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Podemos ir atrás dela! Mas... ah...

Ford deixou Arthur raciocinando por conta própria e apanhou a sua velha edição do Guia do Mochileiro das Galáxias.

Mas onde é que nós estamos no tal eixo de probabilidade? — perguntou Arthur. — A Terra vai ou não estar lá? Já passei tanto tempo procurando por ela. O

máximo que encontrei foram planetas parecidos ou completamente diferentes dela, embora eu estivesse claramente no lugar certo, por causa dos continentes. A pior versão foi um lugar chamado EAgora, onde fui mordido por um animal desgraçado. É assim que eles se comunicavam, sabe, mordendo uns aos outros. Dói pra cacete. E na metade do tempo, é claro, a Terra sequer está lá, porque foi demolida pelos malditos vogons. Estou falando alguma bobagem?

Ford não disse nada. Estava ocupado, escutando alguma coisa. Passou o Guia para Arthur e apontou para a tela. O verbete ativado dizia: "Terra. Praticamente inofensiva".

Quer dizer que está lá! — exclamou Arthur, eufórico. — A Terra está lá!

É para lá que Random deve estar indo! O pássaro estava mostrando a Terra para ela na tempestade!

Ford fez um sinal para Arthur falar mais baixo. Queria escutar. Arthur estava ficando impaciente. Já tinha ouvido cantores de bar cantando Love Me Tender antes. Estava um pouco surpreso de ouvir a música ali, no meio de sabe-se lá onde diabos estavam, certamente não na Terra, mas ultimamente as coisas não o espantavam mais como antes. O cantor até que era bom, em se tratando de cantores de bar, se você curte esse tipo de coisa, mas Arthur estava ficando aflito. Deu uma olhadela no relógio. Aquilo só serviu para lembrar-lhe de que não tinha mais relógio. Estava com Random, ou, pelo menos, o que sobrara do relógio.

Você não acha que devíamos partir? — perguntou ele, insistente.

Shhhh! — disse Ford. — Eu paguei para ouvir essa música. — Ele parecia estar com lágrimas nos olhos, o que deixou Arthur um tanto quanto desconcertado. Nunca vira Ford comovido por qualquer outra coisa que não fosse uma bebida muito, mas muito forte. Devia ser a poeira. Esperou, tamborilando os dedos irritado, fora do ritmo da música.

A música terminou. O cantor começou a cantar Heartbreak Hotel.

De qualquer forma — sussurrou — ainda tenho que fazer uma crítica do restaurante.

O quê?

Preciso escrever uma crítica.

Uma crítica? Desse lugar?

Enviar uma crítica valida a cobertura das despesas. Dei um jeito para que isso acontecesse de maneira completamente automática e impossível de ser rastreada. E

essa conta vai precisar de uma validação — acrescentou ele, baixinho, contemplando sua cerveja com um sorriso malvado.

Umas cervejas e uns rolinhos?

E uma gorjeta para o cantor da banda.

Por que, quanto foi que você deu?

Ford repetiu o valor.

Não sei quanto é isso — disse Arthur. — Quanto dá em libras esterlinas?

O que dá para comprar com isso?

Acho que dá para comprar, por alto... ah... — Ford apertou os olhos enquanto fazia os cálculos na cabeça. — A Suíça — disse ele finalmente. Apanhou o seu Guia e começou a digitar.

Arthur balançou a cabeça. Algumas vezes, gostaria de entender que diabos Ford estava falando, mas outras, como agora, sentia que talvez fosse mais seguro nem tentar. Olhou por cima do ombro de Ford.

Não vai demorar muito não, vai?

Não — disse Ford. — Moleza. É só mencionar que os rolinhos estavam ótimos, a cerveja boa e gelada, que a vida selvagem local é agradavelmente excêntrica, o cantor da banda o melhor do universo e pronto. Não precisa de muita coisa, não. Só

uma validação.

Tocou em uma parte da tela onde estava escrito ENTER e a mensagem desapareceu na rede subeta.

Quer dizer que você gostou mesmo do cantor?

Hum-hum — disse Ford. O barman estava voltando com um pedaço de papel, que parecia estar tremendo em sua mão.

Entregou o papel a Ford com uma espécie de espasmo nervoso e reverencioso.

Engraçado — comentou o barman. — O sistema rejeitou o cartão algumas vezes. Não que isso tenha me surpreendido. — A sua testa estava coberta de gotículas de suor. — Então, do nada, tudo bem, está tudo certo e o sistema... ah, autorizou o cartão. Simples assim. O senhor pode... assinar?

Ford examinou o papel rapidamente. Deu um assobio leve. — Isso vai dar uma bela dor de cabeça na InfmiDim — disse ele, fingindo preocupação. — Paciência —

continuou ele, delicado. — Que se danem.

Assinou com um floreio e devolveu o papel ao barman.

Mais dinheiro do que ele já ganhou em toda a sua carreira de filmes ruins e apresentações em cassinos. Apenas por fazer o que ele faz de melhor. Pegar o microfone e cantar em um bar. E ele próprio fez a negociação. Acho que é um momento de sorte para ele. Agradeça a ele por mim e lhe sirva uma bebida por minha conta. —

Ford jogou umas moedas sobre o balcão. O barman tentou devolver.

Acho que isso não é necessário — disse ele, levemente rouco.

Pra mim, é — respondeu Ford. — Beleza, vamos dar o fora daqui. Ficaram parados no calor e na poeira, contemplando a nave imensa, rosa e cromada, pasmos e admirados. Ou pelo menos Ford a contemplava pasmo e admirado. Arthur apenas a contemplava.

Você não acha muito exagerada, não?

Repetiu a mesma coisa quando entraram na nave. Os assentos e uma boa parte dos controles eram revestidos de pele ou de camurça. Havia um imenso monograma dourado no painel de controle principal com as iniciais EP.

Sabe — disse Ford, ligando os motores da nave —, eu perguntei a ele se era verdade que foi abduzido por alienígenas e sabe o que ele disse?

Ele quem? — perguntou Arthur.

O Rei.

Que Rei? Ai, já conversamos sobre isso, não foi?

Deixa pra lá — disse Ford. — O que importa é que ele disse não. Ele veio por vontade própria.

Ainda não sei direito de quem estamos falando — disse Arthur. Ford balançou a cabeça.

Olha, tem umas fitas aí no compartimento à sua esquerda. Por que você não escolhe alguma música para a gente ouvir?

Está bem — disse Arthur, vasculhando o compartimento.

Você gosta de Elvis Presley?

Para falar a verdade, gosto, sim — disse Ford. — Só espero que essa máquina possa saltar pelo espaço tão bem quanto parece. — Acionou o propulsor principal.

Yeeehaah! — gritou Ford, enquanto levantavam vôo a uma velocidade estonteante.

Ela podia.

CAPÍTULO 23

As emissoras de televisão detestavam coisas assim. Consideravam um desperdício. Uma incontestável nave espacial aterrissa, do nada, no meio de Londres e vira uma notícia sensacional, da maior importância. Então outra nave completamente diferente aparece, três horas e meia depois, e ninguém dá bola. OUTRA NAVE ESPACIAL!, anunciaram as manchetes e os cartazes na banca de jornais. ESTA É COR—DE—ROSA. Se fosse alguns meses depois, poderiam ter aproveitado mais a notícia. A terceira, uma pequena nave Hrundi com quatro leitos que chegou meia hora depois da segunda, só foi destaque no noticiário local.

Ford e Arthur desceram a toda da estratosfera e estacionaram direitinho em Portland Place. Era um pouco mais de seis e meia da noite e havia vaga. Misturaram—

se brevemente com a multidão que estava reunida, babando, disseram em voz alta que, se ninguém mais pretendia chamar a polícia, eles chamariam, e conseguiram fugir tranqüilamente.