austrália.

O país tem 18 milhões de habitantes, entre os quais 53 mil criadores de ovelhas cuidando de cerca de 120 milhões de animais. Somente a exportação de lã rende mais de 3,5 bilhões de dólares por ano, sem contar a exportação de 700 milhões de toneladas de carne de ovelha e mais as peles para a indústria do vestuário. A produção de carne e de lã é um dos setores econômicos mais importantes do país.

A Cochran Farm, fundada em 1891 por um certo Jeremy Cochran, era a quinta maior empresa agropecuária da Austrália, com cerca de sessenta mil merino sheep, cuja lã era considerada de excelente qualidade. Além de ovelhas, a fazenda criava também vacas, porcos e galinhas.

Mikael constatou que a Cochran Farm era uma empresa com um volume anual de negócios impressionante, que exportava para os Estados Unidos, China, Japão e Europa, entre outros.

As biografias eram ainda mais interessantes.

Em 1972, a Cochran Farm passou das mãos de Raymond Cochran para seu herdeiro Spencer Cochran, formado em Oxford, na Inglaterra. Spencer falecera em 1994 e desde então a fazenda era dirigida por sua viúva. Ela aparecia numa foto de baixa resolução extraída do site da Cochran Farm, que mostrava uma mulher loura de cabelos curtos. Parte de seu rosto estava virado um cordeiro, que ela acariciava. Segundo Joshua, Spencer e ela haviam se casado na Itália em 1971.

Ela se chamava Anita Cochran.

Mikael passou a noite num lugarejo perdido e desértico com um nome que exalava esperança: Wannado. Num bar de esquina, comeu carne de carneiro assada e bebeu três pints, na companhia de alguns tipos locais que o chamavam de mate, e que falavam com um sotaque engraçado. Ele tinha a impressão de estar em plena filmagem de Crocodilo Dundee.

Na noite anterior, antes de ir dormir, ele havia telefonado para Erika em Nova York.

— Desculpe, Ricky, mas andei tão ocupado que nem tive tempo de ligar.

— Mas o que está havendo em Hedestad, criatura?! — ela explodiu. — Christer me telefonou para dizer que Martin morreu num acidente de carro.

— E uma longa história.

— E por que você não atende o telefone? Estou chamando sem parar há dois dias.

— Aqui não pega.