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Deve ser algo assim — disseram eles.

Ass

im como?

Um motor de dobra, propulsor fotônico, algo assim. É melhor perguntar ao Engenheiro de Vôo.

E quem é ele?

Não sabemos. Perdemos nossas mentes.

Ah, é — disse Tricia, um pouco desanimada. — É o que vocês dizem. E

como foi exatamente que vocês perderam a mente?

Não sabemos — responderam, pacientemente.

Porque perderam a mente — repetiu Tricia, abatida.

Você quer ver televisão? É um longo vôo. Nós assistimos televisão. Gostamos disso.

Toda essa cena imperdível estava gravada na fita, e que belo entretenimento ela proporcionava. Para começar, a qualidade da imagem estava péssima. Tricia não sabia dizer exatamente o porquê. Tinha a impressão de que os grebulons eram sensíveis a uma gama de freqüências de luz um pouco diferente e de que havia muito ultravioleta por lá, o que estava entulhando a câmera de vídeo. Havia diversos padrões de interferência e chuviscos. Talvez estivesse relacionado com o motor de dobra a respeito do qual nenhum deles sabia nada.

O que ela tinha em fita, basicamente, era um bando de pessoas magrinhas e descoloridas sentadas, vendo noticiários em suas televisões. Apontara a câmera para fora, através da minúscula escotilha ao lado do seu assento, e conseguira captar um efeito levemente listrado das estrelas. Ela sabia que era real, mas teria levado apenas três ou quatro minutos para falsificar aquela imagem.

No final, tinha decidido poupar a sua preciosa fita de vídeo para usar quando chegasse a Rupert e reclinou-se em seu assento para ficar assistindo televisão com eles. Chegou até a cochilar um pouco.

Parte da sua sensação ruim, portanto, vinha da impressão de que tinha passado um tempo enorme em uma espaçonave extraterrestre, dotada de um impressionante projeto tecnológico, mas, ainda assim, gastara a maior parte do tempo cochilando diante de reprises de M*A*S*H e Cagney & Lacey. O que mais havia para se fazer lá?

Tirara algumas fotos também, é claro, mas voltaram do laboratório pavorosamente embaçadas.

Outra parte de sua sensação ruim provavelmente vinha da chegada em Rupert. Aquilo, pelo menos, fora dramático e de arrepiar os cabelos. A nave veio sobrevoando uma paisagem negra e sombria, um terreno tão desesperadamente isolado do calor e da luz de seu sol que mais parecia um mapa das cicatrizes psicológicas na mente de uma criança abandonada.

Luzes ardiam através da escuridão congelada e guiavam a nave até a entrada de uma espécie de caverna que parecia ter se curvado para recebê-la. Infelizmente, por causa do ângulo de aproximação da nave e da profundidade em que a pequena e grossa escotilha estava inserida em seu revestimento, não foi possível posicionar a câmera de vídeo para captar essas imagens. Estava vendo aquele trecho da fita.

A câmera estava apontada direto para o sol.

Isso, normalmente, é péssimo para uma câmera de vídeo. Mas, quando o sol está aproximadamente a quinhentos milhões de quilômetros de distância, não causa nenhum dano. Na verdade, quase não aparece. É apenas um pontinho de luz bem no meio do enquadramento, que poderia ser qualquer outra coisa. Era apenas uma estrela em meio a tantas outras.

Tricia avançou a fita.

Ah. O próximo trecho parecia bastante promissor. Saíram da nave dentro de uma estrutura enorme e cinzenta, parecida com um hangar. Aquilo era definitivamente tecnologia extraterrestre em uma escala impressionante. Imensos prédios cinzentos sob a abóbada escura da bolha de perspex. Eram os mesmos prédios que vira no início da fita. Conseguira filmá-los mais um pouco quando saíra de Rupert, algumas horas depois, antes de entrar na espaçonave que a levaria de volta para casa. O que eles lembravam?

Bom, mais do que qualquer outra coisa, lembravam o cenário de qualquer filme de ficção científica de quinta categoria dos últimos vinte anos. Eram muito maiores, é

claro, mas pareciam igualmente improvisados e pouco realistas na tela do vídeo. Além da péssima qualidade da imagem, ela teve que lidar com efeitos inesperados da gravidade, consideravelmente menor do que na Terra, e tivera dificuldades para manter a câmera firme, sem ficar sacudindo para cima e para baixo de uma maneira constrangedoramente amadora. No final das contas era impossível distinguir detalhes na fita.

E lá estava o Líder se aproximando para cumprimentá-la, sorrindo e esticando a mão em sua direção.

Era assim que o chamavam. O Líder.

Nenhum dos grebulons tinha nome, em grande parte porque não conseguiam imaginar um. Tricia descobrira que alguns deles chegaram a pensar em adotar nomes de personagens dos programas de tevê que captavam da Terra, mas, por mais que tivessem se esforçado para se chamar Wayne, Bobby ou Chuck, algum vestígio de algo profundamente enraizado no subconsciente cultural que haviam trazido consigo das estrelas distantes de onde vieram deve ter dito a eles que aquilo não era certo e que não ia funcionar.

O Líder se parecia com todos os outros. Talvez um pouco menos magro. Ele disse o quanto gostava dos programas dela na tevê, disse que era o seu fã número um, que estava muito contente por ela ter vindo visitá-los em Rupert, falou que todos estavam ansiosos com a sua visita e disse ainda que ele esperava que o vôo tivesse sido confortável, etc. e tal. Não havia nada que denunciasse que era uma espécie de emissária dos astros ou algo assim.

Revendo a cena agora em vídeo, ele parecia um sujeito comum fantasiado e maquiado, parado diante de um cenário que dava a impressão que ia desabar assim que alguém se encostasse nele.

E lá estava ela, sentada diante do monitor com o rosto entre as mãos, balançando a cabeça em lenta perplexidade.

Aquilo era horrível.

Não só aquele trecho era horrível, como ela sabia o que viria em seguida. Era a parte em que o Líder perguntava se ela estava com fome após o vôo e se não gostaria de comer algo. Aproveitariam para conversar enquanto jantassem. Lembrava perfeitamente o que havia passado pela sua cabeça naquela hora. Comida de ET.

Como se livrar daquela?

Será que realmente ia ter que comer? Ou teria acesso a algum guardanapo de papel onde poderia cuspir? Não haveria dezenas de problemas de imunidade diferencial?

Acabou que eram hambúrgueres.

Não só eram hambúrgueres como também os hambúrgueres eram clara e obviamente do McDonald's, requentados no microondas. Não reconhecera apenas pela aparência. Nem pelo cheiro. É que, nas embalagens de poliestireno em formato de concha nas quais vinham os hambúrgueres, "McDonald's" estava impresso em todos os cantos.

Coma! Aproveite! — disse o Líder. — Nada é bom o bastante para a nossa convidada de honra!

Estava no apartamento particular do Líder. Tricia olhou à sua volta com um espanto que estava a um passo de se transformar em terror, mas não deixou de continuar filmando.

O apartamento tinha uma cama com colchão d'água. E um Midi hifí. E um daqueles troços de vidro iluminados que ficam sobre os tampos das mesas e parecem ter glóbulos de esperma flutuando dentro deles. As paredes eram revestidas de veludo. O Líder estava refestelado em um pufe de veludo cotelê marrom e esguichou um spray refrescante na boca.

De repente, Tricia começou a ficar muito assustada. Até onde sabia, estava mais distante da Terra do que qualquer outro ser humano jamais esteve, e em companhia de uma criatura alienígena refestelada em um pufe de veludo cotelê, esguichando spray refrescante na boca.

Não queria tomar atitudes precipitadas. Não queria assustá-lo. Mas tinha algumas coisas que ela precisava saber.