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– Como vai o senhor?

– Bem, obrigado. Estamos precisando que vocês nos prestem um serviço.

– Se for possível, com muito prazer.

– Temos, na cadeia, três franceses degredados. Eles vêm vivendo clandestinamente há algumas semanas na ilha e alegam que seus companheiros os desembarcaram e foram embora. Achamos que afundaram o barco, mas eles dizem que nem sabem dirigir uma embarcação. Talvez seja uma manobra para que lhes forneçamos um barco. Precisamos mandá-los embora: seria lamentável, se eu me visse obrigado a entregá-los ao comissário do primeiro navio francês de passagem.

– Senhor superintendente, vou fazer o impossível para atendê-lo, mas antes quero falar com eles. O senhor deve compreender que é perigoso acolher a bordo três desconhecidos.

– Compreendo. Willy, dê ordem para os três franceses saírem ao pátio.

Quero conversar sozinho com eles e peço ao sargento que se retire.

– Vocês são degredados?

– Não, somos “duros” (forçados).

– Por que disseram que eram degredados?

– A gente pensava que eles preferem um homem que cometeu alguns pequenos delitos do que um cara que cometeu algum crime muito grave. Vê-se que estávamos enganados. E você, quem é?

– Um “duro”.

– Não te conhecemos.

– Eu sou do último comboio; e vocês?

– Do comboio de 1929.

– E eu de 27 – diz o terceiro.

– O negócio é o seguinte: o superintendente me chamou para me pedir que levássemos vocês a bordo, onde já somos três. Ele diz que, se eu não aceitar, como nenhum de vocês sabe manejar um barco, ele será obrigado a entregá-los ao primeiro navio francês que passar. Que é que vocês acham?

– Por motivos que são só da nossa conta, não queremos voltar para o mar. Poderíamos fingir que partimos com vocês, você nos deixa na ponta da ilha e continua a sua fuga.

– Não posso fazer isso.

– Por quê?

– Porque não quero pagar com uma sujeira as atenções que tiveram conosco.

– Mas eu acho, companheiro, que, antes dos rosbifes, você deve ajudar os duros.

– Por quê?

– Porque você também é um duro.

– Sim, mas há tantas espécies de duros, que talvez haja mais diferença entre mim e vocês do que entre mim e os rosbifes, depende do ponto de vista.

– Então você vai deixar que nos entreguem às autoridades francesas?

– Não, mas também não vou desembarcar vocês antes de Curaçau.

– Não tenho coragem de recomeçar – diz um deles.

– Escutem, vejam primeiro o meu barco. Talvez aquele com que vocês vieram fosse ruim.

– Bem, vamos experimentar – dizem os dois outros.

– Muito bem. Vou pedir ao superintendente licença para vocês verem o barco.

Acompanhados pelo sargento Willy, vamos para o porto. Os três sujeitos parecem ter mais confiança depois que vêem o barco.

NOVA PARTIDA

Partimos dois dias depois, nós três e mais os três desconhecidos. Não sei como souberam da notícia, mas uma dúzia das mulheres dos bares assistem à partida, bem como a família Bowen e o capitão do Exército da Salvação. Como uma das mulheres me abraça, Margaret me diz, rindo:

– Henri, como você ficou noivo tão depressa? Isso não está direito!

– Até logo para todos. Não, adeus! Mas fiquem sabendo que vocês deixaram em nossos corações uma marca tão grande, que nunca se apagará.

E às 4 horas da tarde partimos, puxados por um rebocador. Fomos muito rápidos ao sair da barra, não deixando de enxugar uma lágrima e de olhar até o último momento o grupo que veio nos dizer adeus e que agita grandes lenços brancos. Logo que é desamarrado o cabo que nos liga ao rebocador, todas as velas se inflam e enfrentamos as primeiras dos milhões de ondas que teremos de furar antes de chegar ao destino.

Há duas facas a bordo, uma comigo, outra com Maturette.

O machado está perto de Clousiot, bem como o facão. Temos certeza de que nenhum dos outros está armado, mas combinamos que nunca nós três vamos dormir ao mesmo tempo durante a viagem. Ao pôr do sol, o navio-escola nos acompanha perto de meia hora, saúda-nos e vai embora.

– Como é que você se chama?

– Leblond.

– Que comboio?

– Vinte e sete.

– Qual é a pena?

– Vinte anos.

– E você?

– Kergueret. Comboio 29, quinze anos, sou bretão.

– Você é bretão e não sabe dirigir um barco?

– Não.

– Eu me chamo Dufils e sou de Angers. Peguei a perpétua por causa de uma palavra cretina que eu disse no tribunal, do contrário teria tido dez anos no máximo. Comboio 29.

– Que palavra foi essa?

– Vou explicar. Matei minha mulher com o ferro de passar roupa. Durante os debates, um jurado me perguntou por que tinha usado um ferro de passar roupa para matar. Não sei por que, respondi que a tinha matado com um ferro de passar roupa porque ela estava desrespeitando o vinco das minhas calças. E foi por causa dessa frase idiota que eles me salgaram tanto, disse o meu advogado.

– De onde vocês fugiram?

– De um campo de trabalho florestal chamado Cascade, a 80 quilômetros de Saint-Laurent. Não foi difícil partir porque gozávamos de muita liberdade. Éramos cinco, foi tudo facílimo.

– Como, cinco? E onde estão os outros dois?

Criou-se um silêncio embaraçoso. Clousiot então disse:

– Camarada, aqui somos todos homens; como estamos juntos, nós precisamos saber. Desembuche.

– Eu vou contar tudo – disse o bretão. – De fato, éramos cinco na saída, mas os dois sujeitos de Cannes que estão faltando nos disseram que eram pescadores da costa. Eles não tinham pago nem um tostão para a fuga e diziam que o trabalho deles a bordo valia mais que dinheiro. Ora, logo percebemos que nem um nem outro conheciam coisa alguma de navegação. Corremos vinte vezes o risco de morrer afogados. A gente ia acompanhando a costa bem de perto, primeiro a Guiana Holandesa, depois a Inglesa e por fim Trinidad. Entre Georgetown e Trinidad, eu matei aquele que tinha dito que podia ser o capitão da fuga. Aquele cara merecia a morte, porque para viajar grátis ele enganou todo mundo quanto à sua capacidade de marinheiro. E o outro pensou que iam matá-lo também e num dia de temporal ele se jogou no mar por sua própria vontade, largando o leme do barco. Tivemos que nos arranjar como pudemos. A embarcação ficou várias vezes cheia de água, finalmente nos arrebentamos contra um rochedo e nos salvamos por milagre. Dou minha palavra de honra de que tudo o que disse é a pura verdade.

– É verdade – dizem os outros dois. – A coisa se passou exatamente assim e nós três estávamos de acordo em matar aquele tipo. Que é que você acha, Papillon?

– Não estou em condições de ser juiz.

– Mas – insiste o bretão – o que você teria feito em nosso caso?

– É um caso para pensar. Para ser justo nessa história, é preciso ter vivido o momento, sem isso não se sabe onde está a verdade.

Clousiot acrescenta:

– Eu também o teria matado, porque é uma mentira que pode custar a vida a todo mundo.

– Bem, não falemos mais nisso. Mas tenho a impressão de que vocês tiveram muito medo, que vocês ainda estão com medo e que estão no mar porque foram obrigados, não é verdade?