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— Não parece um aficionado como os nosso selvagens. — observou Vandal.

O sol se ocultou. As três luas, reunidas no céu, davam luz suficiente para podermos ler. Com uma lona da tenda, enrolada como um colchão, me estirei no solo com os olhos perdidos nas constelações que já nos eram familiares. O céu era muito mais rico em estrelas que o da Terra. Com o cachimbo aceso, deixei voar minha imaginação, escutando distraído a lição de francês que Vandal e Breffort davam ao Sswis.

Martina se deitou à minha esquerda e Vandal à minha direita. Beltaire e Schoeffer, que haviam descoberto sua coincidente paixão pelo xadrez, jogavam em um tabuleiro desenhado sobre um cartão e com umas peças que eles mesmos havia talhado.

Um pouco adormecido, puxei a cabeça de Martina sobre meu braço. Ouvia vagamente a voz sibilante do Sswis repetindo as palavras, as jogadas espaçadas dos jogadores de xadrez e também os roncos de Michel.

Ressoaram uns roncos. Me levantei. A vinte metros, um numeroso grupo de animais iam beber. Sem alcançar o tamanho dos Golias, tinham seus bons oito metros de comprimento por quatro de altura. Um focinho muito largo e pendente, a curvatura do seu dorso, a curta cauda e, apesar do seu número, umas patas maciças que lembravam, pelos seus gritos, os elefantes. Alinharam-se na margem e beberam dobrando as patas dianteiras. Vandal apontou com o dedo, adotando uma atitude interrogativa para o Sswis.

— «Assek» — disse este. Depois, abrindo a boca, fez o gesto de mastigar.

— Imagino que ele quer dizer que são bons para comer — disse o biólogo.

Ficamos contemplando enquanto eles bebiam. O espetáculo, sob a luz das luas, era esplêndido. Pensei que o destino me havia oferecido o que sempre sonhara na calma do laboratório, a visão das grandes energias primitivas. Martina observava também, emocionada. Ouvi-a sussurrar: — Uma terra virgem…

Após uns minutos os animais se foram.

— Que é isto? — perguntou de repente Beltaire, abandonando o xadrez pela primeira vez.

Voltei-me para o ponto indicado. Uma curiosa silhueta passeava por uma colina.

Por seu andar poderoso e contido, felino, parecia uma fera. De tamanho pequeno — talvez 1,50m de altura — dava a impressão de uma extraordinária força. Mostrei-o ao Sswis. Este se pôs a falar excitado, presa de uma febril agitação. Ao notar que não o compreendíamos, simulou disparar seu arco, ao mesmo tempo que mostrava nossas armas, dizendo: — Bisir! Bisir!

Da sua mímica tirei a conclusão de que o animal era perigoso. Sem pressa — a fera estava ainda a duzentos metros — coloquei um carregador no meu fuzil-metralhadora.

O que aconteceu então foi de uma rapidez inconcebível. O animal saltou, ou melhor, parecia voar. No primeiro salto diminuiu a distância em trinta e cinco metros, e já se preparava para saltar novamente, sobre nós. Martina gritou. Os demais se levantaram precipitadamente. Disparei uma rajada ao azar, falhando no meu objetivo.

A fera se preparou para um terceiro salto. Perto de mim crepitou outro fuzil-metralhadora.

Disparei novamente sem êxito, esvaziando o carregador. Michel que estava ao meu lado, trocou imediatamente.

— Para o caminhão! — gritei em seguida.

Entrevi Beltaire e Vandal levando o Sswis.

— Cuidado, Michel!

Uma rajada rasante de projéteis de 20mm passou por cima de nós, na direção do monstro. Devem tê-lo acertado, pois se deteve. Eu estava só, em terra. Saltei para o caminhão, fechando a porta traseira. Michel pegou o fuzil-metralhadora das minhas mãos e passou o cano pela fenda. As cápsulas vazias tilintavam sobre o solo. Observei o interior do caminhão. Todos estavam ali, exceto Martina.

— Martina!

— Aqui — respondeu, entre rajadas de metralhadora.

Michel retrocedeu precipitadamente.

— Segurem-se! — exclamou Um choque terrível sacudiu o caminhão. As telas racharam-se, curvando-se para o interior. Fui projetado sobre Vandal, recebendo por minha vez, nas costelas, os 85 quilos de Michel. O piso vacilou e pensei que nosso refugio ia virar. A metralhadora havia se calado e as luzes se apagaram.

Michel, penosamente, levantou-se e acendeu uma lanterna portátil.

— Martina! — gritou.

— Estou aqui. Está tudo terminado, vem. A porta traseira está bloqueada.

O cadáver do animal jazia contra o caminhão Havia recebido vinte e um disparos da metralhadora, cinco deles explosivos, e deve ter morrido em pleno salto. A cabeça destroçada oferecia um aspecto horrível, com brechas de trinta centímetros.

— O que ocorreu? Tu foste a única que viu.

— Muito simples. Quando tu entraste por último, o animal havia se detido. Disparei nele várias vezes. Então ele saltou. Estava sob a escadinha. Voltei a subir e o vi, morto, contra o caminhão.

Vzlik se arrastou até a porta.

— Vzlik, — disse — Depois fingiu disparar um arco e mostrou dois dedos.

— O que? Ele pretende ter morto dois desses animais com suas flechas?

— Não é de todo impossível, especialmente se as flechas fossem temperadas com um veneno bastante forte. — replicou Breffort.

— Mas eles não usam veneno! Por sorte, claro, pois senão Vandal talvez não estaria aqui.

— Pode ser que envenenem unicamente as flechas de caça. Existem tribos na Terra que consideram desleal o emprego de veneno na guerra.

— Bem, — disse Beltaire com um pé sobre o monstro caído — me parece que se houverem muitos destes em «Cobalt City», teremos problemas. Queria ver aqui os nossos caçadores de tigres. Que saltos e que vitalidade! Isto sem mencionar os dentes e as garras. — continuou, examinando as patas.

— Não devem brilhar precisamente por sua inteligência. — disse Vandal — Me pergunto como pode caber um cérebro nesse crânio deprimido.

— E tu dizias há pouco: — sussurrei a Martina — uma terra virgem, com seus atrativos…

e seus riscos. A propósito, tenho que felicitar-te por tua pontaria com a metralhadora.

— Transfere o cumprimento para Michel. Foi ele quem me fez praticar sob o pretexto de que sempre é útil, embora não seja mais que para educar os nervos.

— Nunca pude imaginar que tivesse que utilizá-la nestas circunstâncias — disse sorrindo.

V — O REGRESSO

Na manhã do dia seguinte, depois de uma curta e tranquila noite vermelha, decidimos atravessar o rio. Construímos uma grande balsa, o que levou seis dias inteiros, durante os quais vimos numerosos animais, porém nenhuma fera. Provamos pela primeira vez a carne teluriana. Um pequeno animal, uma espécie de miniatura dos «elefantes»

da primeira noite, nos forneceu a carne para o assado. Comemos muito pouco, apreensivos, temendo que talvez a carne fosse tóxica ou inassimilável para nós.

Seu gosto lembrava o da vitela, um pouco mais dura. Vzlik, já quase restabelecido, comeu gulosamente. Não houve transtornos digestivos e, até o regresso à zona das hidras, variamos um pouco nossa minuta, sempre em pequenas quantidades. Porém não nos atrevemos a provar os frutos das árvores que derrubamos para a fabricação da balsa, com os quais o Sswis se deleitava. Seu vocabulário começava a permitirlhe expressar ideias simples.

A travessia foi feita sem dificuldade. Recuperamos as cordas e os cravos que havíamos empregado na balsa, e depois descemos, durante dois dias, ao longo do rio, o qual rapidamente aumentava, formando locais estagnados, quase lacustres, enquanto corria entre as colinas. Observei que permanecia sempre manso e profundo.

Suas margens formigavam de vida. Divisamos sucessivos bandos de «elefantes», de Golias isolados ou em pares, e de outras numerosas formas, gigantes ou minúsculas.