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– Que é que vamos fazer em Inini, nesse presídio especial para indochineses?

– O irmão de Chang está lá.

– É, meu irmão estar lá. Ele fugir com vocês, ele encontrar com certeza barco e comida. Se vocês encontrar Cuic-Cuic, vocês ter tudo para fuga. Um chinês nunca faz jogo polícia. Também qualquer chinês vocês encontrar no mato, vocês falar com ele e ele avisar Cuic-Cuic.

– Por que é que chamam seu irmão de Cuic-Cuic? – diz Sylvain.

– Não sei, os franceses batizar ele Cuic-Cuic.

E continua:

– Atenção. Quando vocês quase chegar Terra Grande, vocês encontrar areia. Nunca pisar na areia, ela não boa, ela chupar vocês. Esperar que outra maré leve vocês dentro do mato para poder agarrar cipós e galhos árvores. Senão, vocês fodidos.

– Ah! é, Sylvain. Nunca pisar na areia, nem bem perto da costa. Precisamos esperar até alcançar um galho ou um cipó.

– Tá bom, Papillon. Resolvi.

– Fazendo as duas jangadas iguais, mais ou menos, como temos o mesmo peso, com certeza não vamos ficar muito longe um do outro. Mas nunca se sabe. No caso de a gente se perder, como é que vamos nos encontrar de novo? Daqui não se vê Kourou. Porém quando estava em Royale, você deve ter reparado que à direita de Kourou, aproximadamente a 20 quilômetros, há umas rochas brancas que se enxergam bem quando o sol bate nelas.

– Sei.

– São os únicos rochedos de toda a costa. À direita e à esquerda, até o infinito, é só areia. Essas rochas são brancas por causa da merda dos pássaros. Como ninguém jamais vai até lá, é um esconderijo para se refazer antes de afundar na mata. A gente pode comer ovos e os cocos que levar. Não se pode acender nenhum fogo. O primeiro que chegar espera o outro.

– Quantos dias?

– Cinco. É impossível que em menos de cinco dias o outro não chegue no lugar combinado.

Fazemos as duas jangadas. Usamos sacos duplos, para que sejam mais resistentes. Pedi dez dias a Sylvain para ficar o maior tempo possível treinando a montar a cavalo num saco. Ele faz a mesma coisa. Percebemos que, quando os sacos estão a ponto de virar, é necessário um esforço suplementar para o montador ficar em cima. Sempre que possível, vai ser preciso deitar em cima do saco. Cuidado para não dormir, porque a gente pode perder o saco, caindo na água e não conseguindo mais agarrá-lo. Chang costurou um saquinho impermeável que vou prender no pescoço com uns cigarros e um isqueiro. Vamos ralar dez cocos cada um para levar. Sua polpa nos permitirá agüentar a fome e também matar a sede. Parece que Santori tem uma espécie de bexiga de couro para pôr vinho. Ele não usa isso. Chang, que às vezes vai até a casa do guarda, tentará passar a mão nela.

Vai ser domingo às 10 da noite. A maré, com a lua cheia, terá 8 metros. Lisette estará pois em toda a sua força. Chang vai dar de comer sozinho aos porcos domingo de manhã. Eu vou dormir sábado o dia todo e todo o domingo. Partiremos às 10 horas da noite, a vazante deve começar duas horas depois,

É impossível que meus dois sacos se separem um do outro. Estão amarrados com cordas de cânhamo trançado, arame, e costurados um ao outro com uma linha grossa para velas. Encontramos sacos maiores que os outros e a boca de um está encaixada na boca do outro. Os cocos não vão escapar.

Sylvain não pára de fazer ginástica e eu me deixo massagear as coxas pelas ondas pequenas, que batem sobre elas durante longas horas. Com os golpes repetidos da água sobre minhas coxas e as contrações que sou obrigado a fazer para resistir a cada onda, criei pernas e coxas de ferro.

Num poço abandonado da ilha há uma corrente de cerca de 3 metros. Prendi-a às cordas que seguram meus sacos. Um parafuso de ferro passa através dos anéis. Se por acaso não agüentar mais, eu me amarro aos sacos com a corrente. Talvez assim eu possa dormir sem correr o risco de cair na água e perder minha jangada. Se os sacos virarem, a água vai me despertar e eu os colocarei novamente na posição certa.

– Então, Papillon. Mais três dias.

Sentados no banco de Dreyfus, olhamos para Lisette.

– É, mais três dias, Sylvain. Eu tenho fé que a gente vai conseguir. E você?

– É certo, Papillon. Terça de noite ou quarta de manhã, vamos estar no mato. E então vai ser sopa.

Chang vai ralar dez cocos para cada um. Além das facas, levamos dois sabres roubados do depósito de ferramentas.

O presídio de Inini fica a leste de Kourou. Somente andando de manhã, contra o sol, vamos ter certeza de seguir a direção certa.

– Segunda de manhã, Santori vai ficar bobo – diz Chang. – Eu não falar que você e Papillon desaparecidos antes de segunda 3 horas da tarde, quando guarda acabar sesta.

– E por que é que você não pode chegar correndo e dizer que uma onda carregou a gente enquanto a gente pescava?

– Não, eu nada complicações. Eu dizer: “Chefe, Papillon e Stephen não vir trabalhar hoje. Eu sozinho dei comer aos porcos”. Só isso.

A EVASÃO DA ILHA DO DIABO

Domingo, 7 horas da noite. Acabo de acordar. Propositalmente, durmo desde sábado de manhã. A lua só sai às 9. Lá fora, a noite está negra. Poucas estrelas no céu. Grandes nuvens carregadas de chuva passam correndo em cima de nossas cabeças. Acabamos de sair do barracão. Como muitas vezes vamos pescar clandestinamente de noite ou mesmo passear pela ilha, todos os outros acham a coisa natural.

Um rapaz entra com seu amante, um árabe forte. Com certeza acabaram de fazer o amor num canto qualquer. Olhando-os enquanto levantam a tábua para voltar à enfermaria, penso que, para o árabe, poder fazer o amor com seu amigo duas ou três vezes por dia é o auge da felicidade. Poder satisfazer à saciedade suas necessidades eróticas é coisa que transforma a prisão num paraíso para ele. Para o garoto bonito é o mesmo. Deve ter uns 23 ou 25 anos. Seu corpo é o de um adolescente. Por mais que viva na sombra para conservar sua pele cor de leite, já deixou de ser um Adônis. Na prisão, contudo, tem mais amantes do que poderia pretender se estivesse em liberdade. Além do amante do coração, o árabe, ele pega clientes a 25 francos cada um, exatamente como uma puta da Rua Rochechouart, em Montmartre. Além do prazer que os clientes provocam nele, ganha dinheiro suficiente para ele e seu “homem” viverem comodamente. Eles e seus clientes se dedicam obstinadamente ao vício e, desde o dia em que puseram os pés na prisão, sua cabeça só teve um ideaclass="underline" o sexo.

O procurador que os fez condenar fracassou na tentativa de castigá-los, colocando-os no caminho da corrupção. É nesta corrupção que eles encontraram a felicidade.

Descida a prancha na bunda do viadinho, ficamos sós, Chang, Sylvain e eu.

– Vamos andando.

Logo estamos no norte da ilha.

Tiramos as duas jangadas da gruta. Logo ficamos os três molhados. O vento sopra com os uivos característicos do vento desencadeado do alto-mar. Sylvain e Chang me ajudam a puxar minha jangada até o alto do rochedo. Na última hora, resolvo prender o pulso esquerdo à corda do saco. Tenho medo, de repente, de perder o saco e de ser carregado sem ele. Sylvain sobe no rochedo em frente, com a ajuda de Chang. A lua já está bem alta, enxerga-se muito bem. Enrolei uma toalha em volta da cabeça. Temos que esperar seis ondas. Leva tempo.

Chang chega perto de mim. Envolve-me o pescoço, depois me, abraça. Deitado sobre a rocha e abaixado numa depressão da pedra, ele vai segurar minhas pernas para ajudar-me a agüentar a arrebentação de Lisette.

– Mais uma – grita Sylvain -, a outra é a nossa!