David Nicholls
Resposta Certa
Primeira Rodada
Ela conhecia muito bem o tipo — as vagas aspirações, o transtorno mental, a familiaridade com as capas dos livros...
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PERGUNTA: Enteado de Robert Dudley e outrora favorito de Elizabeth I, que nobre planejou e liderou uma revolta malsucedida contra a rainha, sendo em seguida executado em 1601?
RESPOSTA: Essex.
Todos os jovens se preocupam com as coisas; é parte natural e inevitável de crescer. E, aos 16 anos, minha maior preocupação na vida era a de nunca mais alcançar nada tão bom, tão puro, tão nobre ou verdadeiro quanto o resultado do meu exame de admissão ao ensino médio.
É claro que, na época, achei que não fosse nada demais. Não emoldurei o certificado nem nada tão esquisito. Nem vou entrar no mérito das notas, porque senão pareceria muito competitivo, mas definitivamente gostei delas; isto é, das qualificações. Dezesseis anos, e a primeira vez que me senti qualificado para alguma coisa.
Claro que isso foi há muito, muito tempo. Agora, tenho 18 anos e gosto de pensar que estou bem mais sábio e indiferente em relação a essas coisas. Por isso, comparativamente, não liguei muito para o resultado dos meus exames para a faculdade. Além do mais, acreditar que se pode, de algum modo, avaliar a inteligência com um sistema ridículo e antiquado de prova escrita é obviamente uma ilusão. Dito isso, tive as melhores notas da Langley Street Comprehensive School em 1985. As melhores em 15 anos na verdade: três As e um B, somando 19 pontos — pronto, falei — mas, sério, não acho que isso seja particularmente relevante, só mencionei de passagem. E, de qualquer maneira, comparando com outras qualidades, como coragem (fisicamente falando) ou popularidade, beleza, pele boa ou uma vida sexual ativa, saber um monte de coisas acaba não sendo tão importante assim.
Mas, como meu pai costumava dizer, o crucial da educação são as oportunidades que ela traz, as portas que abre. Porque, sem isso, o conhecimento em si é um beco sem saída, especialmente na minha atual posição, numa quarta-feira à tarde de um fim de setembro, numa fábrica de torradeiras.
Passei as férias trabalhando no setor de expedição da Ashworth Electricals, o que significa que sou responsável por colocar as torradeiras nas caixas antes de elas serem mandadas aos varejistas. É claro que não existem muitas maneiras diferentes de se colocar uma torradeira numa caixa, por isso esses dois meses têm sido meio chatos, mas, olhando pelo lado positivo, recebo uma libra e 85 pence por hora, o que não é tão ruim, mais quantas torradas conseguir comer. Como é meu último dia aqui, fiquei de olho em qualquer sinal de um possível cartão de despedida sendo passado disfarçadamente entre meus colegas, assim como da vaquinha para o presente de despedida, esperando para descobrir a que pub iríamos para nossos últimos drinques juntos, mas já são 18h15. Então, posso deduzir que todo mundo já foi para casa.
O que é bom, porque, de qualquer modo, tinha outros planos. Então, recolho as minhas coisas, pego algumas canetas esferográficas e um rolo de fita adesiva transparente no armário do escritório e saio rumo ao píer, para encontrar Spencer e Tone.
Com 2.360 jardas, ou 2,158 quilômetros, o Southend é, oficialmente, o maior píer do mundo. Talvez seja grande demais, para ser honesto, principalmente quando você está carregando muita cerveja. Trouxemos doze latas grandes de Skol, almôndegas de porco agridoce, um arroz frito especial e uma porção de batatas fritas com molho curry — sabores do mundo todo — , mas, até chegarmos ao fim do píer, as cervejas já estão quentes e as marmitas, frias. Como é uma comemoração especial, Tone também teve de carregar o seu som arrasa-quarteirão, que é do tamanho de um pequeno guarda-roupa, mas, e, é preciso que se diga, nunca abalará quarteirão nenhum nessa cidade. No momento, está tocando uma fita gravada por Tone chamada The Best Of The Zep, e nos sentamos num banco no final do píer enquanto assistimos ao sol se pôr majestosamente sobre a refinaria de petróleo.
— Você não vai virar um babaca, vai? — pergunta Tone, abrindo uma lata de cerveja.
— Como assim?
— Ele quer dizer que você não vai dar uma de universitariozinho para cima da gente — explica Spencer.
— Bom, eu sou universitário. Quer dizer, vou ser. Então...
— Não... O que estou dizendo é que você não vai virar um babaca que só olha para o próprio rabo e voltar para casa no Natal vestindo beca, falando latim e discorrendo sobre temáticas, problemáticas e essas coisas...
— É, Tone. É exatamente o que vou fazer.
— Não faça. Porque você já é babaca demais e não precisa ficar mais babaca ainda.
Tone tem o costume de me chamar de babaca ou de veadinho. O truque é fazer uma espécie de ajuste linguístico e tentar pensar nisso como termos afetuosos, do mesmo jeito que os casais falam querido e meu bem. Ele acaba de conseguir um emprego num depósito em Currys e está começando a desenvolver um interessante gosto por roubar aparelhos estéreos portáteis, como o que estamos ouvindo agora. Também é dele essa fita do Led Zeppelin. Tone gosta de falar que é metaleiro, o que soa melhor do que roqueiro ou fã de heavy metal. Também se veste como um metaleiro: calça jeans escura e um cabelo longo e lustroso jogado para trás feito um viking afeminado. Na verdade, o cabelo de Tone é a única coisa afeminada nele. Afinal, estamos falando de um cara ultraviolento. O ponto alto de uma noite bem-sucedida com Tone é chegar em casa sem ter a cabeça enfiada no vaso com alguém dando descarga.
Agora está tocando Stairway to Heaven.
— Tone, a gente precisa mesmo ouvir essa porra de baboseira hippie? — pergunta Spencer.
— Isso é O Zep, Spence.
— Eu sei que é O Zep, Tone. É por isso que eu quero que você desligue essa merda.
— Mas O Zep é o máximo.
— Por quê? Só porque você acha?
— Não, porque eles foram uma banda muito importante e influente.
— Eles estão falando de fadas, Tony. É constrangedor...
— Não são fadas...
— Elfos, então — intervenho.
— Não são apenas fadas e elfos. É Tolkien, é literatura... — Tone adora essas coisas: livros com mapas na página de abertura e capas com mulheres grandes e assustadoras usando lingerie e correntes, empunhando espadas enormes, o tipo de mulher com quem ele se casaria num mundo ideal. O que, em Southend, é mais possível do que se imagina.
— Qual é a diferença entre uma fada e um elfo afinal? — pergunta Spencer.
— Sei lá. Pergunta pro Jackson. Ele que é o fodão.
— Eu não sei, Tone — respondo.
O solo de guitarra começa, e Spencer se contorce.
— Isso termina alguma hora ou só continua, continua, continua e continua...?
— São 7 minutos e 32 segundos de pura genialidade.
— Pura tortura, isso sim — digo. — Por que é sempre você quem escolhe a música, afinal?
— Porque o som é meu...
— Que você afanou. Tecnicamente, ainda pertence ao Currys.
— É, mas eu compro as pilhas...
— Não, você afana as pilhas...
— Não essas. Essas eu comprei.