—
Obrigada, Eric — disse Tricia. —Vou me deitar agora, para falar a verdade. Fique à vontade para apanhar o que quiser na cozinha, está bem?
—
Obrigado, dona Tricia, e boa sorte — disse Eric. Ele inclinou-se e apanhou alguma coisa no gramado.
—
Aqui está — disse ele. — Um trevo de três folhas. Dá sorte, sabe. Examinou de perto para verificar se era mesmo um trevo de três folhas, e não um comum de quatro folhas que tivesse perdido um pedaço.
—
Se eu fosse a senhora, em todo caso, ficaria atento aos sinais de atividade alienígena por aqui. — Ele vasculhou o horizonte atenta mente. — Especialmente por aquelas bandas lá de Henley.
— Obrigada, Eric — repetiu Tricia. — Pode deixar.
Foi para a cama e teve sonhos intermitentes com papagaios e outros pássaros. À tarde levantou-se e zanzou pela casa, inquieta, sem saber direito o que fazer com o resto do dia e com o resto da vida. Passou pelo menos uma hora indecisa, sem saber se valia a pena ir para a cidade e dar um pulo no Stavro's. Lá era o lugar da moda para pessoas bem—sucedidas da mídia. Talvez encontrar alguns amigos pudesse ajudá-la a entrar no ritmo das coisas. Finalmente decidiu que iria. Seria uma boa. Era um lugar divertido. Gostava muito do próprio Stavro, um grego com pai alemão, o que era uma combinação um tanto quanto esquisita. Tricia estivera no Alpha algumas noites antes. O
Alpha fora a primeira casa noturna de Stavro em Nova York e, atualmente, era dirigida pelo seu irmão Karl, que se achava um alemão com uma mãe grega. Stavro ficaria contente em saber que Karl estava metendo os pés pelas mãos na gerência da casa em Nova York, então Tricia iria até o Stavro's e o deixaria contente. Afinal de contas, os dois irmãos não se davam muito bem mesmo.
O.k. Era isso o que ela ia fazer.
Passou então mais uma hora indecisa, tentando definir a roupa que iria vestir. Finalmente escolheu um pretinho básico elegante que comprara em Nova York. Ligou para um amigo para sondar quem estaria no Stavro's naquela noite e ficou sabendo que a casa estava fechada para uma festa de casamento.
Concluiu que tentar viver seguindo qualquer tipo de plano que pudesse ser arquitetado com antecedência era como tentar comprar ingredientes para uma receita no supermercado. Você pega um daqueles carrinhos que simplesmente não andam na direção que você quer e acaba comprando coisas completamente diferentes. O que fazer com tudo aquilo? O que fazer com a receita? Ela não tinha idéia. De qualquer maneira, uma nave espacial pousou no seu gramado naquela noite.
CAPÍTULO 5
Observou-a enquanto se aproximava, vinda lá das bandas de Henley, no início com uma leve curiosidade, imaginando o que seriam aquelas luzes. Quem morava, como ela, a menos de um milhão de quilômetros de Heathrow estava acostumado a ver luzes no céu. Mas não tão tarde da noite nem tão baixas, por isso a leve curiosidade. Quando o objeto, fosse lá o que fosse, começou a ficar mais e mais próximo, a sua curiosidade transformou-se em perplexidade.
"Humm", pensou ela, sendo aquilo o máximo que conseguia pensar. Ainda estava grogue e indisposta por causa do fuso horário, e as mensagens que uma parte do seu cérebro enviava para a outra não estavam necessariamente chegando a tempo ou fazendo sentido. Saiu da cozinha, onde estava preparando um café, e foi abrir a porta dos fundos, que dava para o jardim. Respirou profundamente o ar fresco da noite, saiu de casa e olhou para o céu.
Havia algo do tamanho aproximado de um ônibus estacionado há cerca de trinta metros acima do seu gramado.
Estava realmente lá. Parado. Praticamente em silêncio.
Algo se moveu no fundo da alma de Tricia.
Abaixou os braços devagar. Não percebeu que derrubou o café pelando no seu pé. Mal conseguia respirar enquanto, bem devagarzinho, centímetro por centímetro, a nave concluía a aterrissagem. As luzes vasculhavam delicadamente o gramado, como se estivessem sondando, sentindo o terreno. Então viraram-se para ela. Parecia impossível que ela pudesse estar sendo agraciada com uma segunda chance. Será que ele a encontrara? Será que tinha voltado?
A nave continuou a descer aos poucos até finalmente pousar silenciosamente no seu jardim. Não era exatamente parecida com a que ela vira partir anos atrás, pensou, mas luzes piscando no céu à noite não são muito fáceis de se distinguir. Silêncio.
Depois um click e um hum.
Depois outro click e outro hum. Click hum, click hum.
Uma portinhola se abriu, derramando luz pelo jardim na direção dela. Tricia aguardou, fervilhando.
Uma silhueta surgiu contra a luz, depois outra e mais outra. Olhos arregalados piscavam vagarosamente para ela. E, vagarosamente, levantaram as mãos para saudá-la.
—
McMillan? — perguntou finalmente uma voz estranha e fininha que pronunciou as sílabas com dificuldade. — Tricia McMillan. Srta. Tricia McMillan?
—
Sim — respondeu Tricia, quase afônica.
—
Temos monitorado você.
—
M... monitorado? A mim?
—
Sim.
Olharam para ela por alguns instantes, mexendo os seus imensos olhos para cima e para baixo devagar.
—
Você parece mais baixa na vida real — comentou um deles finalmente.
—
O quê? — perguntou Tricia.
—
É.
—
Eu... eu não estou entendendo — disse Tricia. Obviamente não esperava uma coisa daquelas, mas, mesmo para uma coisa que ela jamais havia esperado, aquilo não estava indo da maneira que ela esperava. Por fim, continuou: — Vocês são... vocês vieram de... Zaphod?
A pergunta pareceu causar uma certa consternação nas três figuras. Confabularam entre eles em uma língua esganiçada e voltaram-se para ela.
—
Achamos que não. Até onde sabemos, não — disse um deles. — Onde fica Zaphod? — perguntou o outro, olhando para o céu.
—
Eu... eu não sei — respondeu Tricia, sem graça.
—
É muito longe daqui? Em qual direção? Não sabemos.
Tricia constatou, com um aperto no peito, que eles não faziam a menor idéia de quem ou do que ela estava falando. E ela não fazia a menor idéia do que eles estavam dizendo. Colocou as esperanças no saco novamente e esforçou-se para dar partida no seu cérebro. Não fazia sentido ficar decepcionada. Tinha de perceber que estava com o furo de reportagem do século nas suas mãos. O que fazer? Voltar para dentro de casa e pegar uma câmera de vídeo? Estava absolutamente confusa em relação à estratégia que deveria adotar. Mantenha—os falando, pensou ela. Resolva o resto depois.
—
Vocês estavam me monitorando?
—
Todos vocês. Tudo no seu planeta. TV. Rádio. Telecomunicações. Computadores. Circuitos de vídeo. Armazéns.
—
O quê?
—
Estacionamentos. Tudo. Monitoramos tudo. Tricia olhava fixamente para eles.
—
Isso deve ser muito chato, hein?
—
É.
—
Então por que...
—
Exceto...
—
Ahn? Exceto o quê?
—
Os programas de auditório. Gostamos dos programas de auditório. Um silêncio assustadoramente longo instalou-se enquanto Tricia olhava para os alienígenas e eles olhavam de volta.
—
Só tem uma coisinha que eu queria buscar lá dentro — disse Tricia, calmamente. — Melhor ainda. Será que vocês, ou um de vocês, gostariam de entrar comigo e dar uma olhada?
—
Pois não! — responderam todos eles, entusiasmados.
Os três ficaram desconfortavelmente parados na sala de estar, enquanto ela corria para lá e para cá, apanhando uma câmera de vídeo, uma câmera fotográfica, um gravador e qualquer outro aparelho de gravação que pudesse encontrar. Eles eram bem magros e, sob as condições de iluminação doméstica, meio verde-arroxeados.