Выбрать главу

Assim que entraram, Martin Vanger apontou a pistola para Mikael e ordenou que se deitasse de bruços no chão. Mikael se recusou.

— Como quiser — disse Martin. — Nesse caso, vou dar um tiro no seu joelho.

Apontou a arma. Mikael capitulou, não tinha escolha.

Ele havia esperado que Martin se descuidasse por um décimo de segundo — sabia que numa luta corporal o venceria. Houvera uma pequena oportunidade no corredor, no momento em que Martin pôs a mão em seu ombro, mas ele hesitou. Depois Martin não voltou a se aproximar. Sem rótula, ele não teria a menor chance. Assim, estendeu-se no chão.

Martin aproximou-se por trás e mandou Mikael pôr as mãos nas costas. Imobilizou-as com algemas. Começou então a lhe dar pontapés na virilha e a lhe desferir socos violentos.

O que se passou a seguir foi como um pesadelo. Martin Vanger oscilava entre a racionalidade e a loucura. Em alguns momentos parecia calmo. No instante seguinte, começava a andar de um lado para o outro do porão como uma fera enjaulada, voltando a chutar Mikael. Tudo que ele conseguiu fazer foi tentar proteger a cabeça e receber os golpes em outras partes do corpo, que, depois de alguns minutos, apresentavam diversos ferimentos.

Durante a primeira meia hora, Martin não disse uma só palavra e permaneceu insensível a tudo o que Mikael dissesse. Depois pareceu se acalmar. Foi buscar uma corrente, passou-a em volta do pescoço de Mikael, fixou-a a uma argola no chão e depois fechou com um cadeado. Deixou Mikael sozinho por quinze minutos. Ao retornar, trazia uma garrafa plástica com água. Sentou-se numa cadeira e contemplou Mikael enquanto bebia.

— Posso beber um pouco de água? — perguntou Mikael.

Martin Vanger inclinou-se e pôs a garrafa na boca de Mikael. Ele bebeu sofregamente.

— Obrigado.

— Sempre bem-educado, Super-Blomkvist.

— Por que todos esses chutes? — perguntou Mikael.

— Porque me deixou muito zangado e merece ser punido. Por que simplesmente não voltou para a sua casa? Precisavam de você na Millennium. Falo sério, poderíamos ter feito dela uma grande revista. Poderíamos ter trabalhado juntos por muitos anos.

Mikael fez uma careta e procurou acomodar o corpo numa posição confortável. Estava sem defesa. Só lhe restava a voz.

— Imagino que esteja querendo dizer que a ocasião já passou — disse Mikael.

Martin Vanger riu.

— Sinto muito, Mikael. Sim, você entendeu bem: você não vai sair vivo daqui.

Mikael assentiu com a cabeça.

— Mas como fizeram para me desmascarar, você e aquela múmia anoréxica que se envolveu na história?

— Você mentiu sobre o que fez no dia em que Harriet desapareceu. Posso provar que estava em Hedestad no desfile da Festa das Crianças. Foi fotografado olhando para Harriet.

— Por isso você foi a Norsjö?

— Sim, para buscar essa foto. Foi tirada por um casal que estava por acaso em Hedestad. Apenas de passagem.

Martin Vanger balançou a cabeça.

— Não, você está tentando me enganar — disse.

Mikael refletia intensamente no que poderia dizer para impedir, ou ao menos retardar, sua morte.

— Onde está essa foto agora?

— O negativo? No meu cofre no Handelsbank, aqui em Hedestad... Não sabia que tenho um cofre no banco? — Ele mentia com desenvoltura. — As cópias estão em vários lugares: no meu computador e no de Lisbeth, no servidor de imagens da Millennium e no da Milton Security, onde Lisbeth trabalha.

Martin Vanger calou-se por um momento, tentando descobrir se Mikael blefava ou não.

— O que ela sabe, a múmia Salander?

Mikael hesitou. Por enquanto, Lisbeth era sua única esperança de salvação. O que ela faria ao voltar para casa e descobrir que ele não estava? Ele deixara a foto de Martin vestido com sua jaqueta na mesa da cozinha. Ela faria a ligação? Dispararia o alarme? Ela não é do tipo que chama a polícia. O pesadelo seria se ela fosse à casa de Martin e batesse à porta para tentar saber onde Mikael estava.

— Responda — disse Martin com uma voz gelada.

— Acho que Lisbeth sabe o mesmo que eu, talvez até mais. Eu diria que ela sabe mais que eu, é muito esperta. Foi ela quem fez a ligação com Lena Andersson.

— Lena Andersson? — Martin Vanger pareceu perplexo.

— A adolescente que você torturou até a morte em Uppsala, em fevereiro de 1966. Não me diga que se esqueceu dela.

Pela primeira vez o olhar de Martin Vanger deixou transparecer o quanto ele estava perturbado. Ele não imaginava que alguém pudesse fazer essa ligação — Lena Andersson não constava na agenda telefônica de Harriet.

— Martin — disse Mikael com a voz mais calma possível. — Acabou, Martin. Você pode me matar, mas acabou. Muita gente está sabendo, e desta vez você será pego.

Martin Vanger ergueu-se rapidamente e começou a andar de um lado para o outro. De repente desferiu um murro na parede.

Preciso me lembrar de que ele é irracional. O gato. Poderia ter trucidado o gato aqui, mas o levou à capela da família. Ele não age de maneira racional.

Martin Vanger deteve-se.

— Acho que você está mentindo. Só você e Salander estão sabendo. Não falaram para mais ninguém. Senão a polícia já teria aparecido. Um bom incêndio na casa dos convidados e as provas vão virar fumaça.

— E se você estiver enganado? Ele sorriu.

— Se eu estiver enganado, então de fato acabou. Mas não acredito nisso. Aposto que você está blefando. Que outra escolha me resta? — Ele refletiu. — É essa putinha anoréxica que está me atrapalhando. Preciso encontrá-la.

— Ela foi para Estocolmo ao meio-dia. Martin Vanger deu uma risada.

— É mesmo? Então por que passou a tarde nos arquivos do grupo Vanger?

O coração de Mikael saltou no peito. Ele sabia. Sabia desde o início.

— É verdade. Ela primeiro ia passar nos arquivos e depois seguir para Estocolmo — respondeu Mikael o mais calmamente que pôde. — Eu não sabia que ia ficar tanto tempo lá.

— Cale-se. A responsável pelos arquivos me contou que Dirch Frode a autorizou a deixar Salander ficar lá até tarde, se ela quisesse. Isso significa que ela voltará a qualquer momento esta noite. O guarda me avisará assim que ela deixar o escritório.

IV. TAKEOVER HOSTIL — 11 DE JULHO A 30 DE DEZEMBRO

 

 

Na Suécia, 92% das mulheres que sofreram violências sexuais após uma agressão não apresentaram queixa a polícia.

 24. SEXTA-FEIRA 11 DE JULHO — SÁBADO 12 DE JULHO

Martin Vanger se abaixou para vasculhar os bolsos de Mikael e pegou as chaves.

— Esperteza sua trocar a fechadura. Vou me encarregar da sua namorada quando ela voltar.

Mikael não respondeu. Lembrou-se que Martin Vanger era um negociador com experiência em muitas batalhas industriais. Sabia quando estavam blefando com ele.

— Por quê?

— Por que o quê?

— Por que tudo isto? — Mikael tentou indicar a peça com um gesto de cabeça.

Martin Vanger se abaixou, pôs a mão sob o queixo de Mikael e ergueu-lhe a cabeça para que seus olhares se cruzassem.

— Porque é muito fácil — disse. — Mulheres desaparecem o tempo todo. Elas não fazem falta a ninguém. Imigrantes, prostitutas russas. Milhares de pessoas passam pela Suécia todos os anos.

Soltou a cabeça de Mikael e levantou-se, quase orgulhoso de poder esclarecer seu visitante.

As palavras de Martin atingiram Mikael como uma bofetada. Meu Deus, então não se trata de um enigma histórico. Martin Vanger mata mulheres até hoje. E eu, como um idiota, me lancei em...