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7 O Sacro Império Romano-germânico nos últimos tempos medievais

Depois dos imperadores Habsburgos, que pouco acrescentaram em termos de fatos novos à ideia imperial ou à sua receptividade dentro ou fora do antigo território teutônico, a Alemanha da época de Luís IV da Baviera (1314-1347) já assiste à combinação de uma intensificação do sentimento de pertencimento germânico com a ideia de que o título imperial era prerrogativa do povo alemão. A ideia de um reich alemão, que seria retomada no futuro em contextos bem distintos, aqui se mostra nos seus primórdios. Neste novo circuito de ideias, a imagem de Carlos Magno é projetada para o passado como a de um imperador alemão.

Surgem os matizes teóricos. Marcílio de Pádua procura dar um lugar especial ao povo alemão no seu ideário de Império. Guilherme de Ockham conserva a ideia de uma natureza romana do Império. Em meio a estes desenvolvimentos, abala-se a ideia de que o papa deveria ter um papel mais direto na escolha ou no sancionamento do imperador, e em 1338 os príncipes alemães já deporiam o imperador sem dar nenhuma satisfação ao pontífice. Carlos de Luxemburgo, o eleito, publica a Bula de ouro, que entre seus princípios estabelece que a partir dali sete príncipes alemães seriam sempre os responsáveis pela escolha do imperador.

Enquanto o Império enfrenta dificuldades para se manter como realidade política efetiva, para além do fato de ser para muitos de seus contemporâneos apenas uma “ficção política” – também a Igreja iria enfrentar no século XIV as ameaças à unidade, as cisões e questionamentos em relação a seus aspectos institucionais ou à autoridade papal. O século XIV será um século marcado pelo exílio de Avinhão (o deslocamento da cúria papal para a cidade de Avinhão, para fugir do momento político desfavorável na Itália) e pelo Grande Cisma, entre 1378 e 1382. Os novos tempos anunciam, portanto, tanto a falência do projeto universal do Império como do projeto universal do papado.

Assim, embora, a partir de meados do século XIV, a eleição do imperador se tivesse tornado um assunto popular e inflamador de um orgulho de ser alemão na população, a verdade é que “ser imperador” pouco representava em termos de forças políticas ou de recursos econômicos, pois neste último aspecto os recursos fiscais de que o imperador um dia dispusera foram minguando, transferindo-se para as realidades locais. Paradoxalmente, apesar do imaginário do Império, o território que correspondia ao que em 1474 seria chamado “Sacro-império Romano-germânico” era politicamente fragmentado, cada região sendo sujeita ao controle dos príncipes locais.

Esta Alemanha que ainda abrigaria tão ciosamente por algum tempo o imaginário do Império, seria precisamente vítima de uma unificação tardia, quando a comparamos aos demais estados europeus que atingem o século XIX perfeitamente centralizados, à exceção da Itália. Mas já nesta época a ideia de império já não possuiria nenhum vigor enquanto um projeto universal que pudesse se referir a toda a Cristandade, mesmo como ficção política.

Referências

Fontes

GUY, B. (1881a). “Chronique abrégée des empereurs”. Les Manuscrits de Bernard Guy. Paris: Alexis Paulin.

______ (1881b). “Chronique des rois de France”. Les Manuscrits de Bernard Guy. Paris: Alexis Paulin.

Bibliografia

BOLTON, B. (1992). A Reforma na Idade Média. Lisboa: Ed. 70.

FAVIER, J. (2004). Carlos Magno. São Paulo: Estação Liberdade.

LE GOFF, J. (1980). “Nota sobre sociedade tripartida, ideologia monárquica e renovação econômica na Cristandade do século IX ao século XII”. Para um novo conceito de Idade Média. Lisboa: Estampa [originaclass="underline" Paris: Gallimard, 1977].

SOUTHERN, R.W. (1970). Western Society and the Churchs in the Middle Ages. Nova York: Penguin.

1 O franciscanismo como temática de estudos para a história

Quando alguém se propõe a discorrer sobre o movimento franciscano, não é raro que se pense imediatamente em certos aspectos que parecem conferir uma unidade bastante singular a esta ordem que surge no século XIII como um dos mais impactantes fenômenos religiosos de sua época. A partir da figura máxima de seu fundador – São Francisco de Assis – pensar-se-á provavelmente intrigante questão da “pobreza voluntária”, na extrema ‘simplicidade’ alçada à categoria de ideal religioso irredutível, na intensa “dedicação aos pobres e necessitados” a partir de um novo ponto de vista que não é mais o do abastado homem caridoso que se coloca em posição de generosa superioridade. Pensar-se-á, enfim, em um movimento religioso que pela primeira vez relaciona-se com os pobres de maneira horizontal, e não mais de forma vertical, assumindo através de seus próprios praticantes uma pobreza evangélica que os levaria a incorporarem humildemente rótulos como o de “mendicantes” e o de “frades menores”.