Procuro o rosto dela em meio ao entusiasmo da multidão, mas ela com certeza foi embora. Sem problema. O importante é ter deixado uma boa impressão. Nossos caminhos vão se cruzar outra vez, amanhã, às 13h, no teste para o Desafio.
Agora, chega o momento das músicas lentas e românticas, como Careless Whisper, para dançar de rosto colado, mas todo mundo é muito maneiro ou está bêbado demais para dançar. Por isso, decido que está na hora de ir dormir. No caminho da saída pelo corredor, dou uma passada no banheiro. Minha camisa está colada de suor no corpo e aberta até o umbigo, o cabelo está emplastrado na testa e todo meu sangue subiu à cabeça, em especial para a minha acne, mas ainda assim acho que, no geral, minha aparência está muito boa. O recinto começa a girar e eu apoio a testa no espelho à minha frente para fazer ele parar enquanto faço xixi, e de um dos cubículos vem um cheiro de maconha e duas vozes baixas dando risadinhas. Nisso, soa a descarga e saem duas biscates, uma mulher com o rosto suado, arrumando o shortinho, e a outra é um jogador de rúgbi de ombros largos. Os dois estão com o rosto sujo de batom. Olham para mim com um ar desafiador, provocando-me a dizer alguma coisa, mas estou cheio de júbilo e paixão e amor pela completa e alegre imprudência da juventude. Por isso, só dou um sorriso sonso para eles.
— A ironia é que eu sou vigário mesmo! — digo.
— Ah, vai se foder! — responde o cara.
6
PERGUNTA: O Livro IX de O prelúdio de Wordsworth contém a seguinte exortação: Felicidade estava na alvorada de estar vivo...?
RESPOSTA: Porque ser jovem era o paraíso.
Em termos de novas alvoradas, esta é tão deprimente quanto qualquer outra.
Nem é mais alvorada: são 10h26. Achei que, no meu primeiro dia aqui, acordaria cheio de saúde, sabedoria e vigor acadêmico, mas só sinto o mesmo de sempre: vergonha, nojo de mim mesmo, náusea e uma vaga sensação de que acordar não precisava ser sempre assim.
Também estou muito indignado, porque, com certeza, alguém entrou no meu quarto enquanto eu dormia e encheu minha boca de feltro e pisoteou a minha cabeça. Está muito difícil me mexer; então, permaneço deitado por um momento contando quantas noites consecutivas já fui para a cama bêbado e acabo com o número aproximado de 103. E teriam sido mais noites ainda, não fosse o último ataque de amidalite. Contemplo a ideia de que, talvez, eu seja alcoólatra. Tenho isso de vez em quando, a necessidade de me definir como uma coisa ou outra, e, em vários momentos da vida, já me perguntei se sou gótico, homossexual, judeu, católico ou maníaco-depressivo, se sou adotado ou tenho um buraco no coração, ou se tenho a habilidade de mover objetos com o poder da mente, e sempre, infelizmente, chego à conclusão de que não sou nenhuma das alternativas acima. O fato é que, na verdade, não sou nada. Nem mesmo um órfão, não no sentido estrito, mas alcoólatra parece mais plausível até agora. Que outro nome se dá a alguém que vai para a cama bêbado todas as noites? Ainda assim, talvez alcoolismo não fosse a pior coisa do mundo; pelo menos, metade das pessoas nos cartões-postais na parede ao meu lado é alcoólatra. O segredo, suponho, é ser alcoólatra sem deixar isso afetar seu comportamento ou seu desempenho acadêmico.
Ou, talvez, tenha lido romances demais. Nos romances, os alcoólatras são sempre atraentes e engraçados, encantadores e complexos, como Sebastian Flyte ou Abe North em Suave é a noite, e bebem por causa de uma profunda e insaciável tristeza da alma, ou devido ao terrível legado da Primeira Guerra Mundial, enquanto eu só fico bêbado porque tenho sede, e o gosto da cerveja me agrada, e porque sou um imbecil que não sabe quando parar. Afinal, não dá para pôr a culpa nas Ilhas Falklands.
E, com certeza, cheiro como um alcoólatra. Em menos de 24 horas, o novo quarto já começou a feder. É o cheiro de garotos da minha mãe — quente e salgado, um pouco como a parte interna da pulseira de um relógio de pulso. De onde vem esse cheiro? Será que eu sempre o carrego por aí comigo? Eu me sento na cama e encontro a camisa da noite passada no chão ao meu lado, ainda encharcada de suor. Até minha jaqueta está úmida. Um rápido lampejo de lembranças reprimidas vem à tona... Alguma coisa envolvendo... dançar? Eu me deito de novo e cubro a cabeça com o edredom.
No fim, é o futon que me força a levantar. Parece ter ficado mais compacto durante a noite e sinto o chão duro e frio na minha coluna, mais ou menos como estar deitado numa toalha úmida que ficou dentro de um saco plástico por uma semana. Sento-me na beirada, com os joelhos embaixo do queixo e procuro minha carteira nos bolsos. Está lá, mas é preocupante que só tenha 5,18 libras em trocados. Isso tem que durar até segunda, três dias. Quantas cervejas tomei ontem à noite? E, oh Deus, de novo as lembranças reprimidas, borbulhando na superfície como um peido na banheira. Dançar. Eu me lembro de ter dançado no meio de algumas pessoas. Mas isso não pode estar certo, pois eu danço como uma pessoa tendo um ataque epilético, e os outros estavam sorrindo e aplaudindo e me incentivando.
E, então, compreendo, com terrível clareza, que os aplausos eram irônicos.
O prédio do Grêmio Estudantil é um trambolho feio e ostentoso de camadas de concreto, fincado no meio de um organizado conjunto de casas geminadas georgianas, como um dente careado. Nesta manhã, não para de entrar e sair gente pelas portas de vaivém, pessoas sozinhas ou em grupinhos fechados com os melhores amigos de outrora, pois hoje é o último dia da Semana dos Calouros, e não tem aula até segunda. Por isso, é a nossa oportunidade para integrar uma Sociedade.
Eu me inscrevo na Sociedade Francesa, na Sociedade de Cinema, na Sociedade de Literatura, na Sociedade de Poesia e na equipe de redação das três revistas estudantis. A literária Scribbler, a irreverente e lasciva Tattle e a sisuda militante de esquerda By Lines. Entro para a Sociedade da Câmara Escura (Junte-se a nós e veja o que aparece!), mesmo sem ter uma câmera fotográfica, e pensei em me inscrever na Sociedade Feminista, mas, na fila de inscrição, sou fulminado pelo olhar afrontoso de uma menina que parece a Gertrude Stein e começo a achar que entrar para a Sociedade Feminista seja um pouco demais. Já cometi esse erro uma vez numa viagem da escola ao Victoria and Albert Museum, quando segui uma placa dizendo Mulheres, pensando que era uma exposição das mudanças dos papéis da mulher na sociedade e acabei indo parar na fila do banheiro feminino. Enfim, resolvo desistir da Sociedade Feminista, pois, mesmo sendo um grande adepto do movimento de libertação das mulheres, não estou inteiramente certo de que não seria apenas um modo de conhecer garotas.
Passo depressa pelos suéteres caretas em tons pastel da Sociedade de Badminton, antes que alguém perceba meu blefe. Depois disso, aceno para Josh, rodeado de companheiros na fila da Sociedade dos Sarados da Alta Classe, ou seja lá o que for. É alguma coisa a ver com esquiar, beber, assediar mulheres e ter pontos de vista de extrema-direita.